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O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

Momentos com história

Alexandre Guerra, 29.03.13

 

Foto: AP


O Papa Francisco, esta Sexta-feira, na Basílica de São Pedro, em mais um gesto de humildade perante os desígnios superiores. Já se percebeu que o novo chefe do Vaticano tem sido pródigo na quebra das tradições protocolares e dos hábitos instituídos. 

Agora, a questão fulcral é saber se terá essa mesma vontade e disponibilidade para criar uma ruptura com os interesses instalados numa Cúria, claramente debilitada e ultrapassada pelos tempos.


Jimmy Carter, o Presidente que a História conotou como um pacifista ingénuo

Alexandre Guerra, 24.10.10

 

  

Jimmy Carter, o 39º Presidente dos Estados Unidos, entre 1977 e 1981, continua a ser visto por muitos americanos como um dos homens menos relevantes e entusiasmantes que passaram pela Casa Branca. Não entusiasmou sequer os democratas, apesar de algumas da suas posições serem inovadoras em relação a temas como a dependência energética, o ambiente, a educação, os direitos humanos ou o conflito israelo-palestiniano.

 

Não será arriscado afirmar-se que a História tem sido um pouco injusta na apreciação que faz ao mandato de Carter, já que este foi premonitório nalguns princípios que defendia e conseguiu feitos interessantes, nomeadamente ao nível da política internacional, promovendo a assinatura dos Acordos de Camp David, em 1978, que permitiram normalizar as relações diplomáticas entre Israel e o Egipto.

 

A verdade é que Carter não conseguiu ser eleito para um segundo mandato, e ficou conotado como uma imagem de pacifista ingénuo, numa altura em que o mundo ocidental exigia uma liderança realista na cruzada contra o “império do mal”.

 

Exemplo disso foi o papel “fantoche” desempenhado por Carter na “Operação Livro Aberto”, como mais tarde o seu conselheiro de Segurança Nacional, Zhigniew Brzezinski, viria a constatar nas suas memórias.

 

Como se pode ser no livro a "A Santa Aliança" de Eric Fratitini, quando em 1980 os Estados Unidos e o Vaticano aprofundaram relações ao mais alto nível, no âmbito do apoio ao movimento Solidariedade na Polónia, João Paulo II assumiu a liderança da estratégia anti-comunista a ser implementada do outro lado da Cortina de Ferro.

 

A “Operação Livro Aberto” tinha como objectivo colocar naqueles países milhares de livros e propaganda anticomunista, seria coordenada pela CIA e pela Santa Aliança (serviços secretos do Vaticano) e implementado no terreno por padres que estariam nessas zonas.

 

Em todo o processo negocial e de preparação entre Washington e o Vaticano, João Paulo II demonstrou muito mais empenho e entusiasmo do que Carter, que levantava algumas objecções à “Operação Livro Aberto”. Brzezinski chegou mesmo a escrever nas suas memórias que “era claro que João Paulo II é que devia ter sido eleito Presidente do Estados Unidos e Jimmy Carter escolhido como Sumo Pontífice”.

 

A arte dos génios enquanto factor de poder ao serviço do Vaticano

Alexandre Guerra, 11.12.09

 

"Julgamento Final", Miguel Ângelo, Capela Sistina

 

Anda este autor por terras romanas, quando em plena Cidade do Vaticano saltou à reflexão a problemática do poder: a sua conquista, a sua manutenção e a sua projecção. Uma associação que surge naturalmente para quem conhece minimamente a história interna daquele micro-estado e a sua influência nas relações internacionais desde há séculos.

 

O Vaticano, enquanto objecto de estudo, é um caso particularmente interessante e diferenciado dos demais Estados do sistema internacional, uma vez que o exercício e a projecção do poder adquirem contornos específicos em relação a qualquer outra nação.

 

Ao longo da História, o Vaticano fez da projecção de poder a sua missão e com isso conseguiu capacidade de influência sem paralelo. Houve em tempos, longínquos é certo, que cabia ao Vaticano a declaração de criação ou de independência de um Estado, como aliás é exemplo Portugal através de uma bula papal do século XII.

