José Pacheco Pereira referiu esta Quinta-feira à noite na Quadratura do Círculo que mesmo que fosse convidado nunca participaria num encontro de bloggers com o primeiro-ministro, José Sócrates. Das suas palavras, depreende-se que quem tenha aceite tal convite estava de certa forma a alinhar num registo conivente com o poder e a perder a sua independência intelectual e crítica face à governação.
Pacheco Pereira viu ainda naquele encontro um momento encenado, fruto do deslumbre que Sócrates tem pelas novas tecnologias e da “obamania” aguda que lhe perpassa a alma.
Ou seja, na perspectiva do autor do Abrupto, os bloggers presentes não foram mais do que meros figurantes de um filme orientado por Sócrates, cujo argumento foi também de sua autoria. E para Pacheco Pereira esta situação fere de morte o conceito original da blogosfera, que se quer irrelevante, independente e crítica.
Ora, aqui surge o primeiro erro de Pacheco Pereira, já que a grande virtude da blogosfera é precisamente a liberdade que cada blogger tem para ser ou fazer o que bem entender (com respeito pelo próximo, claro está). Assim, a riqueza da blogosfera tanto reside naqueles que são alinhados como naqueles que são desalinhados com Sócrates.
Por isso, no contexto específico, o comentário de Pacheco Pereira poderá ser injusto para alguns dos bloggers presentes, que diariamente (e longe de terem o potencial comunicativo e a “antena” de Pacheco) vão tentando denunciar e desmontar aquilo que na sua óptica vai correndo mal nesta governação.
É muito possível que alguns bloggers tenham visto neste encontro uma possibilidade única de comunicar e de confrontar directamente o primeiro-ministro com algumas questões, que de outro modo nunca poderiam ver respondidas.
Além disso, os bloggers ao aproveitarem a possibilidade de se sentarem junto do “inimigo” poderão estar a reflectir uma estratégia inteligente, de modo a enriquecerem o seu conhecimento em relação a Sócrates.
Sobre este assunto poderá ser útil recuperar o pensamento de um dos heróis do conservadorismo político, que jamais cedeu nos seus princípios, apesar de se ter sentado literalmente com alguns dos seus rivais, em que dizia que o importante era manter os inimigos bem perto de si para perceber a forma como se moviam, como pensavam ou como actuavam.
Perante isto, pode-se afirmar que a independência intelectual não se perde tal e qual uma “contaminação viral” se tratasse. Da mesma maneira que os valores éticos e morais não se abalam com o factor de proximidade.
Ora, estas considerações acima enunciadas não foram tidas em conta por Pacheco Pereiro aquando do seu comentário sobre o encontro dos bloggers com Sócrates.
Pacheco Pereira até poderia estar coberto de razão ao referir que todos os bloggers presentes estão alinhados com o primeiro-ministro (o que não é verdade), mas deveria ter contemplado um princípio fundamental na sua análise: a blogosfera tem de tudo e é por isso perfeitamente aceitável que um qualquer encontro de bloggers reúna as mais variadas tendências.
Aliás, a história da comunicação política dos últimos anos tem dado alguns exemplos deste tipo de momentos “encenados”, muitos dos quais vindos dos Estados Unidos, nos quais alguns políticos foram confrontados com questões muito sensíveis e, por vezes, incómodas colocadas por uma audiência supostamente “coreografada” e “alinhada”.