Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

O Médio Oriente cada vez mais "entretido" com os seus assuntos

Alexandre Guerra, 18.08.13

 

Consequências do atentado de Sexta-feira em Beirute/Foto AP

 

Com os olhos todos postos no Egipto, passou quase despercebido o ataque bombista de Sexta-feira a sul de Beirute, em pleno bastião xiita do Hezbollah. Morreram 27 pessoas, naquele que foi um dos ataques mais mortíferos desde o início da guerra civil de 1975-1990.

 

Embora o atentado ainda não tenha sido reivindicado, tudo aponta para grupos extremistas sunitas, que vingam a intervenção do Hezbollah na Síria contra os rebeldes sunitas. Adensa-se e alastra-se a toda a região do Médio Oriente o conflito crónico entre sunitas e xiitas.

 

Do desgoverno egípcio à matança síria, passando pelo cocktail explosivo libanês, estando ainda pelo meio o micro e interminável conflito israelo-palestiniano, já há muitos anos que o Médio Oriente não estava tão "entretido" com os seus assuntos.

 

O problema é que desta vez, e ao contrário do que acontecia nos saudosos tempos da Guerra Fria, nenhuma potência externa parece ter mão no que para ali vai.

 

Consequente

Alexandre Guerra, 30.11.12

 

Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Palestiniana a discursar esta Quinta-feira na Assembleia Geral da ONU/Foto: Andrew Gombert-EPA

 

Desde os Acordos de Oslo (Setembro de 1993) que os líderes palestinianos não protagonizavam um acto diplomático tão significativo como aquele que ontem foi celebrado na Assembleia Geral das Nações Unidas. Mas ao contrário de Oslo, que o tempo e as circunstâncias remeteram para a irrelevância, a Resolução aprovada por 138 nações vai ser consequente para os desígnios da Autoridade Palestiniana.

 

A relatividade das palavras no Médio Oriente

Alexandre Guerra, 27.11.12

 

Em Israel o impacto das palavras esbate-se com a dureza da realidade, e aquilo que poderia ser visto como um autêntico disparate em qualquer outra parte do mundo, é interpretado em terras judaicas como mais uma opinião (válida) no meio de tantas outras no que diz respeito ao relacionamento do Estado hebraico com os seus vizinhos inimigos.

 

É por isso que quando Robert Eisenman, conhecido escritor, investigador de assuntos bíblicos e professor de religião, defende no Jerusalem Post a reocupação do Sinai (Egipto) por parte de Israel, não se ouvem vozes de protesto ou de espanto.

 

Eisenman, que não é propriamente um desconhecido, defende na prática a invasão de um Estado soberano, mas nem por isso motiva qualquer reacção inflamada, seja de quem for.

 

As palavras daquele judeu americano são vistas como “normais” no contexto anormal do Médio Oriente. São apenas mais uma perspectiva. Aliás, há algumas bem mais radicais. Há judeus ortodoxos que defendem a expansão dos colonatos e a ocupação de todo o território da Cisjordânia.

 

Mas também do lado palestiniano há quem deseje convictamente que os judeus sejam todos “empurrados” para o Mar Mediterrâneo.

 

E o mais extraordinário é que todas estas opiniões são expressas de forma mais ou menos livre por aqueles lados do globo, seja em jornais, rádios, televisões ou na rua, sem que haja qualquer estranheza ou repulsa, mesmo por parte dos mais moderados ou de entidades com responsabilidades na sociedade.

 

A asfixiante "tunnel economy" entre a Faixa de Gaza e o Egipto*

Alexandre Guerra, 04.11.12

 

Um jovem palestiniano descansa dos trabalhos de escavação de mais um túnel/Foto: Eyad Baba/AP

 

Um das questões que se pode colocar perante a existência de “novos milionários” na Faixa de Gaza – actualmente, segundo se sabe, entre 100 a 200, e capazes de fazer dois milhões de dólares de dois em dois meses, como foi referido no segundo de três textos sobre a realidade do enclave palestiniano –, é saber como é possível que isso acontece num território literalmente isolado pelas forças de segurança israelitas (IDF)?

