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O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

Apontamentos históricos

Alexandre Guerra, 16.10.16

 

"A história da Ilíada de Homero trata de individualistas arruaceiros quase exclusivamente envolvidos no combate corpo a corpo, tanto por prestígio como por vantagem militar. Mas o poeta descreveu-os e os seus feitos de uma forma tão convincente que não só convenceu os gregos como deveriam agir quando lutavam uns contra os outros, como as suas palavras também transcenderam o espaço e o tempo para cimentar a instituição da guerra no Ocidente. Acima de tudo, os combatentes eram agressivos, coincidindo as armas simetricamente, primeiro atirando lanças à vez, depois aproximando-se para perfurar com outra lança, depois ainda mais perto para acabar com tudo com as suas espadas -- aquele «que luta em confronto directo» era um frequente e positivo epíteto homérico. Os mais notáveis heróis -- Aquiles, Heitor, Diomedes e Ájax -- estão entre os maiores, os mais ruidosos em gritos de guerra, mais velozes e inevitavelmente blindados heróis de sempre, características estas que seriam profundamente admiradas e influentes no decurso do combate armado ocidental."

 

Robert L. O'Connel in Aníbal, Cartago e o Pesadelo da República Romana (Bertrand, 2012)

 

Apontamentos históricos

Alexandre Guerra, 01.10.16

 

"A 2 de Agosto de 216 a.C, um terrível e apocalíptico dia no Sul de Itália, 120 000 homens envolvidos no que acabou por ser uma enorme luta de espadas. No fim da contenda, pelo menos 48 000 romanos estavam mortos ou moribundos [...] Assim foi Canas, um evento celebrado e estudado enquanto paradigma de Aníbal para futuros praticantes das artes militares, a apoteose da vitória decisiva, Roma, por outro lado, perdeu, sofrendo nesse dia mais baixas que os EUA durante toda a guerra no Vietname. [...] Canas culminava uma série de derrotas engendradas pelo próprio Aníbal, personificação do castigo merecido infligido a Roma, que atacaria a Itália por mais 13 anos. [...] Batalha de Canas foi um ponto crucial na história de Roma [...] Os acontecimentos desse mês de Agosto ou começaram ou aceleraram a tendência de empurrar Roma da municipalidade para o império, da oligarquia republicana para a autocracia, da milícia para o Exército profissional, de um reino de donos de terras para um reino de escravos e propriedades. E o talismã de todas estas mudanças foi um sobrevivente sortudo, um jovem tribuno militar chamado Públio Cornélio Cipião, conhecido na história com a alcunha de Africano, visto que ao fim de muitos anos de guerra, Roma ainda precisaria de um general e de um exército suficientemente bons para derrotar Aníbal, e Cipião Africano, com a ajuda do que restava dos refugiados desonrados no campo de batalha, atenderia à chamada e poria tudo em marcha."

 

Robert L. O'Connel in Aníbal, Cartago e o Pesadelo da República Romana (Bertrand, 2012)

 

Apontamentos históricos

Alexandre Guerra, 25.09.16

 

"Não importava quão más as coisas se tornavam, pois Roma conseguira sempre responder, conseguira sempre sair das cinzas da história e continuar em frente. E era mais na derrota do que na vitória que Políbio [historiador] via a essência da grandeza de Roma."

 

Robert L. O'Connel in Aníbal, Cartago e o Pesadelo da República Romana (Bertrand, 2012)

 

Apontamentos históricos

Alexandre Guerra, 20.09.16

 

Um bom princípio que muitos líderes políticos parecem esquecer...

 

"Um príncipe prudente deve [...] eleger no seu Estado homens sábios e só a eles conceder livre arbítrio para lhe dizerem a verdade, e apenas acerca daquelas coisas que lhes pergunte e não acerca doutras; mas deve interrogá-los acerca de tudo e, depois de lhes ouvir a opinião, deliberar por si, a seu modo; e deve nos conselhos, portar-se de tal modo com cada um deles, que cada um saiba que quanto mais livremente se lhe fale, tanto mais o que assim proceder lhe será aceite: fora dos conselhos não deve querer ouvir ninguém, não deve afrouxar nas decisões tomadas, e deve obstinar-se nas suas resoluções. Quem proceder de outro modo, ou é precipitado pelos aduladores, ou muda amiúde pela variedade dos pareceres."

 

Nicolau Maquiavel in O Príncipe 

 

Apontamentos históricos

Alexandre Guerra, 29.08.16

 

"Aos 73 anos, Winston Churchill escreveu um curto e curioso ensaio que não tencionava ver publicado, pelo menos antes da sua morte. Narra uma experiência arrepiante que teve no inverno de 1947. Para trás ficaram os dias gloriosos da guerra e do seu mandato de primeiro-ministro, e Churchill encontra-se no escritório da sua casa de campo de Chartwell. 

Prepara-se para pintar quando experimenta uma sensação estranha. Vira-se para trás e vê o pai sentado no cadeirão de braços. Randolph pestaneja e vai manuseando a cigarreira cor de âmbar, exatamente como Winston se lembrava de o ver fazer nos raros momentos de carinho e simpatia para com o seu filho. 

Tem uma conversa pungente. A ideia geral é que, decorridos 52 anos sobre a sua morte, em isolamento político e desespero sifilítico, Randolph desconhece o que aconteceu no mundo. E Churchill informa-o. 