 

O poder do Vaticano no sistema internacional era de tal forma evidente que mesmo sem um único batalhão, o Papa mereceu sempre o respeito de todos os chefes de Estado como se tivesse a apoiá-lo vários exércitos. Esta afirmação de poder esteve sempre presente no Vaticano, o qual fez de todos os seus actos manifestações de grandeza.

 

 

Ao analisar-se cuidadosamente as transcendências artísticas daquele micro-estado, chega-se à conclusão que, de uma forma mais ou menos directa, tudo foi feito para servir o poder e influenciar as nações e pessoas. Os próprios chefes de Estado, neste caso os Papas, alimentaram esse factor de poder, através da sua auto-glorificação.

 

Por exemplo, quando o Papa Júlio II encomendou a Miguel Ângelo o seu túmulo, estava a depositar nas mãos daquele artista o reforço do poder papal. Esta transcendência não estava ao alcance de qualquer outro chefe de Estado, com raras excepções na história. Acabou por ser um projecto inacabado, mas nem por isso deixou de ser uma obra de importante simbolismo.

 

A arte enquanto continuação da política do Vaticano por outros meios (Clausewitz que desculpe o abuso por parte desta autor) tem a sua expressão máxima nos frescos da Capela Sistina, com as célebres cenas da Génesis (tecto) e o sublime Julgamento Final (parede) que elevaram o conceito de beleza à perfeição.

 

"A Escola de Atenas", Rafael, Museu do Vaticano

 

Até então nunca ninguém tinha visto tal realização, e no dia em que o Julgamento Final foi destapado, o próprio Miguel Ângelo percebeu que se tinha superado a si mesmo, como refere Giorgio Vasari, autor daquele que é considerado o primeiro livro de história da arte e seu amigo.

 

Com o contributo do génio florentino, o Vaticano dotou-se de importantes “factores de poder”, que embora não contemplados nos manuais de ciência política (já que não se está a falar de factores como poder militar, território ou recursos), foram fundamentais para dotar aquele micro-estado de uma influência poderosa.

 

É aliás por detrás da imponência do Vaticano e das suas inúmeras transcendências artísticas que se vislumbra a expressão de poder para influenciar e projectar a autoridade papal. É bastante interessante notar que alguns frescos mais relevantes podem ser vistos nalgumas galerias mais pequenas próximas da Capela Sistina, nas quais Rafael assume claramente temas políticos, como a afirmação de Roma face a potências estrangeiras, concretamente a França e o Império Otomano.

 

Cúpula da Basílica de São Pedro

 

Também a projecção da Basílica de São Pedro e da sua estrondosa cúpula, resulta de uma vontade de afirmação do Vaticano face aos fiéis em todo o mundo. Construída sobre a antiga basílica, na qual sob o altar se encontram os restos mortais de São Pedro, um dos 12 apóstolos de Jesus Cristo, e o primeiro Papa do Cristianismo, foram precisos mais de 100 anos para concluir o projecto. Miguel Ângelo (cúpula), Rafael e Bramante foram alguns dos nomes que contribuíram para tamanha realização, ostentado em pleno a imensidão do poderio daquele Estado.

 

Ao andar pelos corredores do Vaticano, o Diplomata não viu apenas em Miguel Ângelo e Rafael dois expoentes máximos da pintura renascentista (reconhecidos como tal ainda muito novos), encontrou dois homens ao serviço do poder.

 

A imponente estátua de Moisés sobre o túmulo do Papa Júlio II

 

Nesta lógica de servidão, e uma vez que nestes círculos surgem intrinsecamente guerras intestinas, lutas pelo poder, conspirações, disputa de influência, defesa de interesses, também entre Miguel Ângelo e Rafael não faltaram intrigas, suspeições e até mesmo sabotagens. Giorgio Vasari descreve de forma sublime como Rafael e o seu amigo Bramante, arquitecto do Vaticano, disputaram com Miguel Ângelo a proximidade com o centro de decisão, personificado no Papa.

 

Mais do que uma afirmação artística, estes artistas estavam também intimamente ligados ao poder e era algo que estavam dispostos a manter, através de alianças políticas e de movimentações diplomáticas.