 

A mesma pergunta se pode fazer sobre o facto da economia em Gaza, embora débil, permanecer minimamente activa, quando as IDF apenas permitem a entrada de alguns bens de consumo, estando impedida, por exemplo, a importação de materiais para indústria pesada.  

 

Ou visto que a circulação de pessoas está muito limitada entre a Faixa de Gaza e o exterior, como é que os palestinianos naquele enclave conseguem ir ao Egipto para consultas médicas ou para outro tipo de serviço?

 

Trabalhador a retirar terra durante a escavação de um túnel algures entre a Faixa de Gaza e o Egipto/Foto AP

 

Um das centenas de túneis que saem de Rafah em direcção ao Egipto/Foto Time - Richard Moesse

 

A maior parte destas questões encontra resposta nas centenas de túneis construídos ilegalmente entre a Faixa de Gaza e o Egipto. Embora não haja dados exactos sobre esta “tunnel economy” (como lhe chama as Nações Unidas), estima-se que esta realidade tenha um impacto considerável na economia e na vida dos palestinianos da Faixa de Gaza. E traz sobretudo benefícios “de facto” às autoridades de Gaza e a uma certa elite próxima do Hamas. Quem o diz é a próprio International Labour Organization (ILO).

 

De acordo com um relatório deste ano da ILO, o volume do comércio ilegal feito nos túneis é quatro vezes superior àquele que é registado oficialmente. Já o Peres Center for Peace referia no ano passado que o valor dos bens contrabandeados todos os meses situava-se entre os 50 a 70 milhões de dólares, o que representava cerca de 80 por cento do total de bens importados para a Faixa de Gaza. Uma dimensão apenas possível pela existência de mais de 1000 túneis em 2010, segundo aquela entidade.    

 

Tudo se contrabandeia nos túneis, incluindo animais vivos/Foto: Eyad Baba

 

Também o Peace Research Institute Oslo, num relatório de 2010, referia que cerca de 15 mil trabalhadores (escavadores, etc) e 25 mil negociantes (leia-se contrabandistas) estariam envolvidos na “tunnel economy”. Números que seriam atenuados com o aligeiramento do cerco por parte de Israel no Verão de 2010.

 

A escavação de túneis começou depois do início da intifada de al Aqsa, em Setembro de 2000, na sequência do bloqueio cerrado imposto por Israel à Faixa de Gaza, por mar, terra e ar.

 

Quase todos estes túneis partem de Rafah, cidade no sul da Faixa de Gaza junto à fronteira egípcia, e tudo é contrabandeado por estes canais subterrâneos, como produtos alimentares, artefactos para a casa, electrodomésticos, material de construção e animais vivos, como ovelhas, vacas e burros. Tudo feito sob o comando do Hamas.

 

*Este é o último de uma série de três textos sobre a Faixa de Gaza

Os "novos milionários" da Faixa de Gaza*

Alexandre Guerra, 20.10.12

 

Desenho da Middle East Children's Alliance 

 

Há anos que as forças de segurança israelitas (IDF) impõem um bloqueio impiedoso à Faixa de Gaza, sendo este o principal factor responsável pela deterioração das condições de vida dos palestinianos que vivem naquele enclave.

 

Um bloqueio que, até ao Verão de 2010, permitia apenas a entrada de alguns alimentos básicos e medicamentos. Nessa altura, devido à pressão internacional no seguimento do incidente que envolveu o assalto militar israelita à flotilha humanitária turca, o Governo hebraico aligeirou o cerco, permitindo a entrada de uma maior variedade de bens de consumo.

 

Mas o controlo continuou a ser muito restrito, impedindo a entrada de materiais essenciais para a reconstrução e recuperação de um enclave totalmente asfixiado e parcialmente destruído, sobretudo a partir do momento em que o conflito israelo-palestiniano voltou a aquecer com o início da intifada de al Aqsa, em Setembro de 2000.

 

As três semanas de bombardeamentos israelitas no Inverno de 2008/2009 (Operação “Cast Lead”) vieram lançar ainda mais caos sobre os principais centros urbanos: a cidade de Gaza, Khan Yunis e Rafah. Mais de seis mil casas foram destruídas, assim como quase duzentas estufas. Contaram-se para cima de 900 crateras em estradas e ruas provocadas pelo impacto das bombas israelitas, 25 milhões de dólares em estragos nas universidades, mais de 35 mil cabeças de gado e um milhão de aves mortas. Dezassete por cento da área cultivável foi destruída.

