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O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

1989-1991: Três anos em que os ventos de mudança sopraram muito forte

Alexandre Guerra, 19.01.14

 

 

São poucas as músicas que conseguem captar tão fielmente o espírito de uma determinada época, como o fez "Wind of Change" dos Scorpions ao descrever o fim da Guerra Fria e da União Soviética.

 

Inspirada na Perestroika e na Glasnost levadas a cabo pelo líder soviético, Mikhail Gorbachev, na segunda metade dos anos 80, "Wind of Change", integrada no álbum Crazy World, viria a tornar-se um sucesso comercial no Verão de 1991, logo após o golpe falhado perpetrado pela ala mais conservadora do Partido Comunista na ainda União Soviética.

 

Esse movimento tentou aproveitar a ausência de Gorbachev de Moscovo (que passava férias na Crimeia) para repor uma liderança anti-reformas. O golpe acabaria por falhar e a 25 de Dezembro desse ano Gorbachev anunciava formalmente o fim da União Soviética. Terminava assim um período de ventos de grandes mudanças na História da Europa, que tinha começado com a Queda do Muro de Berlim, a 9 de Novembro, e com o consequente desmoronamento do Bloco Soviético.

 

A estranha relação entre bikinis, testes nucleares e a UNESCO. Ou talvez não...

Alexandre Guerra, 05.07.11

 

 

O “bikini”, essa grande invenção da Humanidade, foi apresentado pelo designer francês, Louis Reard, precisamente a 5 de Julho de 1946, perante os olhares de espanto quando Micheline Bernadini, uma rapariga parisiense, surgiu numa piscina em Paris, ostentando apenas duas peças de indumentária sobre o seu corpo.

 

Por esta altura, já estará o leitor a questionar-se a que propósito se fala de “bikinis” aqui neste espaço. O Diplomata admite tratar-se de uma história já em registo de silly season, mas vem agora a parte mais séria.

 

 

Sem qualquer ideia para o nome que atribuiria a tamanha criação, Reard baptizou espontaneamente aquela invenção de  “bikini”, inspirando-se nas notícias da altura sobre o Atol Bikini, um pequeno pedaço de território no meio do Pacífico que faz parte das Ilhas Marshall.

 

E perguntará a leitor a que propósito o Atol Bikini teria honras mediáticas? A resposta é simples.

 

Numa altura em que a Guerra Fria começava a “aquecer”, os Estados Unidos iniciaram em 1946 uma série de testes nucleares em Bikini, começando com a Operation Crossroads, duas explosões conduzidas na atmosfera a baixa altitude, sendo a primeira realizada a 1 de Julho daquele ano, poucos dias antes da apresentação do "bikini" de Reard.

 

Os testes prolongar-se-iam até 1958, perfazendo um total de 23, sendo que em 1954 os Estados Unidos levariam a cabo a operação Castle Bravo, a primeira detonação de uma bomba termonuclear, na altura a mais potente de sempre com 15 megatoneladas.

 

O Atol Bikini foi classificado em Agosto do ano passado Património Mundial, tendo a UNESCO destacado, além das suas belezas naturais, a importância que os seus locais de testes nucleares tiveram na formação de uma consciência colectiva do drama daquela tecnologia na segunda metade do século XX. 

 

Lições de história que Obama e Cameron devem ter bem presentes

Alexandre Guerra, 15.11.10

 

 

Estava-se no dia 13 de Novembro de 1986 quando o então Presidente da União Soviética, Mikhail Gorbachev, traçou um cenário pessimista relativo à intervenção militar do seu país no Afeganistão. “Estamos a lutar há anos e se não mudarmos de estratégia estaremos aqui mais 20 ou 30”, disse o líder durante uma reunião do Politburo.

 

Corria então o sétimo ano de guerra e os 110 mil soldados soviéticos continuavam sem conseguir derrotar os mujahedin. Oito mil homens do Exército Vermelho já tinham morrido e 50 mil ficado feridos. Do lado afegão os mortos contavam-se às centenas de milhar.

 

Perante este cenário, Gorbachev acrescentou ainda: “Nós não estamos a conseguir aprender a forma de travar a guerra. Nós tínhamos definido um objectivo: promover um regime amistoso no Afeganistão. Mas, agora, temos que acabar com este processo o mais rápido que conseguirmos.”

