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O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

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A Jordânia não deve ser colocada "entre a espada e a parede"

Alexandre Guerra, 22.01.18

 

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Os "amigos" Mike Pence e Abdallah, no Domingo, em Amã/Khalil Mazraawi/Agence France-Presse — Getty Images  

 

O vice-Presidente dos EUA, Mike Pence, esteve no Domingo em Amã para se reunir com o Rei Abdallah. A Jordânia, quase despercebida no meio do caos geopolítico do Médio Oriente, é uma pedra angular na já muito frágil “ponte” de diálogo entre Washington e a Autoridade Palestiniana. A sua credibilidade advém, em minha opinião, de três factores: a estabilidade política e social do Reino Hachemita, o que faz daquele país um oásis naquelas paragens; Amã tem sido um parceiro moderado e fiável de Washington; a Jordânia é uma espécie de segunda casa para milhares de palestinianos que para ali foram rumando ao longo das décadas de conflito israelo-palestiniano. Este último factor é de extrema importância, porque imagine-se se um dia a Jordânia se lembrasse de “empurrar” para a Cisjordânia os milhares de palestinianos a viverem em campos de refugiados em território jordano. Ou pior, se Amã, cinicamente, incentivasse essas pessoas a regressarem à Cisjordânia de forma voluntária, numa lógica de efectivação do tão polémico e explosivo “direito ao retorno” dos refugiados. É verdade que muitas das gerações mais novas de palestinianos que vivem na Jordânia são cidadãos com nacionalidade jordana, no entanto, estima-se que haja mais de dois milhões de refugiados naquele país, muitos deles a viverem em campos de refugiados e dependentes do apoio das Nações Unidas, uma organização que deverá, entretanto, ver reduzida a contribuição dos Estados Unidos.

 

No que toca ao tabuleiro do conflito israelo-palestiniano, a palavra de Amã conta (e muito) e Washington tem bem essa noção. Pence esteve com Abdallah para o tranquilizar, afirmando que Washington continua comprometida com a reactivação do processo negocial e que continua a apoiar uma solução de dois Estados. O problema é que a decisão recente de Donald Trump em transferir a embaixada norte-americana para Jerusalém foi um acto ao qual a Jordânia não podia ficar indiferente. Embora Pence tenha definido a relação entre os EUA e a Jordânia como dois “amigos”, os relatos na imprensa dão conta de um encontro tenso. Na verdade, não podia ser de outra forma, tendo em conta as posições contraditórias no que à questão de Jerusalém oriental diz respeito.

 

A decisão de Trump veio colocar Amã numa situação delicada. Por um lado, tem de responder à sua população interna, que está a pressionar o Governo para ter uma atitude mais firme contra Israel e EUA, por outro, tem o Acordo de Paz com Israel de 1994 para cumprir. Além disso, a Jordânia é um dos países que mais ajudas recebe dos EUA. Segundo o New York Times, a Jordânia está actualmente a receber anualmente dos cofres de Washington cerca de mil milhões de dólares em assistência financeira. Àquele jornal, o analista político jordano, Amer Sabaileh, referia que Amã tem a perfeita consciência de que não pode ir contra Washington. Talvez, e até é bem possível que a Jordânia possa ser vista por esta administração de Trump como de interesse estratégico menor, contrariando a visão que os anteriores presidentes tiveram de apoiar aquele país, enquanto referencial de estabilidade numa zona de globo onde este atributo é um bem escasso, sobretudo com a anarquia em que se tornou o Iraque e a Síria.

 

É verdade que a Jordânia não pode, de um momento para o outro, meter em causa a aliança que tem com os EUA, mas Donald Trump e Mike Pence precisam de ter a noção de que os seus actos no processo israelo-palestiniano terão sempre consequências na “amizade” entre os dois países. Washington não pode colocar Abdallah “entre a espada e a parede”, porque o monarca hachemita poderá ver-se obrigado a tomar medidas cujas consequências podem ser muito nefastas para a região. Nunca esquecer que os mais de dois milhões de refugiados palestinianos não deixam de ser um “activo” explosivo. Além disso, Washington deve ter sempre em consideração que em matéria de alianças nas relações internacionais, nunca há vazios.

