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O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

O Irão e as sanções do Ocidente (1)

Alexandre Guerra, 23.08.12

 

Trabalhadores iranianos junto da central nuclear de Bushehr/Foto: Reuters - Mehr News Agency - Majid Asgaripour

 

Alguém acreditará que o regime iraniano mudará a sua política nuclear por, eventualmente, se sentir pressionado com as “sanções” de que tem sido alvo? Provavelmente, ninguém. Nem mesmo Washington ou Bruxelas, os principais impulsionadores das “sanções” aplicadas a Teerão.

 

Por um lado, e em termos genéricos, é praticamente um dado científico que a política de “sanções” se revela sempre mais penosa para o povo do que propriamente para as lideranças políticas. Em segundo lugar, e no caso concreto do Irão, as “sanções” impostas pelos Estados Unidos e pela União Europeia são relativamente suaves.

 

Citado pelo New York Times, Mark Dubowitz, director executivo da Foundation for Defense of Democracies, disse o seguinte a propósito das recentes medidas anunciadas pela administração americana: “This is really a game of whack-a-mole. These are incremental measures. What are needed now are measures more akin to economic warfare than these targeted, pinpoint measures.”

 

As “sanções” de natureza política e diplomática limitam-se a medidas como a restrição de atribuição de vistos ou de movimentos de algumas figuras do Estado iraniano. Também as de cariz económico circunscrevem-se ao congelamento de contas, à restrição de movimentos financeiros, ao embargo à venda de material militar ou à suspensão da cooperação bilateral nalgumas áreas, como energia ou seguros.

 

Nem mesmo o embargo inédito à importação de petróleo que a União Europeia decretou no Conselho Europeu dos Ministros dos Negócios Estrangeiros do passado 23 de Janeiro para começar a ser aplicado faseadamente a partir de 1 de Julho se revela muito prejudicial para o Irão, já que o grosso das exportações deste país são para a Ásia, com a China à cabeça, representando cerca de 22 por cento (dados do primeiro semestre de 2011). A seguir vem o Japão com 14 por cento e a Índia com cerca de 13 por cento. A Coreia do Sul representa 10 por cento das exportações.

 

Quanto aos 18 por cento de petróleo e de crude que o Irão exporta para a União Europeia, o problema coloca-se basicamente ao nível de dois ou três países, já que só a Itália e a Espanha, juntas, representam 13 por cento do total dessas exportações.

 

É verdade que, tal como Bruxelas e Washington referem, estas “sanções” em particular são dirigidas, sobretudo, aos elementos da cúpula iraniana, admitindo-se, no entanto, que possam “beliscar” um pouco a economia daquele país. Mas nada de muito significativo, para bem da população.

 

E quanto aos efeitos dessas “sanções” na acção da liderança iraniana, os resultados são aqueles que toda a gente vê: o presidente Mahmoud Ahmadinejad continua a desafiar Washington com o seu programa nuclear.

 

Perante isto, outra pergunta se impõe: “Por que razão a administração americana não endurece o regime de ‘sanções’ contra o Irão?”

 

Texto publicado originalmente no Forte Apache.


Dimitri Medvedev envia "recado" a Teerão e lança "charme" a Washington

Alexandre Guerra, 13.07.10

 

 

 

Em declarações raras mas interessantes, o Presidente russo, Dimitir Medvedev, afirmou que o regime de Teerão está “mais próximo” de ter o potencial para desenvolver armas de destruição maciça. Uma afirmação estranha vinda do Kremlin, que raramente se tem pronunciado contra o seu tradicional aliado, tendo esta sido uma das poucas vezes que Moscovo assume uma postura mais agressiva face a Teerão. Medvedev acrescentou ainda que “o Irão não está a agir da melhor maneira”, exortando para que mostrasse mais “cooperação e abertura” com a Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA).

 

As sólidas relações diplomáticas e económicas entre a Rússia e o Irão têm sido mais fortes do que as pressões internacionais no âmbito do programa nuclear iraniano, no entanto, nos últimos tempos Moscovo parece ter adoptado um registo mais crítico para com o regime liderado por Mahmoud Ahmadinejad.

 

Relembre-se que no passado dia 10 de Junho o Kremlin apoiou no Conselho de Segurança a quarta ronda de sanções contra o Irão. Agora, foi a vez do Presidente Medvedev, num encontro ontem com embaixadores, lançar o alerta de que o Irão se está a aproximar de ter tecnologia para produzir armas nucleares.

