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O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

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UE "abre as portas" à internacionalização do conflito na Síria

Alexandre Guerra, 29.05.13

 

Forças leais a Bashar al-Assad treinam em local incerto, 22 de Maio de 2013/Foto: Reuters

 

A decisão do último Conselho Europeu dos Ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia, reunido durante 12 horas, abriu formalmente as portas à internacionalização e à escalada do conflito na Síria, ao deixar, na prática, a cada Estado-membro o critério de enviar armas para os rebeldes sírios.

 

Apesar dos 27 se terem comprometido a não enviar qualquer material bélico para aquele país até ao dia 1 de Agosto, altura em que será revista esta posição, este gesto não é mais do que uma declaração de princípios, já que formalmente o embargo de exportação de armas que tinha sido imposto pela UE à Síria não foi renovado. 

 

Mais do que internamente -- porque é bastante provável que nenhum dos 27 vá enviar armas para a Síria até Agosto --, esta decisão do Conselho Europeu tem implicações na percepção que algumas potências terceiras com interesses na Síria possam ter. O caso mais imediato é o da Rússia que já reagiu com desagrado à posição da UE.

 

Para o Kremlin, a diplomacia europeia está a enviar sinais claros de que pretende, a curto prazo, começar a fornecer armamento à oposição síria. Uma interpretação que o autor destas linhas considera ser pertinente, atendendo à deterioração que se vai sentido no terreno, com mais de 80 mil mortos e 1,5 milhões de refugiados.

 

Na verdade, a situação está a tornar-se insustentável para as chancelarias ocidentais mais poderosas, que começam a ter muitas dificuldades para explicar a passividade em relação ao que se passa na Síria, ao mesmo tempo que prestam apoio militar noutros cenários de guerra, provavelmente nesta altura bem menos dramáticos e sangrentos.

 

Neste sentido, o chefe da diplomacia britânica, William Hague, fez questão de sublinhar que o dia 1 de Agosto não representa qualquer "deadline", porque o Reino Unido poderá começar a partir de agora a armar os rebeldes sírios, no entanto, não existem planos para tal. Pelo menos até à ronda de negociações de Genebra agendada para meados de Junho.

 

Quem não vai esperar pela próxima ronda de negociações é a Rússia, que reagiu de imediato à decisão do Conselho Europeu com o anúncio do envio do poderoso sistema de míssil terra-ar S-300 comparável ao famoso sistema americano Patriot.

 

A decisão do Kremlin veio dar uma nova dimensão ao conflito sírio, uma vez que Israel já avisou, através do seu ministro da Defesa, Moshe Yaloon, que não tolerará a instalação dos S-300 na Síria. Para já, o Governo hebraico informa que os sistemas S-300 ainda não saíram da Rússia. Por outro lado, surgem notícias de que o Kremlin poderá aproveitar esta situação para negociar com Israel. Ou seja, recua na questão dos S-300 em troca do compromisso israelita de não efectuar raides aéreos sobre território sírio. 

 

Por esta altura em Israel as forças armadas hebraicas (IDF) devem estar em alerta máximo, perante a volatilidade na Síria e o crescente envolvimento de mais actores. Como escrevia o Haaretz, Israel está entre os guerrilheiros do Hezbollah e os mísseis russos, jogando cada vez mais os seus interesses em território sírio.

 

Neste momento, existe a ideia em Israel que uma derrota massiva do Hezbollah na Síria poderia representar um golpe fatal para aquela organização terrorista no Irão e no Líbano. E nesta lógica, Telavive pretendia aproveitar o apoio europeu aos rebeldes sírios para ajudar a combater os  homens do Hezbollah, porém, a movimentação mais recente da Rússia veio alterar esse cenário.

 

Em Washington, bem longe, a administração do Presidente Barack Obama critica a atitude da Rússia ao mesmo tempo que se congratula com a decisão do Conselho Europeu. Mas para já, a Casa Branca não parece muito disposta a enviar armamento para os rebeldes, apesar das pressões de muitos republicanos nesse sentido. 

 

Caso esta escalada se acentue, a Síria poderá tornar-se no palco de um potencial conflito regional. As perspectivas não são animadoras, até porque não se esperam grandes resultados da conferência de Genebra.

 

Texto publicado originalmente no Forte Apache.


Prenúncio de uma terceira guerra entre Israel e o Hezbollah no Sul do Líbano

Alexandre Guerra, 18.07.10

 

 

A aparente tranquilidade que se vive na zona fronteiriça entre o Norte de Israel e o Sul do Líbano poderá esconder uma situação potencialmente explosiva, pelos menos se se tiver em conta alguns indícios que têm surgido nas últimas semanas, perspectivando uma Terceira Guerra Israelo-Libanesa.

