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O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

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No Mar Oriental da China todos esticam a corda... até ao dia em que partir

Alexandre Guerra, 28.11.13

 

 

Assim, de repente, Pequim anunciou, no passado Sábado, a criação de uma Zona de Identificação de Defesa Aérea (ADIZ) no espaço aéreo em redor das disputadas e polémicas ilhas Senkaku (ou Diayou para os chineses) no Mar Oriental da China. Relembre-se que apesar daquelas ilhas serem actualmente propriedade do Governo nipónico, há muito que a China reivindica para si a sua posse.

 

É por isso que esta recente medida de Pequim não pode deixar de ser vista como mais uma provocação, sobretudo porque implica que todos os países circundantes informem previamente as autoridades chinesas dos planos de voos que por ali passem. Caso contrário, sujeitam-se a "medidas de defesa de emergência", seja lá o que isso for.

 

Como seria de esperar, o Japão e a Coreia do Sul já desafiaram a imposição de Pequim, com o envio de voos para a ADIZ, anunciando, em jeito de provocação, que não houve qualquer "resposta" chinesa. 

 

Também Washington veio dizer que esta medida é mais uma tentativa da China para desestabilizar o "status quo" daquela região e, por isso, enviou dois bombardeiros B-52 na passada Terça-feira para sobrevooar a ADIZ. Mais uma vez, numa lógica de "esticar a corda" para ver até onde vai o "bluff" de Pequim.

 

Até ao momento, ainda nada de grave aconteceu, no entanto, é notório que todas as partes envolvidas estão empenhadas em escalar a tensão, até porque, em última instância, há um confronto de poder entre a China e os Estados Unidos. E neste momento, no complexo tabuleiro geopolítico e geoestratégico das relações internacionais, tanto Pequim como Washington jogam interesses bem maiores do que a propriedade de cinco ilhéus desabitados e três massas rochosas.

 

Na linha de fronteira das coreias responde-se com tiros às "provocações" do inimigo

Alexandre Guerra, 10.02.13

 

Soldados sul-coreanos ao longo da Zona Desmilitarizada em Yeoncheon/Foto:Reuters/Kim Hong-Ji 

 

Por mais paradoxal que parece, a área em redor da Zona Desmilitarizada (DMZ) que acompanha o paralelo 38 que separa as duas coreias, é a região mais militarizada do mundo. Em ambos os lados da fronteira, ao longo dos 250 quilómetros daquela "zona tampão" com quatro quilómetros de largura, tanto Pyongyang como Seul têm mobilizado um forte contingente militar permanente, reforçado com torres de vigia e outros meios. Seul conta ainda com o apoio de soldados americanos. 

 

Por aqueles lados o clima de tensão está sempre presente, com os soldados a vigiarem-se constantemente e preparados para reagir a qualquer provocação do inimigo: "Nós responderemos imediatamente a qualquer provocação do inimigo", informou há uns dias à Reuters, o capitão Kim Sang-min, o comandante da unidade sul-coreana "Invincible Typhoon", estacionada apenas a 800 metros da linha divisória. 

 

A visita (ou a não visita) de Abe a Yasukuni ditará o rumo da política externa japonesa

Alexandre Guerra, 26.12.12

 

Shinzo Abe, ainda enquanto líder da oposição, visita o santuário de Yasakuni em Outubro/Kimimasa Mayama/European Pressphoto Agency

 

De regresso aos desígnios nipónicos, Shinzo Abe volta a colocar o conservador Partido Liberal Democrático (LDP) no poder e a recuperar uma abordagem diplomática mais agressiva em relação aos seus vizinhos, nomeadamente a China. Dando a vitória a Abe nas eleições legislativas do passado dia 16, os japoneses quiseram alterar o perfil da política externa nipónica face a Pequim, numa altura em que a tensão é crescente entre os dois países, por causa das disputadas ilhas de Senkaku.

 

Os japoneses, ou pelo menos a maioria do eleitorado, não gostaram da forma como os anteriores governos do Partido Democrata (DPJ) geriram os "temas quentes" relacionados com a China ou com a Coreia do Sul (esta a propósito dos ilhéus de Takeshima).  

 

Uma japonesa dizia ao jornal The Asahi Shimbun que tinha votado no LDP porque acreditava que a China acabaria por invadir o Japão se nada fosse feito.