 

Apesar de Medvedev revelar que tal possibilidade não representa qualquer violação do Tratado de Não Proliferação Nuclear (NPT), as palavras do Presidente russo estão a ser interpretadas como resultado de alguma preocupação de Moscovo.

 

Na verdade, e que o Diplomata se recorde, esta recente posição do Governo russo é inédita perante a problemática do programa nuclear iraniano. Certamente que algo quererá dizer, sendo que a grande dúvida é saber precisamente o quê.

 

Aparentemente nada mudou no “dossier” nuclear iraniano, porém, a Rússia alterou o seu discurso. Por um lado, tal pode dever-se a uma efectiva preocupação por parte de Moscovo, assente em nova informação, eventualmente recolhida através de canais confidenciais. Por outro lado, as palavras de Medvedev podem ser vistas como um gesto de boa vontade com Washington, dias depois de ter eclodido a “crise” dos espiões.  

 

Nesta lógica, uma fonte da administração americana revelou que as declarações de Medvedev são um passo importante para se conseguir uma unidade internacional relativamente ao programa nuclear iraniano.

 

Fontes do Kremlin revelam ainda que o Presidente Medvedev está cada vez mais desconfortável com a relutância de Teerão em fornecer a informação pedida pela AIEA. Ao mesmo tempo, o Presidente russo terá ficado preocupado com as mais recentes informações fornecidas por Washington de que o Irão já teria suficiente material nuclear para fazer uma bomba atómica.

 

No que diz respeito à política interna russa é importante realçar o facto de que a posição de Medvedev sobre esta matéria começar a divergir substancialmente daquela que é defendida pelo seu antecessor e agora primeiro-ministro, Vladimir Putin.

 

Perante este cenário, será muito interessante perceber qual será a reacção de Putin na eventual necessidade de ter que vir defender o alinhamento histórico da Rússia face ao Irão.

 

Mais uma cena (repetida) do filme sobre o dossier nuclear iraniano

Alexandre Guerra, 07.02.10

 

 

O chamado "dossier" iraniano assemelha-se cada vez mais a um filme entediante, cheio de clichés e composto por uma sucessão de cenas repetidas.

 

Nos últimos anos, o processo negocial em redor da questão nuclear iraniana tem sido um "repeat" constante, com uma cascata de propostas do "Ocidente" e respectivas recusas do Irão. Pelo meio, normalmente, existe um período em que os intervenientes tentam passar a ideia de que acreditam verdadeiramente na virtude de tal processo, mas efectivamente, já todos sabem que o desfecho é mais do que prevísivel, ou seja, totalmente inócuo. 

 

Mais uma recusa de Teerão, e consequente contra-ataque, e lá volta o "Ocidente" a demonstrar os seus receios e apelar à comunidade internacional que não ceda às "chantagens" do regime iraniano. 

 

Na imprensa internacional, as notícias vão-se repetindo ciclicamente.

 

Veja-se, por exemplo, o artigo deste Domingo da BBC News: Iran makes new uranium enrichment challenge. Quantas vezes o Diplomata já leu este título em diferentes jornais e em diferentes momentos. 

 

Desta vez, a notícia refere-se à "cena" mais recente: o Ocidente tinha feito em Outubro uma proposta ao Irão, igual a tantas outras, e que consistia na exportação do urânio enriquecido do Irão para outros países que o pudessem processar em combustível nuclear para depois ser devolvido ao Irão, de modo a ser utilizado em "fins pacíficos".

 

Ora, pela enésima vez, o regime de Teerão recusou mais esta proposta há uns dias, provocando as habituais reacções "inflamadas" das chancelarias ocidentais, que ameaçaram de imediato com novas sanções. Quanto a Moscovo e a Pequim, o mesmo registo de sempre, apelando à "paciência" de ambas as partes.

 

Teerão, seguindo o "guião" à risca, contra-ataca e o Presidente Mahmoud Ahmadinejad anunciou há poucas horas na televisão estatal que vai aumentar os índices de enriquecimento de urânio para 20 por cento. Relembre-se que para a utilização em fins pacíficos, como a produção de electricidade, basta apenas um enriquecimento de 3 por cento, enquanto que para a aplicação em fins militares os níveis situam-se nos 90 por cento.