 

"Boiling point", a questão jordana

Alexandre Guerra, 04.02.16

 

O gigantesco campo de refugiados Al Zaatari, na Jordânia, que acolhe refugiados sírios 

 

Nas últimas semanas, o Diplomata viu duas entrevistas do Rei Abdallah da Jordânia (uma na Euronews e outra na BBC News) a alertar para o problema que o seu país está enfrentar com o fluxo massivo de refugiados sírios, começando a provocar uma sobrecarga excessiva nos sistemas de saúde e educacional do país, já para não falar dos problemas acrescidos de segurança e integração. Mais do que um alerta, o monarca hachemita estava a fazer um sério aviso às potências com responsabilidades directas na procura de uma solução para o conflito sírio e para a questão dos migrantes. Ontem, à margem da conferência de dadores que se está a realizar em Londres, Abdallah teceu novas declarações, indo agora um pouco mais longe para dizer que o Jordânia está num "boiling point". Ou seja, o país está prestes a "rebentar".

 

Vejam-se os números: actualmente a Jordânia acolhe 600 mil sírios do total de 4,6 milhões que estão registados pela ONU. No entanto, o Governo jordano diz que existe mais de um milhão de refugiados sírios no país que não estão registados. Algo que não é muito difícil de acreditar. Tudo isto num país que tem uma população e área semelhantes à de Portugal. Além destes dados, é importante não esquecer que na composição de toda a sua população se encontram cerca de dois milhões de palestinianos com o estatuto de refugiado da UNWRA. Durante décadas, a Jordânia tem sido uma espécie de "segunda casa" para os palestinianos, num processo que, naturalmente, foi evoluindo e estabilizando ao longo dos anos. Ou seja, a questão dos palestinianos na Jordânia normalizou-se e deixou de ser um "issue" particularmente preocupante. O mesmo já não se pode dizer do que está a acontecer com a chegada de milhares de sírios à Jordânia num curto espaço de tempo, colocando novos problemas e ameaças ao reino hachemita.

 

Um desses problemas tem a ver com a ameaça à segurança, porque é importante lembrar que a Jordânia tem sido um dos poucos (senão o único) países do Médio Oriente que tem conseguido garantir estabilidade interna e apresentar-se como uma referência moderada na região. Tem sido um interlocutor de confiança com Washington, tem um tratado de paz com Israel, ao mesmo tempo que faz a ponte com vários estados árabes e, naturalmente, com a Palestina. A isto acresce o facto do Rei Adballah ter o seu território perfeitamente controlado no que diz respeito a grupos terroristas. Pelo menos até agora. E é esse um dos principais pontos de preocupação do Rei jordano, perante a chegada descontrolada de milhares de sírios ao seu país, uma realidade que pode comprometer o seu actual quadro de referência e estabilidade.  

 

Abdallah já percebeu o potencial problema e daí os vários alertas que tem lançado às potências internacionais: ou estas começam a olhar com atenção para a questão jordana ou então corre-se o risco daquele país ficar numa situação fragilizada e propícia à emergência de focos terroristas. O aviso está feito. 

 

Afinal quem lançou o “rocket” que atingiu a Jordânia?

Alexandre Guerra, 23.04.10

 

Por incrível que pareça, ninguém se acusa ou parece saber quem foi o responsável pelo lançamento do “rocket” que atingiu ontem Aqaba, cidade costeira da Jordânia banhada pelo Mar Vermelho. Os destroços do “misterioso” míssil, como lhe chama a BBC News, foram recolhidos pelas autoridades jordanas, tendo o primeiro-ministro, Samir Rifai, afastado a hipótese do lançamento ter sido efectuado do interior do país com o objectivo de atingir o Estado vizinho de Israel.