 

Percebendo aquilo que a maioria do eleitorado queria, Abe fez uma campanha agressiva, deixando bem claro que não iria ceder à China ou à Coreia do Sul no que dissesse respeito a interesses nacionais. No entanto, e como sucedeu quando esteve no Governo da primeira vez, em 2006, é muito possível que Abe refreie agora os ânimos. 

 

Com a chefia do Governo ganha, Shinzo Abe deverá agora preocupar-se mais em manter as boas relações com a Coreia do Sul e evitar uma escalada diplomática com a China em redor das ilhas Senkaku.

 

Um bom exemplo desse refreamento poderá materializar-se no recuo das suas intenções de visitar o polémico santuário de Yasukuni, que presta homenagem aos soldados japoneses mortos na II GM, incluindo alguns criminosos de guerra. Durante a campanha Abe dissera que pretendia visitar aquele santuário quando fosse eleito, mas agora, segundo o The Asahi Shimbun, Abe tem-se mostrado vago sobre este assunto, sabendo que tal gesto provocaria o descontentamento não apenas de Pequim, mas também de Seul.


A visita ou a não visita ao santuário de Yasukuni será um bom barómetro para se perceber a orientação que Shinzo Abe vai dar à diplomacia nipónica. Para já, sabe-se apenas aquilo que disse na primeira conferência de imprensa que deu depois de ter sido empossado: "We need to bring back the kind of diplomacy that protects national interests and asserts its positions."


O Irão e as sanções do Ocidente (3)

Alexandre Guerra, 04.09.12

 

Anúncio da Kia em Teerão

 

Já aqui se tinham escrito dois textos sobre a problemática das sanções impostas ao Irão pelos Estados Unidos e pela União Europeia, dedicando-se agora estas últimas linhas a uma perspectiva muito concreta e que poderá ajudar a compreender melhor alguma inconsistência e timidez na forma como a administração americana tem gerido esta política.

 

Como também já tinha aqui sido citada, Erin Burnett, jornalista da CNN, escreveu recentemente na Fortune que Washington é “duro” com Teerão, mas só às vezes. E dá uma explicação.

 

Acima de tudo é importante ter em consideração que uma política de sanções mais agressiva por parte de Washington iria afectar negativamente as exportações de crude iraniano, nomeadamente para a China. Noutras circunstâncias poderia ser uma “arma” muito útil para Washington, ao impossibilitar o Irão de escoar o seu recurso mais valioso.

 

Mas o problema começa aqui, já que a China é o principal importador do crude iraniano e qualquer medida mais radical dos Estados Unidos que pusesse em causa aquela relação comercial seria certamente do desagrado de Pequim, que, por acaso, é detentor de 1,17 biliões (trillion) de dólares da dívida americana.

 

Daí o autor destas linhas ter escrito no texto anterior que “para se perceber, em parte, esta realidade [das sanções] é preciso compreender o paradigma do actual sistema internacional, dominado por uma interdependência complexa muito acentuada, na qual os Estados Unidos estão totalmente emaranhados, tal e qual uma mosca numa teia de aranha”.

 

E nesta teia de interesses também a Coreia do Sul e o Japão são grandes importadores do crude iraniano. Por isso, qualquer embargo total imposto ao Irão iria reflectir-se dramaticamente naquelas economias asiáticas e iria provocar alguma crispação com Washington, algo que não será certamente do interesse da administração americana. Seul tem todo o interesse em manter boas relações com Teerão, tendo em conta a penetração naquele mercado de marcas sul coreanas como a Samsung, a Hyundai ou a Kia. Fontes da Samsung revelaram a Erin Burnett que a presença no mercado iraniano é bastante significativa.

 

Uma realidade que tem provocado alguma frustração nos círculos políticos em Washington, como o próprio David Cohen, o subsecretário do Tesouro para o terrorismo e “intelligence” financeira, acabou por reconhecer, ao ver companhias americanas como a Apple, a GM, a Dell ou a Ford impedidas de operar no Irão, enquanto as rivais sul-coreanas das indústrias automóvel e tecnológica estão bem presentes no mercado iraniano.

 

Texto publicado originalmente no Forte Apache.


O "jogo" de palavras já começou

Alexandre Guerra, 22.07.10

 

No seguimento do post anterior, relativo aos "jogos de guerra" que os Estados Unidos e a Coreia do Sul vão realizar a partir do próximo Domingo no Mar do Japão, Pyongyang, tal como se esperava, já veio dizer hoje que aquela iniciativa representa uma ameaça à segurança da região.

