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O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

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Por falar em vender a alma ao Diabo...

Alexandre Guerra, 16.01.18

 

O lendário pacto de Fausto com Mefistófeles, no qual entrega a sua alma ao demónio em troca do domínio pleno da técnica e do conhecimento, tem sido reinterpretado ao longo dos séculos, seja através da literatura, pintura, teatro ou cinema. Goethe imortalizou aquela lenda alemã e, provavelmente, a ele se deve o facto de algumas almas mais perdidas se sentirem tentadas a forjar um acordo com o Diabo para obterem, digamos, certos benefícios especiais.

 

Uma dessas almas terá pertencido a Robert Johnson, o misterioso e célebre músico de blues do Delta do Mississippi e que, em certa medida, foi o precursor do que mais tarde viria a ser o Rock&Roll e o inspirador de guitarristas como Muddy Waters, Jimi Hendrix, Eric Clapton ou Keith Richards, entre tantos outros. Johnson morreu em 1938, com apenas 27 anos, e para a posteridade deixou um conjunto de músicas gravadas em duas sessões no Texas (Novembro de 1936 e Junho de 1937). Essas gravações são uma espécie de Bíblia para quem vive a música, não apenas como entretenimento, mas como paixão, como um dos elementos da vida. Aquelas gravações contêm a alma do Delta, quer o sofrimento sentido nos campos de algodão, quer a euforia electrizante da comunidade negra nas tardes de Sábado naqueles lugarejos poeirentos perdidos nos confins do Mississippi e Lousiana.

 

Johnson tocou como ninguém, como se tivesse sido bafejado por forças do Além. E é aqui que a lenda de Robert Johnson se cruza com a de Fausto. Esta é aliás uma das histórias mais importantes do folclore da zona do Delta. Por volta de 1930, em Robinsonville, Mississippi, Robert Johnson era um “little boy”, que nem tocava mal harmónica, mas era um desastre com a guitarra, diria anos mais tarde Son House, um dos pais do blues do Delta e que conviveu com o jovem músico. Vários relatos históricos dizem, de facto, que sempre que Johnson tocava era um suplício para quem o ouvia. É por esta altura que Johnson deixa Robinsonville durante alguns meses para ir aprimorar a sua técnica com Ike Zimmerman, de quem se dizia que tocava a sua guitarra de forma sobrenatural durante as visitas nocturnas que fazia às campas dos cemitérios.

 

A lenda de Robert Johnson nasce nesta altura, aquando do seu regresso a Robinsonville meses depois, com uma técnica e domínio da guitarra inexplicáveis para tão pouco tempo de aprendizagem. Diz a lenda que nos meses em que esteve fora terá feito um pacto com o Diabo (na figura de Legba) num “crossroads” próximo da plantação de Dockery. Nunca foi possível identificar o local do encontro, havendo várias referências a uma intersecção de estradas em Clarksdale, sabendo-se apenas que terá sido num cruzamento entre quatro caminhos poeirentos no meio do nada. O encontro deu-se à meia-noite, com a chegada de um homem negro e alto ao entroncamento, que pegou na guitarra de Robert Johnson, afinou-a e tocou umas músicas. De seguida, devolve a guitarra a Johnson. Em troca da sua alma, Johnson estava agora em condições de criar e tocar os blues que lhe iriam trazer fama e glória.

 

Esta história perdurou no tempo, tendo o próprio Son House confirmado, numa entrevista mais tarde, a veracidade do pacto firmado entre Johnson e o Diabo. Ao longo dos anos muito se tem especulado sobre o maléfico encontro e as capacidades (quase sobrenaturais) de aprendizagem do guitarrista. A lenda de Robert Johnson continua a fascinar todos aqueles que vêem no blues uma música que, mais do que notas, mostra aquilo que vai na alma do seu intérprete.

 

Esta é uma das cenas do filme "Crossroads" dos anos 80, inspirado precisamente na lenda de Robert Johnson, mas numa versão mais moderna e que se tornou objecto de culto para os amantes do blues e da guitarra. Aqui, Willie Brown, um dos músicos mais importantes do Delta e que tocou com Son House, agora retratado ficticiamente numa idade já avançada, aguarda pelo Diabo no "crossroads" para poder recuperar a sua alma.  