 

Um relatório de Daniel C. Kurtzer do Center for Preventive Action do think tank Council on Foreign Relations, publicado este mês de Julho, alerta para a possibilidade de eclodir nos próximos 12/18 meses um conflito entre Israel e o Hezbollah no Líbano. Se tal acontecer será o terceiro na história do Médio Oriente entra aquelas partes, tendo o último ocorrido no Verão de 2006, provocando a morte de mais de 1000 civis e o desalojamento de cerca de um milhão de pessoas em território libanês, assim como o abandono temporário de milhares de judeus no Norte de

 

Israel. Na sequência deste conflito o Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovou a Resolução 1701.

 

Apesar de o relatório de Kurtzer constatar que a situação na fronteira entre Israel e o Líbano vive o período de maior acalmia da última década e que os militantes do Hezbollah têm tido uma atitude bastante passiva em relação a algumas manobras militares das forças de segurança israelitas (IDF), nomeadamente os voos de reconhecimento dos caças israelitas, a verdade é que existem indícios de que um conflito pode estar iminente entre as duas partes.

 

Kurtze não tem dúvidas ao referir no seu relatório que aquele movimento está mais forte militarmente quando comparado com 2006, violando, assim, a Resolução 1701.

 

Tal como aconteceu há quatro anos, tudo pode começar com incidentes bélicos de pequena escala, com “objectivos limitados” mas que rapidamente poderão extravasar para um conflito de grande intensidade. Por exemplo, o Hezbollah pode decidir atacar alvos específicos judaicos junto à fronteira, argumentando que está a “responder” aos voos israelitas ou à eventual morte de militantes seus devido a ataques de soldados do Exército hebraico.

 

Caso o rastilho seja aceso pelo Hezbollah, tal pode ficar a dever-se a duas razões, diz Kurtzer.

 

A primeira tem a ver com a morte recente do inspirador religioso xiita, Muhammad Hussein Fadl’Allah. O Hezbollah poderá querer dar novamente um ímpeto ao seu movimento, através da união dos xiitas libaneses, sendo que para cumprir tal objectivo nada melhor do que criar um clima de animosidade contra o histórico inimigo: Israel.

 

Este cenário é possível e, certamente, bem observado, no entanto, o Diplomata considera que dificilmente seja uma estratégia a seguir pelo Hezbollah.

 

Mais realista e previsível é a segunda razão apontada por Kurtzer. É importante sublinhar que quatro anos depois da Segunda Guerra Israelo-Libanesa, surge um factor novo e que tem sido um dos motivos de maior preocupação para a comunidade internacional e para Israel: o programa nuclear iraniano. Aqui, poderia ser o próprio regime de Teerão a “forçar” um conflito entre o Hezbollah e Israel, como forma de desviar as atenções da questão nuclear.

 

No entanto, e ironicamente, talvez seja Israel quem mais teria a ganhar com esta situação, já que poderia aproveitar um conflito com o Hezbollah para alargar o campo de batalha ao Irão, com o argumento de que este estaria a apoiar aquele movimento. Com um conflito regional instalado, Israel tinha o caminho aberto para levar a cabo os tão ambicionados ataques às instalações nucleares iranianas. Esta lógica é extensível à Síria.

 

Ainda sobre os prenúncios da Terceira Guerra Israelo-Libanesa, no início do mês, o secretário-geral Ban Ki-moon alertou para o perigo do “recomeço das hostilidades” entre Israel e o Hezbollah. Este receio surge na sequência do mais recente relatório da força da ONU no terreno, a UNIFIL, que apesar de referir que existem apenas suspeitas de estarem a ser transferidas armas para aquele movimento, verifica-se um aumento da tensão entre as duas partes no Sul do Líbano.

 

De acordo com alguns testemunhos, neste momento a situação não é crítica, mas sente-se um clima de tensão e de alguma violência de baixa intensidade na região do Sul do Líbano.

 

Para já, Ban Ki-moon informa que não existem provas concretas de transferência ilegal de armas para aquele movimento xiita, no entanto, em Abril último, já o Presidente israelita Shimon Peres, tinha acusado a Síria de estar a fornecer mísseis Scud ao Hezbollah. O primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, disse ainda que militantes do Hezbollah estariam a receber treino na Síria para aprenderem a operar aqueles mísseis.

 

Washington apoiou estas acusações, embora nenhuma delas tenha sido provada, tendo Damasco rejeitado também qualquer envolvimento nesta questão.

 

O relatório de Kurtzer fala também na possível aquisição por parte do Hezbollah de mísseis terra-ar S-300, que poderiam colocar em risco a aviação israelita.