 

As manobras militares ainda não começaram, mas o "jogo" de palavras já, com a tensão entre as partes a agudizar-se.

 

Jogos de guerra ao largo da Península da Coreia vão deixar o mundo em suspenso

Alexandre Guerra, 20.07.10

 

Os preparativos para a recepção de Biden e Clinton em Seul/Foto:Truth Leem,Reuters

 

Quando no próximo dia 25 de Julho forem mobilizados para o Mar do Japão 20 navios de guerra e submarinos, 200 aviões militares e 8 mil soldados, o mundo viverá, certamente, um dos dias mais tensos do ano, ou não fosse este um exercício militar conjunto entre os Estados Unidos e a Coreia do Sul com o objectivo de enviar uma mensagem forte e clara ao regime de Pyongyang.

 

Durante quatro dias, forças daqueles dois países aliados estarão envolvidas em manobras de dissuasão contra a Coreia do Norte e que pretendem ser uma resposta directa ao afundamento da embarcação militar sul coreana, Cheonan, alegadamente atingida no dia 26 de Março por um torpedo norte-coreano e que vitimou 46 marinheiros.

 

Esta versão dos acontecimento foi corroborada por um relatório realizado por uma equipa de peritos internacionais, apesar de Pyongyang o ter considerado uma afronta, rejeitando as acusações de que é alvo. Também as Nações Unidas condenaram o incidente, mas não se pronunciaram quanto à identificação do responsável.

 

Seja como for, Washington está convicto da culpabilidade da Coreia do Norte no afundamento do Cheonan, tendo deste então manifestado total apoio a Seul. De tal forma, que se encontram no país o vice-Presidente americano, Joe Biden, e a Secretária de Estado, Hillary Clinton, que esta Quarta-feira vão visitar a Zona Desmilitarizada (DMZ) que separa as duas Coreias desde o fim da Guerra de 1950-53.

 

Como se já não bastasse ser uma região historicamente tensa e bastante militarizada, porque além dos vectores de lançamento da Coreia do Norte esta tem igualmente um Exército gigantescto (embora pouco equipado e motivado), a partir do próximo dia 25 vão juntar-se ao largo da Península da Coreia, entre outras embarcações, o porta-aviões nuclear americano George Washington, assim como mais três contratorpedeiros.

 

Apesar de ser um exercício militar, as manobras no Mar do Japão durante quatro dias deixarão o mundo em suspenso, numa altura em que as relações entre as duas coreias atravessam um dos piores momentos dos últimos anos.

 

Qualquer incidente ou acto mais provocatório poderá desencadear uma reacção de consequências imprevisíveis. Num comunicado conjunto, Seul e Washington foram peremptórios ao afirmar que este exercício foi concebido para “enviar uma mensagem clara à Coreia do Norte de que o seu comportamento agressivo tem que parar”.

 

Ora, o regime de Pyongyang tem tido ao longo dos últimos anos vários actos provocatórios, nomeadamente ao nível de testes com mísseis, no entanto, tem conseguido gerir as vozes críticas da comunidade internacional, evitando sofrer consequências militares. Mas, depois do afundamento do Cheonan, a paciência de Seul e de Washington parece estar a esgotar-se, sendo quase certo que perante um incidente daquela natureza durante o exercício militar, Pyongyang arriscar-se-á a sofrer uma retaliação militar.

 

As relações entre as duas Coreias voltam ao "congelador"

Alexandre Guerra, 25.05.10

 

Soldados sul coreanos prestam homenagem aos marinheiros mortos no navio Cheonan/Ahn Young-joon/Associated Press

 

Se a Índia e o Paquistão parecem estar a caminhar para uma reaproximação negocial, o mesmo não se pode dizer das relações entre a Coreia do Norte e a Coreia do Sul, que atingiram hoje um dos momentos mais tensos dos últimos anos.

 

Esta mais recente crise foi espoletada há uns dias com a publicação de um relatório internacional, que implicou directamente Pyongyang no afundamento de um navio de guerra sul coreano no passado dia 26 de Março, e no qual morreram 46 marinheiros. De acordo com as investigações, o acidente deveu-se a um torpedo norte coreano.

 

Como seria de esperar, Pyongyang rejeitou de imediato as conclusões deste relatório, e classificou-o como uma afronta à Coreia do Norte. Além disso, o regime norte coreano acusa a Marinha da Coreia do Sul de ter violado recentemente as águas territoriais do seu país.

