Como é habitual nesta altura do ano por ocasião da sessão de abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas, viveram-se dias de grande actividade diplomática na sede daquela organização em Nova Iorque. É um acontecimento que reúne líderes de todo o mundo, muitos dos quais aproveitam o momento para realizarem autênticas ofensivas políticas, como foi, mais uma vez, o caso do Presidente do Irão, Mahmoud Ahmadinejad.
Mas é também o momento em que muitos chefes de Estado aproveitam para fazer “diplomacia de corredor” na defesa dos seus interesses. Aliás, Portugal foi um exemplo, com o primeiro-ministro José Sócrates a ir a Nova Iorque para captar apoios para a candidatura do país ao Conselho de Segurança enquanto um dos dez membros rotativos não permanentes. Além do discurso proferido na Assembleia, Sócrates encetou vários encontros bilaterais com representantes de vários países.
Os corredores da ONU nesta altura do ano podem representar oportunidades particularmente importantes para pequenos estados como Portugal.
Como alguém dizia há uns anos, apesar de todos os seus males, a Assembleia Geral das Nações Unidas é o único sítio onde todos países podem falar uns com os outros de igual para igual.
Efectivamente, a lógica reinante é de um país, um voto, sejam os Estados Unidos ou o Togo. Ao contrário do Conselho de Segurança, onde os cinco membros permanentes têm poder de veto, na Assembleia Geral impera a lógica democrática da igualdade jurídica entre os Estados.
É por isso que ao nível das deliberações da Assembleia Geral a posição política veiculada por Estados de quem nunca ninguém ouviu falar pode assumir contornos particularmente importantes na discussão de algumas matérias sensíveis e respectivas votações.
Poucas pessoas já deverão ter ouvido falar em países como Nauru ou Tuvalu, já que se tratam de duas das nações mais pequenas do mundo, ilhas situadas no meio do Pacífico, não tendo ambas mais do que 30 mil habitantes.
Insignificantes no xadrez da política internacional, assumirá o leitor. Uma assumpção compreensível, mas que não corresponde necessariamente à verdade, pelo menos no que toca ao Nauru e ao Tuvalu.
Por mais estranho que pareça, aqueles dois países são suficientemente importantes para despertar a atenção de Washington e Moscovo. Não pela sua posição estratégica, pelas suas riquezas minerais ou por uma eventual parceria de contratos para a venda de material militar, mas sim por causa do seu voto na Assembleia Geral. Um voto que poderá ser muito importante no que toca ao reconhecimento de novas nações independentes ou no apoio de resoluções.
Thomas de Waal relembra, num artigo na The National Interest, que o Nauru se tornou em 2009 no quarto país a reconhecer a Abecásia e a Ossétia do Sul como Estados independentes. Aquele autor justifica este estranho apoio por razões meramente financeiras, sugerindo que a bancarrota dos cofres de Nauru levaram o país a transformar o seu assento na Assembleia Geral em dinheiro.
Mas isto só é possível aproveitando o jogo geoestratégico entre os Estados Unidos e a Rússia. A independência do Abecásia e da Ossétia do Sul é do interesse de Moscovo no âmbito dos seus objectivos estratégicos na região do Cáucaso, visando o enfraquecimento da Geórgia.
Após o reconhecimento de Nauru nas Nações Unidas, Moscovo doou 9 milhões de dólares para a reconstrução do porto daquela ilha.
Tbilisi não se ficou. Thomas de Waal relata que o Governo daquele país utilizou Tuvalu para contra atacar Moscovo. No passado dia 11 de Setembro foi noticiado que a Geórgia iria providenciar apoio financeiro à missão de Tuvalu nas Nações Unidas. Foi ainda revelado que Tbilisi tinha pago um carregamento de medicamentos com destino à população de Tuvalu no valor de 12 mil dólares.
Como resultado, aquele país do Pacífico foi um dos 50 países que apoiou uma resolução apresentada pela Geórgia na defesa do direito de retornos de todos os refugiados precisamente para a Abecásia e Ossétia do Sul. Nauru, por seu lado, foi naturalmente um dos 17 países que votou contra.
Washington também não está de fora desta estratégia. Por exemplo, numa resolução do ano passado que exortava à resolução pacífica do problema dos colonatos na Palestina, 164 países votaram favoravelmente. Os Estados Unidos votaram contra, integrando um grupo restrito de sete países, entre os quais se encontrava estranhamente (ou talvez não) o Nauru.