 

Fonte: Relatório "Gaza in 2020: A liveable place?"/UNRWA

 

O Governo hebraico justificou a sua acção bélica com os mesmos argumentos com que tem sustentado o bloqueio: os lançamentos constantes de morteiros, por parte de militantes do Hamas, sobre zonas israelitas contíguas ao enclave, e a incursão de terroristas suicidas no território judaico.

 

É com base neste receio que o Governo israelita mantém a proibição de entrada e saída de palestinianos de Gaza, apenas em casos específicos ou de emergência médica. O autor destas linhas chegou a ouvir testemunhos de palestinianos na Cisjordânia a lamentarem-se pelo facto de já não visitarem familiares seus na Faixa de Gaza há muito tempo, por causa de não poderem circular em Israel nem entrar no enclave.

 

A verdade é que nestes doze anos, desde o início da intifada de al Aqsa, que entretanto terminou, os palestinianos de Gaza estão praticamente entregues à sua sorte, valendo-lhes o apoio das instituições sociais do Hamas e de algumas ONG.

 

Em Agosto, as Nações Unidas divulgaram um relatório importante, “Gaza in 2020: A liveable place?”, no qual lançaram o alerta: Gaza não será “habitável” em 2020 a não ser que se actue urgentemente em áreas como o saneamento básico, o abastecimento de água potável, o fornecimento de electricidade, a saúde ou o ensino.

 

O documento da agência da ONU de apoio aos refugiados palestinianos (UNRWA) estima que nos próximos oito anos a população da Faixa de Gaza chegue aos 2,1 milhões, mais 500 mil pessoas que actualmente.

 

Apesar da economia ter crescido nos últimos anos, os palestinianos vivem em média pior do que nos anos 90, onde o rendimento per capita era superior ao do ano passado. 

 

Esta aparente contradição explica-se pelo facto desse crescimento estar focado na construção, como foi aliás abordado no primeiro texto desta série, e não em sectores produtivos e sustentáveis da economia.

 

E uma vez que não é a população em geral a ganhar os dividendos do crescimento (pelo contrário), alguém há de estar a fazer dinheiro na Faixa de Gaza. Ou melhor dizendo, alguns homens bastante ricos, próximos do Hamas.

 

Citado pela BBC News, Omar Shabban, economista do think thank Palthink, baseado em Gaza, refere que devem existir actualmente entre 100 a 200 “novos milionários” que juntaram muito dinheiro em pouco tempo e que devem fazer 2 milhões de dólares de dois em dois meses.  

 

Estes homens têm usufruído do “boom” da construção e de toda uma economia paralela que é alimentada pelas centenas de túneis que existem entre a Faixa de Gaza e o Egipto, pelos quais é contrabandeado todo o tipo de materiais provenientes do território egípcio. Um tema a ser analisado no terceiro e último texto desta série.

 

*Este é o segundo de três textos sobre a Faixa de Gaza

 

O sonho perdido de Arafat (1)

 

Os alarmes de um conflito com o Irão voltam a soar no Médio Oriente

Alexandre Guerra, 19.07.12

 

Sobreviente do atentado de ontem na cidade búlgara de Burgas/Foto: Reuters 

 

Ehud Barak, ministro da Defesa israelita, não tem dúvidas que o atentado que vitimou cinco turistas israelitas, ontem, na cidade balnear de Burgas na Bulgária foi perpetrado pelo Hezbollah sob os auspícios do Irão. Também Avigdor Liberman, chefe da diplomacia hebraica, informou que este ataque tem a impressão digital iraniana. 

 

Por esta altura, o Diplomata tem a certeza que os "falcões" israelitas estão a pressionar o líder do Executivo, Benjamin Netanyahu, para avançar em força contra o Irão. A julgar pelas declarações de "Bibi", aqueles não deverão ter que se esforçar muito para terem a sua vingança. Netanyahu já disse que "Israel vai responder ferozmente contra o terror iraniano".