As razões de Netanyahu e Lieberman
Avigdor Lieberman e Benjamin Netanyahu/Foto: Olivier Fitoussi
Não é apenas a Faixa de Gaza e o sul de Israel que estão a viver momentos conturbados, com o ressurgimento da violência nos últimos dias, depois de uma “covert operation” israelita ter sido descoberta no passado Domingo na localidade de Khan Younis no sul daquele enclave palestiniano. Também o sistema político israelita já se está ressentir com as ondas de choque dos violentos acontecimentos no terreno. Normalmente, tem sido sempre assim ao longo dos anos. Desta vez, foi Avigdor Lieberman que não perdeu tempo e se demitiu do cargo de ministro da Defesa de Israel, por não concordar com o cessar-fogo acordado pelo chefe de Governo, Benjamin Netanyahu, e o Hamas. Lieberman, pertencente à direita judaica mais ortodoxa, teceu fortes críticas ao primeiro-ministro, acusando-o de não estar a ser suficientemente “agressivo” contra o Hamas, uma ideia partilhada pela ala mais radical na sociedade hebraica. Aquele político, critica a débil resposta israelita aos cerca de 500 rockets lançados pelo Hamas entre Segunda e Terça-feira e fala numa “cedência ao terror” por parte de Netanyahu.
No entanto, numa análise cínica, o falhanço da desastrosa operação secreta israelita e a consequente retaliação militar do Hamas pode ter servido os interesses políticos de Lieberman, líder do partido Yisrael Beiteinu, que aproveitou este momento para se demarcar das políticas de Netanyahu. Ao mesmo tempo, apresenta-se ao seu eleitorado como um autêntico “falcão” e alimenta a possibilidade de gerar uma crise no Executivo e, consequentemente, eleições antecipadas. É importante lembrar que, apesar de tudo, uma parte do eleitorado se identifica com o pensamento de Lieberman em matéria de segurança, nomeadamente, os milhares de judeus ortodoxos que vivem em colonatos na Cisjordânia.
Por outro lado, há que compreender a posição mais prudente de Netanyahu, ao não querer escalar o conflito. Embora Israel tenha capacidade militar para destruir o Hamas, uma operação que tivesse verdadeiramente esse objectivo teria implicações quase insuportáveis em termos de danos colaterais junto da população civil da Faixa de Gaza. Portanto, uma guerra aberta e contínua em toda a sua plenitude não interessa a Netanyahu, mas também seria muito prejudicial para o projecto de poder do Hamas. Porque, caso Israel decidisse atacar com tudo e em força a Faixa de Gaza, as já muito difíceis condições de vida naquele enclave iriam degradar-se ainda mais, com a população, muito provavelmente, a insurgir-se contra as autoridades, neste caso o Hamas, que, assegura a gestão de uma série de serviços à população, desde a segurança às escolas e serviços.
A Israel também não interessaria, pelo menos para já, destruir o Hamas e criar um vazio de poder na Faixa de Gaza, uma vez que a Autoridade Palestiniana, com a Fatah no Governo, não tem neste momento condições para assegurar o controlo daquele território. Além disso, e como notava Dennis Ross, antigo negociador norte-americano, a decapitação do Hamas na Faixa poderia criar espaço para o surgimento de movimentos ainda mais radicais, como a Jihad Islâmica ou até mesmo o Estado Islâmico. Ao Jerusalem Post, Ross não tem dúvidas que Israel poderia derrotar o Hamas, mas e depois? Para garantir que o enclave não seria tomado por radicais, Israel teria de manter uma presença na Faixa de Gaza e isso a História já demonstrou que foi contrário aos interesses do Estado hebraico.