O dilema da NATO: ajudar os "amigos" ou confrontar a Rússia?
Vladimir Putin de visita à Crimeia dois dias antes dos incidentes no Estreito de Kerch/Foto: Reuters
As notícias desta Terça-feira dão conta de um certo desanuviamento no Mar de Azov, tendo as autoridades ucranianas informado que os portos de Berdyansk e Mariupol foram “parcialmente desbloqueados” e que os navios mercantes já estão a circular através do Estreito de Kerch. Estas notícias surgem no mesmo dia em que a Ucrânia, através do seu ministro dos Negócios Estrangeiros, Pavlo Klimkin, esteve reunido em Bruxelas com os seus homólogos da NATO, na esperança de obter o seu apoio militar, nomeadamente ao nível naval. No entanto, a organização liderada por Jens Stoltenberg não está disponível para ir além daquilo que neste momento está a fazer no Mar Negro, ou seja, um papel de mera monitorização.
E, na verdade, a NATO não tem condições políticas para assumir uma acção mais relevante naquela região, não havendo uma vontade unânime sólida por parte dos aliados em confrontar a Rússia. Além disso, qualquer atitude mais musculada por parte da NATO poderia provocar uma escalada num conflito que, para já, permanece num registo de baixa intensidade. Em termos de realismo político, e nas actuais circunstâncias, não é do interesse da NATO e da Rússia que a situação se descontrole.
De certa maneira, desde que a Rússia anexou a Crimeia em 2014, zona que historicamente considerou sempre sua, ficou óbvio que, numa perspectiva de “realpolitik”, Moscovo não teria intenção de abandonar aquela península, tendo a Europa e os EUA acabado por aceitar tacitamente essa redefinição de fronteiras na região do Mar Negro. A tal ponto que o Kremlin não perdeu tempo na construção de uma ponte a ligar a Rússia continental à península da Crimeia.
E perante isto, como referia Jonathan Marcus, correspondente diplomático da BBC World, a NATO tem um dilema, que é saber como é que irá agradar aos seus “amigos” do Mar Negro sem hostilizar a Rússia. Sabendo-se que, para Moscovo, e atendendo ao seu comportamento histórico na gestão deste tipo de conflito, é de todo interesse que aquela situação “congele”.
Uma coisa é certa, a história da Guerra Fria demonstrou que, em matéria de estabilidade sistémica, optou-se quase sempre por sacrificar determinadas “amizades” em prol das necessidades cínicas do equilíbrio de poder entre as potências. Resta agora saber se a NATO, em nome da estabilidade entre blocos, aceita as novas fronteiras e regras impostas pela Rússia ou se assume uma posição de confronto aos avanços de Moscovo no Mar Negro.