 

No meio de tudo isto, os vários registos noticiosos vão escrevendo esta frase:

"Western countries fear Iran is trying to develop nuclear weapons. But Tehran insists its programme is peaceful." Esta frase, que também já foi lida por este autor alguma centenas de vezes, assume quase um registo de informação institucional, daquela que se pode encontrar no final dos comunicados depois de um entretítulo "Sobre o" ou "About the".

 

Mahmoud Ahmadinejad passou o seu primeiro grande teste político

Alexandre Guerra, 06.09.09

 

 

Ao contrário do que se previa, e apesar das dificuldades com que se deparou, o Presidente do Irão, Mahmoud Ahmadinejad, acabou por passar o primeiro grande teste político desde que foi eleito no passado dia 20 de Agosto, ao conseguir ver aprovada a maioria da sua equipa ministerial no parlamento.

 

Dos 21 nomes propostos por Ahmadinejad, 18 foram aprovados pelo parlamento, incluindo uma mulher para a pasta da Saúde, sendo que as outras duas que estavam na lista do Presidente não tiveram a mesma sorte, e foram rejeitadas, tal com outro candidato para a Energia. 

 

Seja como for, a nomeação de Marzieh Vahid Dastjerdi, que se torna na primeira mulher a assumir uma pasta ministerial desde 1979, repesenta uma mais valia estratégica para Ahmadinejad, que pode assim enviar um sinal mais conciliatório aos sectores reformistas.

 

Por outro lado, ao aprovar quase todos os nomes avançados por Ahmadinejad, incluindo as pastas mais mais sensíveis, o parlamento demonstrou o seu apoio ao Presidente, o que até ao momento era algo que estava por clarificar.

 

Perante este cenário, Mahmoud Ahmadinejad vê a sua legitimidade política reforçada e, de certa forma, acabou por conseguir tirar os dividendos de uma estratégia que era arriscada, como aqui o Diplomata escreveu, mas que se revelou frutuosa.

 

Uma relação cada vez mais crispada

Alexandre Guerra, 28.08.09

 

Mahmoud Ahmadinejad e o ayatollah Ali Khamenei

 

Das entranhas do regime de Teerão veio um sinal interessante, que poderá, ou não, revelar o início de alguma divergência entre as duas principais figuras do Irão. O ayatollah Ali Khamenei revelou publicamente pela primeira vez uma posição diferente daquela que o Presidente Mahmoud Ahmadinejad assumiu.

 

No centro da celeuma está a possibilidade de vários representantes governamentais, jornalistas e académicos serem acusados pela justiça iraniana e com o apoio de Ahmadinejad de colaborarem com o Ocidente na tentativa de derrubar o regime do Irão.

 

Ahmadinejad tem sido um acérrimo dinamizador deste tipo de processos, independentemente da equidade e da justiça dos mesmos. O Presidente do Irão move-se claramente por vectores políticos que podem deturpar o enquadramento em que muitas acusações são feitas.

 

Desta vez, Ahmadinejad parece ter sido "travado" por Ali Khamenei que fez questão de informar que até ao momento não encontrou quaisquer provas que ligassem os acusados a Estados ocidentais, nomeadamente aos Estados Unidos e Reino Unido, com o objectivo de derrubar o regime iraniano. “I don’t accuse the leaders of the recent incidents of being affiliated with foreign countries, including the U.S. and Britain, since the issue has not been proven for me.”

 

Esta posição é bastante interessante, não tanto pelo conteúdo, mas pelo facto de contrariar peremptoriamente uma conclusão assumida por Ahmedinejad, que desde o início dos protestos nas ruas de Teerão após as eleições presidenciais não se coibiu de dizer que os manifestantes estavam a ser orquestrados e em conluio com as potencias ocidentais.

 

Uma das razões que terá levado Ali Khamenei a tomar esta posição está relacionada com a sua necessidade de voltar a ganhar alguma credibilidade e confiança junto de toda a nação iraniana, sobretudo após o conturbado período pós-eleitoral, no qual o ayatollah deu claramente o seu apoio a Ahmadinejad, ostracizando um sector da sociedade mais reformista que há muito que deixou de ser uma minoria.

 

E foi talvez esta constatação que Ali Khamanei terá feito, ao perceber que os críticos do regime são muito mais do que um mero grupo residual de pessoas.

 

Por outro lado, parece ser cada vez mais evidente que Ali Khamenei está a envidar todos os esforços para assegurar o poder enquanto figura máxima do regime. Não é por isso de estranhar que nos últimos tempos Khamenei e Ahmadinejad se tenham envolvido num clima de confrontação a propósito de várias nomeações para o novo Executivo, e agora também por causa de os processos judiciais contra alguns dos membros reformistas.