 

Texto publicado originalmente no Delito de Opinião

 

Um dos hinos anti-apartheid inspirados em Nelson Mandela

Alexandre Guerra, 07.12.13

 

"(Free) Nelson Mandela"
Criada no final dos anos 70 em Inglaterra, a  banda The Specials, com um estilo de ska "dançável" e toques de punk, viria a a rebaptizar-se no início dos 80 como The Special AKA após alguns membros terem saído da formação original. E foi precisamente já neste período que, inspirados em Nelson Mandela, compuseram este tema. Uma canção que o El País Brasil define como "espectacular e brilhante, de rua" que se "converteu no hino oficial do movimento antiapartheid pop".

A banda sonora dos anos Thatcher

Alexandre Guerra, 09.04.13

 

The Epping-based anarchist collective were among the most strident musical opponents of Thatcher. How Does It Feel … was one of two singles that addressed the Falklands war (along with Sheep Farming in the Falklands), and provoked Conservative MP Timothy Eggar to ask in parliament whether the band could be prosecuted under the Obscene Publications Act. The key verse? "Your arrogance has gutted these bodies of life/ Your deceit fooled them that it was worth the sacrifice/ Your lies persuaded people to accept the wasted blood/ Your filthy pride cleansed you of the doubt you should have had/ You smile in the face of the death cause you are so proud and vain/ Your inhumanity stops you from realising the pain/ That you inflicted, you determined, you created, you ordered/ It was your decision to have those young boys slaughtered."

Although Stand Down Margaret only appeared on single in a dub version – as a double-A side with Best Friend in 1980 – it remains possibly the single best known anti-Thatcher song, and one that was performed on TV comedy shows (as seen in the clip), as well as being a political rallying call. That the Beat were already issuing such an unequivocal demand only a year into her premiership shows the divisive power the nation's prime minister was already wielding.

The Blow Monkeys, you might recall, were minor mid-80s chartniks, purveying soul-flavoured pop in nice clothes. Their third album might be best remembered for the No 5 hit It Doesn't Have to Be This Way, but look at the record's title and you'll realise they were concerned with more than shoulder pads and early mobile phones – it was called She Was Only a Grocer's Daughter. The politics was given plain voice on this duet with Curtis Mayfield, released as a single and promptly banned by the BBC because it was put out to coincide with the general election campaign.

There were pop musicians who embraced the Conservative government of the 1980s. Gary Numan was a natural conservative, and Errol Brown of Hot Chocolate went so far as to appear at a Conservative party rally. But you'll search in vain for the heartfelt musical tributes to the Iron Lady. Even those groups one might associate with the yuppy boom – the likes of Spandau Ballet and Duran Duran – steered well clear, the former not least because their songwriter, Gary Kemp, was a committed socialist. And so in the name of balance we are forced to turn to a novelty punk song by a band from Burnley. It should be noted the song was released in April 1979, before the titular heroine was elected, though it became an indie hit a year later.


New Year's Day

Alexandre Guerra, 01.01.13

 

Inspirada no movimento Solidariedade na Polónia, a música New Year's Day dos U2, lançada em Janeiro de 1983 enquanto single do álbum War, é uma excelente forma de começar o ano de 2013.

A música é um hino à força da união de um povo, na luta por uma sociedade melhor, como aconteceu na Polónia nos anos 80 através do movimento liderado por Lech Walesa.

Tal como nos anos 60, também hoje milhões de pessoas tentam "libertar-se" de algo

Alexandre Guerra, 13.10.11

 

A música Hymn to Freedom interpretada pela vibrante Dione Taylor

 

Oscar Peterson, grande pianista de jazz e um dos músicos canadianos mais conhecidos de sempre, ficou conhecido pela sua mestria naquele instrumento, mas também pelas suas muitas composições, algumas delas ao serviço de causas nobres.

 

Desaparecido em 2007, Peterson foi um homem sensível aos movimentos sociais, tendo-se envolvido directamente na luta pela defesa dos direitos civis em comunidades multiculturais, o que lhe veio a valer, em 1972, a mais alta condecoração atribuída pelo Governo canadiano a um civil pelos seus esforços em prol de um mundo melhor.

 

Peterson esteve ainda ao lado de Martin Luther King nos anos 60, altura em que expressou a sua revolta da forma mais sublime através da arte.

 

A música Hymn to Freedom, cujo seu processo criativo se deve muito ao lendário Norman Granz e à letra de Harriette Hamilton, tornou-se num autêntico “hino” de vários movimentos civis na Europa e nos Estados Unidos e que ainda hoje é interpretada em diferentes versões.

 

Nos tempos que se vivem, de muita indignação e de protesto, é interessante ver que, tal como nos anos 60, também agora milhões de pessoas se tentam “libertar” de algo que consideram ser uma sociedade debilitada, um sistema falido e um paradigma nefasto, que está a infligir sofrimento e desespero nos cidadãos.