Conta-lhe que está no trono o rei Jorge VI, que ainda se corre o Derby, e que o Turf Club está «OK» e que «OK» é uma nova expressão americana. Conta a Randolph como foi que o antigo líder conservador Arthur Balfour caiu em desgraça, um apontamento agradável, já que nenhum dos dois tinha paciência para a presunção do velho Balfour. Relata a expansão do socialismo. Explica que houve duas guerras mundiais, em cada uma das quais morreram cerca de 30 milhões de pessoas, e que os russos têm uma nova espécie de czar, mais desumano e sanguinário do que qualquer antecessor. 

A habilidade do texto consiste em que Randolph nunca chega a perceber quais foram as realizações do filho. O pai conclui que o filho é agora um pintor amador de talento mediano, que, segundo parece, vive numa casinha de campo e que nunca foi além da patente militar de major.

No fim da sombria exposição de Churchill sobre o estado do mundo moderno, Randolph mostra-se vagamente impressionado com os conhecimentos do filho sobre os assuntos correntes. E comenta com chocante ironia que «é claro que hoje estás velho de mais para pensar nessas coisas, mas quando te ouço falar pergunto-me por que razão nunca te meteste na política. Podias ter tado um bom contributo. Até podias ter feito nome».

Dito isto, Randolph sorri, acende um fósforo, e a aparição desvanece-se no fulgor da chama. Muitos historiadores consideram que esta cena -- a que a famíllia de Churchill chamou «O sonho» -- é extrema e intencionalmente reveladora da constituição psicológica de Churchill. E é-o seguramente. 

É uma cena elegíaca, desesperada. Em certo sentido, é um grande e entristecido suspiro de saudade de um homem que sempre desejou impressionar o pai sem nunca o ter conseguido. Como o próprio Winston Churchill costumada contar aos filhos, não tiveram mais do que cinco conversas com o pai -- nem sequer mera troca de palavras, fosse qual fosse a duração. E sempre tivera a sensação de não estar à altura das expectativas."

 

Boris Johnson in O Fator Churchill (D.Quixote, 2015)

 

Apontamentos históricos

Alexandre Guerra, 08.08.16

 

"On the eve of the [Amerina] Civil War, returns to capital on southern plantations were greater than in northern factories. American slavery was growing rapidly, and it was the only large system of forced labor in modern history that expanded at a high rate by natural increase. By 1860, four million human chattels were the personal property of four hundred thousand masters and mistresses in the southern states. Many of the master class, and others who hoped to join them, were ready to fight and die for this 'peculiar institution', wich they defended in the name of southern honor, states'rights, and liberty to keep a slave. 

 

At the same time,  that slavery was flourishing in the southern states, Americans in the northern states created the world's largest and most dynamic antislavery movement. In 1860, nearly two million people in the northern and western states voted for candidates who condemned slavery and demanded an immediate end to its expansion. Many were deeply offended by the moral wrong of slavery. Some were ready to lay down their lives in the cause of abolation.

 

In 1861, these two great American forces, slavery and antislavery, met in a violent collision that shook the republic to its foundation. The result was the bloodiest war in American history, and someting else that Abraham Lincoln called a new birth of freedom."

 

David Hackett Fischer in Liberty and Freedom - A Visual History of America's Founding Ideas (Oxford University Press, 2015)

 

Apontamentos históricos

Alexandre Guerra, 03.08.16

 

"Hoje, temos mais ou menos certo que a Segunda Guerra Mundial foi ganha com sangue russo e dinheiro americano; e embora isso seja verdade até certo ponto, também é verdade que, sem Churchill, Hitler teria certamente vencido. 

O que quero dizer é que os ganhos nazis na Europa podiam muito bem ter sido irreversíveis. Queixamo-nos hoje, com razão, das deficiências da União Europeia, mas esquecemos o horror absoluto desse tão possível mundo, entre os mundos possíveis."

 

Boris Johnson in O Fator Churchill (D.Quixote, 2015)

 

Apontamentos históricos

Alexandre Guerra, 08.06.16

 

"Last year's assassination of the opposition politician Boris Nemtsov, however, clearly beyond Putin's limits. Could Putin have said something about Nemtsov that someone could have taken as a go-ahead to kill him? That seems impossible to me. I have never heard anything like that from Putin, even with regard to people he hates. Putin sometimes mocked Nemtsov a bit, but he tolerated him. After the assassination, Putin disappeared for a few days -- apparently, what had happened was to unexpected."

 

Excerto do artigo "Russian Politics Under Putin" de Gleb Pavlovksy/Foregin Affairs (Maio/Junho de 2016).

 

Apontamentos históricos

Alexandre Guerra, 16.05.16

 

"Para bin Laden a traição do povo saudita começou 24 anos antes do seu nascimento, em 1932, quando Abdul Aziz al-Saud proclamou o seu reino. 'O regime [saudita] começou sob a bandeira da aplicação da lei islâmica e sob este lema todo o povo da Arábia Saudita foi ajudar a família Saud a tomar o poder. Mas Abdul Aziz não aplicou a lei islâmica. O país foi organizado para a sua família. Depois da descoberta do petróleo, o regime saudita encontrou um novo apoio: o dinheiro para tornar as pessoas ricas e lhes proporcionar os serviços e a vida que desejavam e as tornar satisfeitas.'" 

 

Citação de Osama bin Laden de uma das três entrevistas que deu ao correspondente de guerra, Robert Fisk, in A Grande Guerra pela Civilização - A conquista do Médio Oriente (Edições 70)