 

Palavras que, de certa forma, se assemelham àquilo que o Presidente americano Barack Obama e o primeiro-ministro britânico, David Cameron, disseram recentemente sobre o actual conflito no Afeganistão.

 

O Diplomata não gosta de comparações entre diferentes realidades históricas, no entanto, já ilações devem ser tiradas do envolvimento soviético no Afeganistão durante os anos 80.

 

O historiador Victor Sebestyen aconselha mesmo, num artigo de opinião na edição de Novembro da revista Prospect, que os actuais líderes americano e britânico analisem com atenção os mais recentes documentos disponibilizados por Moscovo a investigadores russos e americanos sobre os últimos anos da era soviética e o seu envolvimento no Afeganistão.

 

É certo que os contornos são diferentes e qualquer comparação arrisca-se a ser um exercício desvirtuado. Porém, há algo em comum entre estes dois conflitos no que respeita às motivações e dilemas das lideranças políticas.

 

Então, tal como hoje, Gorbachev era um líder recém-chegado ao poder e herdava nas mãos um conflito prolongado, oneroso e sem fim à vista, tal como aconteceu com Obama e Cameron.

 

Quando em Março de 1985 ocupou o Kremlin, Gorbachev disse de forma convicta que a retirada do Afeganistão seria a sua prioridade. Uma declaração feita numa perspectiva política e dirigida à opinião pública, mas desligada da verdadeira realidade do conflito. Gorbachev rapidamente percebeu que a tarefa a que se propôs era praticamente impossível de concretizar sem que com isso a União Soviética “perdesse a face”.

 

Um dilema com o qual Obama e Cameron se viram confrontados mal chegaram aos seus gabinetes, obrigando-os a refrear os ímpetos de debandada do Afeganistão.

 

A retirada soviética do Afeganistão sem qualquer ganho no terreno teria sempre consequências desastrosas para o império. Quando em Fevereiro de 1989 os últimos soldados soviéticos abandonam o Afeganistão deixavam para trás 15 mil camaradas mortos.

 

Política ou estrategicamente a União Soviética nada ganhara com a intervenção no Afeganistão, tendo pelo contrário, sido humilhada e ferida de morte na projecção da sua imagem enquanto super potência militar.

 

Dois anos depois e algumas revoluções pelo meio dava-se a implosão do império soviético e o desmembramento da URSS. O desastre no Afeganistão não foi a única causa do fim da Guerra Fria, mas foi certamente o catalisador que precipitou a derrocada do Pacto de Varsóvia e da URSS.

   

70 anos depois será que a Rússia partilha o sistema de valores das nações europeias?

Alexandre Guerra, 01.09.09

 

Em comentário na SIC Notícias sobre o 70º Aniversário do início da II Guerra Mundial, que esta Terça-feira se assinalou na Polónia, Nuno Rogeiro fez uma observação muito pertinente quanto à evolução e identificação comum do sistema de valores dos Estados europeus.

 

Sete décadas volvidas sobre o começo do conflito mais devastador da História, existe hoje uma partilha de valores inequívoca na Europa, que impossibilitaria, mesmo ao mais pessimista dos analistas ou historiadores, prever qualquer guerra entre nações europeias.

 

Sendo certo que existem especificidades e sensibilidades diferentes em cada nação do Velho Continente, é inegável a criação de um tronco comum de valores na Europa fortalecido com a construção do projecto europeu.

 

Robert Kagan, na sua célebre obra Of Paradise and Power, foi lúcido quando referiu que a "Europa estava a virar as costas ao poder, ou a dar-lhe pouca importância, para mover-se para o mundo das leis e da ordem, da negociação transnacional e da cooperação". Com isto a Europa está a entrar num "paraíso pós-histórico de paz e relativa prosperidade".

 

De certa forma, é isso que se tem vivido na Europa nas últimas décadas, sobretudo a partir do fim da Guerra Fria. Os Estados europeus têm partilhado esta visão comum, de forma particularmente empenhada no projecto europeu.

 

Por isso, Nuno Rogeiro considera altamente improvável que os países do Velho Continente se voltem a envolver em conflitos armadas. Mas tal não se deve à inexistência de interesses divergentes ou de conflitos ideológicos (porque os há), mas precisamente porque existe uma base de valores partilhada e comum.

 

A grande dúvida que Nuno Rogeiro colocava, e a qual o Diplomata também partilha, é saber se a Rússia recriada à imagem de Vladmir Putin se revê no sistema básico de valores em que as nações europeias assentam.