 

Perante estes novos movimentos que por aí surgem, de “indignados”, “acampados” e outros, por vezes, um pouco desorientados quanto ao rumo que pretendem seguir, nunca é demais relembrar a obra de homens como Peterson que, através das suas virtudes, fizeram perpetuar a sua mensagem ao longo dos tempos.

 

A Finlândia de Sibelius contra o império russo

Alexandre Guerra, 10.04.11

 

O famoso quadro de Edvard Isto que simboliza a resistência finlandesa no final século XIX, princípio do século XX, face à tentativa do império russo pôr fim à autonomia do Grande Ducado da Finlândia. A águia de duas cabeças é o símbolo da casa imperial russa, que a todo o custo tenta usurpar o livro da lei finlandesa./Museu Nacional da Finlândia

 

Ao longo da História das nações e dos povos têm sido vários os artistas que se entregam às causas nacionalistas. Uns mais do que outros, seja através da literatura, da música, da pintura, do cinema ou de qualquer outra forma de expressão artística.

 

O século XIX, que assistiu à efervescência dos nacionalismos, foi particularmente pródigo em colocar a arte, mais concretamente a música, ao serviço das causas patrióticas. Assim de repente, vem à memória do Diplomata nomes como Richard Wagner, Richard Strauss, Antonin Dvorak ou Isaac Albéniz.

 

Mas, este texto é para falar de um outro homem, Jean Sibelius (1865-1957). Compositor finlandês de música erudita que exortou o seu espírito nacionalista contra o poder do império czar russo nos finais do século XIX e princípios do século XX.

 

Sibelius enalteceu na sua obra as raízes e os valores nacionalistas da Finlândia, como forma de afirmação do país perante as tentativas de influência e de opressão estrangeira. Uma das suas fontes de inspiração foi o famoso poema épico Kalevala, uma obra que reúne várias cantigas populares antigas finlandesas, que foram passando de geração em geração e que contam os feitos ancestrais de heróis míticos daquele povo.

 

Uma espécie de Lusíadas, embora a autora do Kalevala, Elias Lönrot (1802-1884), tenha tido um trabalho sobretudo de compilação das cantigas populares e de criação de uma narrativa coerente e consistente, o que veio a conseguir.

 

 

Sibelius compôs vários poemas sinfónicos de pendor nacionalista inspirados no Kalevala, no entanto, foi a sua obra Finlândia que se viria a tornar no grande símbolo do nacionalismo finlandês.

 

A Finlândia é um poema sinfónico que foi escrito em 1899 para acompanhar as celebrações do Dia da Imprensa, um evento que tinha como objectivo criticar a influência crescente do império russo nos assuntos internos do então autónomo Grande Ducado da Finlândia.

 

Esta obra tornou-se um hino não oficial da Finlândia e um exemplo de patriotismo, tendo Sibelius ascendido à condição de herói. Quem tiver a oportunidade de ir a Helsínquia, pode apreciar um belo monumento de homenagem a Sibelius.

 

Historicamente, desde o século XII, a Finlândia sempre fez parte do grande reino da Suécia, tendo conseguido a sua autonomia enquanto Grande Ducado a partir de 1809, embora dentro do império russo, que se impôs pela força das armas do czar Alexandre I. Só em 1917 viria a obter total independência da Rússia, mas nem por isso deixaria de continuar a sofrer a tentativa de influência de Moscovo, nomeadamente durante a Guerra Fria.

 

The Wall

Alexandre Guerra, 22.03.11

 

 

Poucos meses depois da queda do Muro de Berlim, com o ano de 1990 já a decorrer, mais concretamente a 21 de Julho, aquela cidade acolhia um dos mais memoráveis e históricos concertos. Entre as Portas de Brandenburgo e a Praça de Potsdam, Roger Waters recriava o famoso The Wall, álbum conceptual dos Pink Floyd lançado em finais de 1979, perante uma assistência no local de mais de 350 mil pessoas e uma audiência televisiva de muitos milhões em 52 países. O The Wall não podia ser mais actual naquela conjuntura.

 

O Diplomataaqui tinha escrito e ontem à noite, no Pavilhão Atlântico, Waters voltou a erguer o “muro” para, de forma apoteótica e sublime, voltar a derrubá-lo, mas desta vez reconciliado com o público e consigo próprio. Mais comunicativo e divertido, Waters tem esgotado todos os concertos desta tournée mundial, iniciando agora em Portugal a etapa europeia. 