 

Pelo contrário, a Jordânia diz que Aqaba é que era o alvo, rejeitando, assim, a teoria de tratar-se de um possível lançamento falhado perpetrado por algum grupo terrorista a operar no seu território contra Israel.

 

No entanto, os israelitas não perderam tempo em descartarem-se de qualquer responsabilidade sobre o sucedido, tendo antes acusado os egípcios de serem os autores do lançamento, eventualmente, com o objectivo de atingir Eliat, mas que terá caído acidentalmente Aqaba. Claro está que o Cairo rejeitou esta teoria.

 

Uma coisa é certa, a região israelita de Eliat, muito próxima de Aqaba, é um alvo potencial para os grupos radicais islâmicos que se movimentam no sul da Jordânia e no deserto do Sinai egípcio, tendo no passado já perpetrado vários ataques contra aquela cidade turística judaica.

 

As autoridades jordanas, inclusive, detiveram em 2001 na zona de Aqaba terroristas do Hezbollah vindos do Líbano, que se preparavam para lançar “rockets” Katyusha sobre Eliat.

 

De acordo com as autoridades jordanas, o “misterioso” míssil é um Grad, de fabrico russo com alcance máximo de 40 quilómetros. Além deste “rocket” houve um outro que também terá sido lançado, mas caído no mar. 

 

O "peregrino da paz" em penitência na Terra Santa

Alexandre Guerra, 08.05.09

 

Reuters

 

O Papa Bento XVI já está a caminhar na Terra Santa, mais concretamente no reino hachemita da Jordânia, país no qual passará a maior parte dos oito dias desta deslocação ao Médio Oriente, que incluirá Israel e Cisjordânia.

 

Ao chegar ao aeroporto de Amã, o Sumo Pontífice, que tinha à sua espera o monarca Abdallah II acompanhado de sua mulher Ranya, começou por manifestar um "profundo respeito" pelo Islão. Deste modo, iniciou a sua penitência pelo discurso proferido em Ratisbona, em 2006, e que incendiou os corações e as mentes de milhões de muçulmanos por todo o mundo.

 

Um discurso que tem sido relembrado efusivamente pelos líderes islâmicos mais radicais jordanos, nomeadamente pela Irmandade Muçulmana daquele país e pelo partido Islamic Action Front, exigindo a Bento XVI um pedido de desculpas aos 1,5 mil milhões de muçulmanos espalhados pelo mundo.

 

O presidente deste último partido, Zaki Bani Rsheid, de acordo com a BBC News, chegou mesmo a escrever uma carta ao primeiro-ministro jordano, há sensivelmente um mês, precisamente para materializar este pedido.

 

Se em condições normais uma qualquer visita papal ao Médio Oriente é motivo de preocupações de segurança acrescidas, neste caso o cenário torna-se ainda mais delicado. Efectivamente, por esta altura Bento XVI estará na "mira" de muitos radicais islâmicos. 

 

Perante isto, o Diplomata não hesita em dizer que o Papa demonstra coragem e, certamente, "fé"  para pisar neste momento a Terra Santa. Mas, Bento XVI revela uma outra coisa: uma estratégia inteligente assente, sobretudo, em dois pilares.

 

Primeiro, começou por se assumir como um "peregrino da paz", um título que, por exemplo, foi utilizado em destaque pelo Haaretz.

 

Em segundo lugar, Bento XVI esvaziou ao máximo qualquer conteúdo político que pudesse estar associado a esta visita.

 

O Papa tem como principal objectivo promover o diálogo inter-religioso, entre a minoria cristão, que na Jordânia se resume a 110 mil pessoas, ou seja,  2 por cento da população, e judeus e muçulmanos. E nesta lógica, o Papa considera que a Jordânia está na primeira linha para a prossecução desta missão.