 

A península da Coreia é o melhor exemplo daquilo é conhecido como um “conflito congelado”, herdado do sistema da Guerra Fria e que subsiste pelo facto das duas Coreias continuarem tecnicamente em guerra, visto nunca terem assinado qualquer armistício em 1953, após um conflito de três anos.

 

Deste então, que os dois países mantêm um “status quo” tenso, materializado no Paralelo 38, uma Zona Desmilitarizada que serve de tampão aos dois países e que concentra um elevado número de soldados em ambos os lados da fronteira. De referir que esta deverá ser a zona mais minada do planeta.

 

As esperanças vividas há uns anos de reaproximação entre as duas Coreias começaram a deteriorar-se com o “dossier” nuclear norte-coreano, continuando sem fim à vista. No entanto, nos últimos dias Pyongyang e Seul envolveram-se numa escalada diplomática acentuada, culminando hoje com a agência de notícias norte coreana KCNA a anunciar que aquele país cortava todas as relações com a Coreia do Sul, incluindo as comunicações. Pyongyang expulsou ainda responsáveis oficias da Coreia do Sul de um projecto conjunto e interditou todo o seu espaço marítimo e aéreo.

 

Horas antes tinha sido Seul a reclassificar a Coreia do Norte como o seu “arqui-inimigo” (uma designação que tinha caído em 2004 durante o período de “detente”), depois de no Domingo ter cortado relações comerciais com o vizinho do Norte.

 

Como referiu Jonathan Marcus, correspondente diplomático da BBC News, as relações entre as duas Coreias voltaram ao “congelador”. Efectivamente, depois dos tempos de esperança da “Sunshine Policy”, a tensão e a desconfiança regressaram à Península da Coreia, sendo o programa nuclear norte-coreano a principal fonte.

 

Numa altura em que a situação poderá ficar fora de controlo, certamente que Pyongyang e Seul já foram avisados por Pequim e Washington para refrearem os ânimos.

 

A Secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, tem-se multiplicado em contactos e iniciativas diplomáticas, no sentido de garantir que Washington controla todo o processo em Seul. Pretende também transmitir uma mensagem de apoio incondicional à Coreia do Sul, tendo sido anunciados exercícios conjuntos entre os dois países.

 

Por outro lado, a China já apelou a todas as partes para terem calma e, através do seu vice-ministro dos Negócios Estrangeiros, Cui Tiankai, mostrou total disponibilidade para trabalhar com os Estados Unidos na resolução deste problema.

 

Esta é a abordagem que mais interessa a Pequim, visto querer evitar que o assunto vá ao Conselho de Segurança, vendo-se aí obrigada a tomar uma posição, algo que neste momento não deseja.

 

É por isso que analistas citados pela BBC News referem que a China é crucial neste problema, porque se o assunto for discutido no Conselho de Segurança das Nações Unidas o seu voto será preponderante.  

 

Para já, Pequim mostra prudência, deixando Washington assumir o seu papel de “aliado” tradicional junto da Coreia do Sul. Uma abordagem realista e inteligente, já que tanto Seul como Pyongyang, e apesar de toda a retórica e medidas anunciadas, têm mostrado bastante relutância em avançar para qualquer movimentação militar.

 

Enquanto isso não acontecer, Pequim limita-se a acompanhar, prudentemente, esta situação, evitando interferir ao máximo. A China sabe perfeitamente que, em caso de conflito, terá sempre de recorrer ao seu Exército para equilibrar o potencial militar da Coreia do Norte face à Coreia do Sul.

 

Sabe-se que o Presidente norte-coreano, Kim Jong Il, terá dito aos seus oficiais para estarem preparados, mas é referido igualmente que não será a Coreia do Norte a dar o primeiro tiro. Embora tenha uma das maiores infantarias do mundo, as forças militares norte-coreanos estão mal preparadas, pobremente equipadas e com o moral em baixo. Dizem alguns desertores norte-coreanos que os soldados daquele país optam por tirara sestas em vez de treinarem, porque têm tão poucos alimentos para comer, que preferem poupar energia.

 

Verdade ou mentira, certo é que a Coreia do Norte está longe ter as condições para confrontar militarmente o seu vizinho do Sul. Mesmo em relação à sua capacidade nuclear, para já é apenas uma intenção, não tendo ogivas disponíveis e vectores de lançamento ainda pouco fiáveis.