 

O concerto, que hoje se repete, consubstancia a perfeição técnica e o esplendor da arte. Musicalmente, o The Wall é magistral, com um argumento denso, mas hipnotizante. Sem dúvida, o The Wall é daqueles concertos raros, que se torna um privilégio para quem assiste, porque, mais do que a música e os efeitos, as pessoas sentem que se tornam parte da história.

 

Aquele espectáculo tinha sido montado apenas 31 vezes entre 1980 e 1981, o número de concertos repartidos por quatro cidades. A tournée acabou por revelar-se um projecto demasiado ambicioso e grandioso, dando prejuízo. No entanto, o The Wall já estava gravado na história.

 

O álbum tinha sido lançado em finais de 1979, para se tornar uma das referências dos Pink Floyd. Foi sobretudo um projecto pessoal de Roger Waters, seu criador, reflectindo o seu distanciamento com o público, os seus medos e angustias perante a indiferença da sociedade e a opressão do poder instituído. Um espelho da sua própria vida, muito marcada pelo papel austero da mãe e pela morte do pai na II GM.

 

O The Wall viria em 1982 ser adaptado para cinema pela mão de Alan Parker que, numa entrevista publicada ontem no jornal i, confessou a dificuldade de trabalhar com Waters. Seja como for, o filme viria a tornar-se uma referência cinematográfica, ficando na memória os brilhantes e provocatórios desenhos animados de Gerald Scarfe, conceituado cartoonista político britânico, e recuperados nos concertos da actual tournée.

 

O The Wall é um autêntico canal de comunicação para fortes mensagens políticas e sociais, que se mantém actual nos dias de hoje, de tal forma que foram feitas algumas alterações nas imagens projectadas durante o concerto e que têm provocado bastante polémica. Além dos políticos e governos, outro dos alvos tem sido as empresas, com a Shell e a Mercedes a serem fortemente visadas. Instituições financeiras e  companhias de área da área do grande consumo são igualmente bafejadas com a ironia e a sátira de Waters.

 

Como ainda ontem se lia no Público, Waters disse em comunicado que os seus medos pessoais de há 30 anos resultaram numa obra que funciona como "alegoria" para conceitos como o "nacionalismo, racismo, sexismo, religião". Waters dedica os concertos "a todos os inocentes mortos nos anos que se passaram".  

 

*Texto publicado originalmente no PiaR.

 

Música dos anos 80 é mais actual no Portugal de hoje do que na Inglaterra de Thatcher

Alexandre Guerra, 14.03.11

 

 

Ainda a propósito das manifestações de Sábado nalgumas cidades em Portugal e da actual conjuntura político-económica, o Diplomata recupera a música Don't Give Up de Peter Gabriel, interpretada em dueto com Kate Bush, que apesar de já ter 25 anos, encaixa-se perfeitamente enquanto banda sonora dos tempos que se vivem.

 

A letra conta o desespero de um homem que se sente frustrado, isolado da sociedade e derrotado pelo sistema capitalista, prestes a cair no abismo, sem esperança no seu futuro. Numa das passagens lê-se: "For every job, so many men. So many men no-one needs".

 

Estariam os tempos nos anos 80 no Reino Unido assim tão maus para Gabriel escrever uma letra deste género? Talvez, eventualmente nas classes mais operários e fabris, fortemente afectadas pelas políticas liberais de Margaret Thatcher, que conduziram à privatização de inúmeros sectores de actividade. Seja como for, a maioria dos britânicos apoiou a Dama de Ferro, mantendo-a mais de uma década à frente dos desígnios britânicos. 

 

Supõe-se então que os tempos não estariam assim tão maus, pelo menos para a maioria dos ingleses. Mas, hoje, é quase certo que para a maioria das portugueses, a música Don't Give Up faça mais sentido, tal como terá feito há 25 anos para os tais operários e trabalhadores fabris britânicos.

 

*O Peter Gabriel fez duas versões de teledisco para esta música, sendo que aquela aqui apresentada é posterior à original e a menos conhecida.

 

Quando os americanos fizeram da música de Hendrix o hino da guerra do Vietname

Alexandre Guerra, 17.01.11

 

 

Escrita por Bob Dylan e lançada originalmente em 1967, a música “All Along the Watchtower” nunca teve na sua génese qualquer ideal bélico ou de intervenção política.

 

Bastaram, no entanto, alguns meses para Jimi Hendix transformar aquela música num autêntico hino da guerra do Vietname. Mais “rasgada” e “eléctrica”, Hendrix edita a sua versão de “All Along the Watchtower” logo em 1968, celebrizando-se imediatamente, nomeadamente junto dos milhares de soldados americanos estacionados no Vietname. O que não é de estranhar, atendendo à naturalidade com que os primeiros refrões da música se adaptavam ao estado de espírito daqueles homens atolados no cenário de guerra vietnamita e sem fim à vista: “There must be some kind of way out of here, Said the joker to the thief, There’s too much confusion, I can’t get no relief.”

