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O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

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Conseguirá Cristina deixar o "Kirchnerismo" como legado?

Alexandre Guerra, 23.10.15

 

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Na Argentina está a chegar ao fim mais uma dinastia política. Depois do "Peronismo" nos anos 40/50 e 70, agora é a vez do "Kirchnerismo" começar a arrumar-se no arquivo da história política daquele país da América do Sul. No próximo Domingo, os argentinos vão às urnas para escolher um novo Presidente, que tomará posse a 10 de Dezembro, o dia em que formalmente Cristina Fernández de Kirchner terminará o seu segundo mandato. Aliás, foi precisamente nesse mesmo dia, mas do ano de 2007, que tomou posse pela primeira vez, após ter vencido as eleições à primeira volta com uma margem considerável. Kirchner tornava-se na primeira mulher a ser eleita para a presidência, mas desde 2003 que estava habituada aos corredores do poder, na qualidade de Primeira Dama do já falecido Presidente Néstor Kirchner, que ocupou a chefia do Estado entre 2003 e 2007.

 

Durante 12 anos os Kirchner dominaram a política da Argentina e a verdade é que, provavelmente, se Cristina Fernández pudesse constitucionalmente concorrer a um terceiro mandato, o mais certo seria vencer. Tal como aconteceu com o "Peronismo", personificado em Juán Perón e potenciado pela endeusada Evita, também Cristina Fernández quer deixar o seu legado político e do falecido marido. O "Kirchenismo" é já um conceito aceite pela imprensa e elites, mas talvez ainda seja cedo para se prognosticar a sua longevidade e influência no futuro político da Argentina.

 

Cristina Fernández impõe o ritmo no tango com a Espanha

Alexandre Guerra, 17.04.12

 

Foto AP 

 

Tivesse sido em Cuba, na Venezuela, na Bolívia ou até mesmo no Brasil, e até se compreenderia sob a perspectiva ideológica uma decisão como aquela que a Presidente da Argentina, Cristina Fernández de Kirchner tomou, ao anunciar a nacionalização da subsidiária da Repsol naquele país.

 

É inegável que a nacionalização da YPF, detida maioritariamente pela Repsol, é uma iniciativa inaceitável vinda de um Estado de Direito e defensor de uma economia de mercado, mas não será totalmente uma surpresa à luz de alguns actos de Kirchner nos últimos anos.

 

Ideologicamente, a decisão de Kirchner explica-se por um populismo primário que vai de encontro às pretensões da uma larga maioria da opinião pública argentina, que ainda não esqueceu o descalabro da economia nos anos de 2001-02, e que muitos consideram ter sido causado pelas privatizações e políticas liberais dos anos 90.

 

Além disso, Kirchner já tinha dado sinais dos seus ímpetos mais estatistas, quando em 2008 nacionalizou o fundo privado de pensões ou renacionalizou a companhia aérea de bandeira.

 

Independentemente da argumentação técnica dada por Kirchner para a nacionalização da YPF, neste caso totalmente irrelevante, a verdade é que se tratou de uma decisão política. Arrojada, arriscada e, eventualmente, violadora de cláusulas contratuais internacionais. A juntar-se a isto, existe o facto de Buenos Aires ter dito que estaria disposto a pagar um preço de expropriação muito abaixo do real valor da YPF.  

 

O director executivo da Repsol, Antonio Brufau, já veio dizer que os actos do Governo argentino não vão ficar impunes, ameaçando recorrer às instâncias internacionais, nomeadamente ao Banco Mundial. Também o Governo de Madrid parece estar firme nesta questão, ao apoiar a posição da Repsol. 

 

Uma coisa é certa, a decisão política de Kirchner vai ter implicações muito negativas nas relações entre a Espanha e a Argentina e, muito provavelmente, marcará um distanciamento diplomático e económico entre aqueles dois países, dificilmente reparável num futuro próximo.