 

Ao New York Times, Abbas Milani, director de estudos iranianos na Universidade de Stanford, sintetizou a situação: “He [Khamenei] is stuck with Ahmadinejad, and he is stuck with the Revolutionary Guard and their daily demands to arrest [Mir Hussein] Moussavi. He is trying to calm them down.”

 

Moderados e conservadores preparam-se para infligir derrota política a Ahmadinejad

Alexandre Guerra, 23.08.09

 

 

Aquilo que poderia ser interpretado como um gesto político astuto por parte do recém eleito Presidente Mahmoud Ahmadinejad para atenuar as críticas dos sectores mais progressistas da sociedade iraniana, poderá acabar por criar-lhe um problema vindo da ala mais conservadora.

 

A decisão inédita desde a Revolução Iraniana de nomear três mulheres para o novo Governo até poderá ir de encontro às expectativas de milhares de pessoas que durante dias se manifestaram nas ruas de Teerão exigindo uma "abertura" no regime, mas, uma coisa é certa, a iniciativa de Ahmadinejad é rejeitada em absoluto pelos clérigos mais conservadores do Irão.

 

Estes já assumiram publicamente o seu descontentamento com a decisão do Presidente, tendo Mohammad Taghi Rahbar, um dos deputados da "linha dura", sido peremptório:"There are religious doubts over the abilities of women when it comes to management".

 

Segundo Rahbar, esta posição é defendida pela ala dos clérigos no parlamento, ou seja, é o mesmo que dizer pela maioria daquela câmara. Caberá a este órgão votar no final do mês de Agosto os 21 nomes propostos por Ahmadinejad para ocupar as pastas do Executivo.

 

Perante este cenário, adivinha-se um combate interessante entre o Presidente e o parlamento, podendo Ahmadinejad sofrer a primeira derrota política do seu mandato já nos próximos dias. 

 

Uma derrota que poderá ser dupla, já que também os moderados do parlamento dificilmente validarão o novo Executivo, por considerarem que carece de legitimidade democrática. 

  

Momentos com história

Alexandre Guerra, 12.06.09

 

FOTO: AFP

 

O ayatollah Ali Khamenei, o líder supremo espiritual, hoje, na hora de votar nas presidenciais do Irão, que opõem o actual chefe de Estado, Mahmoud Ahmadinejad, a outros três candidatos, sendo o reformista Mir Hossein Mousavi o seu principal rival. De acordo com as informações mais recentes, espera-se que o acto eleitoral tenha uma taxa de participação bastante elevada, depois de nos últimos dias a campanha ter "aquecido" com trocas mútuas de acusações. Caso nenhum dos cancidatos obtenha mais de 50 por cento dos votos, será realizada uma segunda volta.

 

Leituras

Alexandre Guerra, 25.05.09

 

A política da nova administração norte-americana face ao Irão é analisada em Have We Already Lost Iran?, no New York Times, por Flynt Leverett, director da New America Foundation e professor na Penn State's School of International Afffairs, e por Hillary Mann Leverett, presidente de uma consultora de risco político. Ambos já foram membros do National Security Council.

 

Interesses estratégicos sobrepuseram-se ao caso judicial de Roxana Saberi

Alexandre Guerra, 15.05.09

 

O Diplomataaqui tinha abordado a situação político-diplomática que enquadrava o caso da jornalista america-iraniana Roxana Saberi, detida durante vários meses no Irão  sob acusação de espionagem.

 

Após um julgamento sumário à margem da lei iraniana, condenando-a a oito anos de prisão, Washington criticou de imediato todo o processo. Uma posição que foi ouvida em Teerão, tendo o próprio Presidente Mahmoud Ahmadinejad exortado as autoridades judiciais do seu país a seguirem todos os trâmites legais.

 

Depois de Saberi ter sido libertada no íncio da semana, corroborando aquilo que já tinha sido escrito neste espaço, Saberi deixou o Irão com uma relativa facilidade, viajando para a Áustria antes de ir para os Estados Unidos.

 

Este desfecho, impensável há uns meses com a administração de George W. Bush, demonstra claramente que os interesses estratégicos de aproximação em curso entre Washington e Teerão sobrepuseram-se ao caso judicial de Saberi.