 

1968 foi dos anos mais difíceis da guerra do Vietname, marcado sobretudo pela Ofensiva Tet, a 30 de Janeiro, com homens do Exército do Vietname do Norte, apoiados pelos vietcongs (vietnamitas comunistas), a lançarem incursões nas cidades e províncias do Sul do país.

 

Embora em termos militares, as forças americanas com o apoio dos soldados sul-vietnamitas tenham conseguido, de certa forma, ripostar com alguma eficácia, a verdade é que a Ofensiva Tet teve um grande impacto psicológico nos Estados Unidos.

 

Apesar dos vietcongs sofrerem aproximadamente 30 mil baixas e das forças sul-vietnamitas terem ganho ânimo, esta Ofensiva representou um desgaste muito grande na liderança americana e representou um ponto de viragem na guerra do Vietname, obrigando na altura o Presidente Lyndon Johnson a anunciar que não se recandidataria.

 

Desde finais de 1967 que a situação começava a ser insustentável no seio da opinião pública americana. As baixas contavam-se às centenas todas as semanas e o custo anual da guerra era de 30 mil milhões. Nos Estados Unidos, os protestos anti-guerra aumentam e ficam cada vez mais violentos, com o ambiente político a tornar-se explosivo, depois dos assassinatos do histórico líder dos direitos civis, Martin Luther King, a 4 de Abril de 1968, e de Robert F. Kennedy, na altura candidato presidencial pelo Partido Democrata, a 5 de Junho desse mesmo ano.

 

Foi nesta conjuntura que os acordes da Fender Strato de Hendrix se passaram a ouvir nos muitos rádios espalhados pelo Sul do Vietname. “All Along the Watchtower” rapidamente passou a fazer parte do quotidiano da guerra, mas também da política americana.

 

Já com Richard Nixon na presidência dos Estados Unidos (eleito em Novembro de 1968), a 25 de Janeiro de 1969 iniciam-se negociações em Paris para o estabelecimento de tréguas, sendo que a 8 de Julho começa a retirada das forças americanas.

 

O conflito mantém-se no terreno, havendo mesmo uma intensificação de bombardeamentos americanos em 1972 contra o Vietname do Norte, permitindo que no Verão desse mesmo ano a situação estabilizasse para que as últimas tropas terrestres americanas abandonem o terreno. A 27 de Janeiro de 1973 assina-se o acordo de paz entre os Estados Unidos e o Vietname do Norte.

 

Ao recordar esta parte da História é impossível fazê-lo sem ser ao som de “All Along the Watchtower”, o single do Electric Ladyland, o terceiro e último álbum de Jimi Hendrix a ser produzido e lançado enquanto ainda era vivo.

 

*Com um dia de atraso, este é o primeiro texto de uma rubrica anunciada neste espaço na semana passado.

 

Histórias reais na música de Michael Nyman e nas letras de David McAlmont

Alexandre Guerra, 30.12.10

 

 

Uma das (boas) descobertas feitas pelo Diplomata em 2010 foi o soberbo álbum The Glare, do prestigiado compositor britânico Michael Nyman e do cantor David McAlmont, umas das vozes mais interessantes dos últimos anos no cenário musical do Reino Unido.

 

Embora tenha sido editado em finais de 2009, passado praticamente despercebido ao grande público, apesar das excelentes críticas internacionais, só em finais de 2010 é que o autor destas linhas teve conhecimento deste trabalho, com músicas de Nyman arranjadas com as letras e voz de McAlmont.

 

Musicalmente, o resultado é sofisticado, mas é sobretudo pelo contributo de McAlmont que o Diplomata traz até aqui este álbum, já que muitas das letras são inspiradas em acontecimentos ou reportagens reais. A história de um casal que fica milionário devido a um erro bancário, o lamento de uma mulher grávida prisioneira no Laos, o relato de um órfão zimbabweano ou a crónica do quotidiano de um estudante palestiniano são apenas alguns exemplos.

 

Uma das músicas refere-se a um líder europeu, com McAlmont a "vestir" a sua pele, utilizando um tom crítico e sarcástico para denunciar uma das figuras mais polémicas da política dos nossos dias. 

 

O Diplomata deixa aqui o desafio ao leitor para ouvir a música e descobrir sobre quem McAlmont canta. Não é difícil...