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O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

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Imagens raras de um ataque de colonos judeus a uma aldeia palestiniana

Alexandre Guerra, 21.05.12

 

O primeiro vídeo mostra os colonos judeus a descerem o vale em direcção à aldeia. 

São imagens raras, aquelas que foram divulgadas pela B´Tselem, uma organização humanitária israelita, composta por jornalistas, advogados, académicos e membros do Knesset, a operar nos territórios ocupados da Cisjordânia e Faixa de Gaza. De acordo com as gravações feitas por elementos daquela ONG, vê-se alegadamente um ataque perpetrado por colonos judeus armados a uma aldeia palestiniana.

 

Numa replicação invertida da luta bíblica entre David e Golias os acontecimentos que se vêem nas imagens terão ocorrido no passado Sábado perto da aldeia palestiniana de Asira al-Qubliya, próxima do colonato de Yitzhar.

  

No segundo vídeo já é possível ver com mais detalhe a movimentação dos colonos judeus.
Há muito que existiam relatos deste tipo de ataques por parte de colonos judeus a localidades palestinianas vizinhas de colonatos, mas até agora não existiam provas disso.

 

Num dos três vídeos começa-se por ver os colonos armados a descerem pelo vale em direcção à aldeia palestiniana. Na resposta, alguns palestinianos atiram pedras, ouvindo-se pelo meio o disparo de algumas balas vindas dos colonos judeus.

 

Minutos depois chegam soldados das IDF e homens da Border Police, que se limitar a ficar ao lado dos colonos.

 

Destes confrontos resultou um ferido do lado palestiniano. 

 

Neste terceiro vídeo parece ficar claro a passividade dos soldados israelitas perante o incidente.

Gaza responde a raide aéreo israelita com "chuva" de rockets

Alexandre Guerra, 12.03.12

 

 

Na semana passada o Diplomata escrevia neste espaço que "mais uma vez ultrapassados pelos acontecimentos, os palestinianos têm enfrentado nos últimos meses um agudizar das difíceis condições na Cisjordânia, sem que alguém lhes dê atenção".

 

Nos últimos dias, a escalada de violência fez-se também sentir na Faixa de Gaza, depois de um raide aéreo israelita para eliminar um líder de um grupo radical. No lado palestiniano já se verificaram várias mortes. E na resposta, só hoje, foram disparados 40 rockets katyusha por militantes daquele enclave sobre território israelita, tendo alguns caído apenas a 40 quilómetros de Telavive. Desde a passada Sexta-feira que já foram disparados mais de 200 katyusha. 

 

Órfãos, outra vez

Alexandre Guerra, 08.03.12

 

Funeral do jovem Talat Ramia, de 23 anos, morto no mês passado em confrontos com soldados israelitas/Foto: Ammar Awad/Reuters 

 

Das aulas do professor Sattar Kassem na Universidade de Birzeit, o autor destas linhas (que, a título de curiosidade, foi o primeiro português a estudar naquela instituição altamente politizada pela Fatah) nunca esqueceu a visão pragmática e desconfiada que aquele destacado académico palestiniano tinha do relacionamento do seu povo com os “irmãos” árabes.

 

Uma espécie de resignação pelo facto dos palestinianos estarem sempre do lado errado da História, acabando por ficarem abandonados à sua sorte, sem que a solidariedade árabe ou muçulmana lhes valesse no seu conflito crónico com Israel. Efectivamente, não se pode dizer que os palestinianos tenham sido bem tratados pelo Egipto, pela Jordânia ou pelo Líbano, apenas para citar alguns casos.

 

O Diplomata viria a constatar que esse sentimento de resignação era transversal na sociedade palestiniana, mas aceite com toda a naturalidade. Um jovem de Ramallah chegou a dizer que os palestinianos eram o “parente pobre” dos árabes.

 

Esta passou a ser uma assumpção inquestionável que perpassa todo o consciente colectivo palestiniano, um povo que sabe que não pode contar com o apoio dos seus “irmãos” árabes na defesa da sua causa. Mais, os palestinianos têm a perfeita consciência de que têm sido utilizados politicamente por vários Estados árabes e muçulmanos que tentam capitalizar um suposto apoio à “causa”. Apoio esse que acaba quase sempre por se revelar na prática totalmente inconsequente. Por esta razão, organizações como a al Qaeda, que apregoaram a defesa dos interesses palestinianos, nunca tiveram grandes entusiastas por terras da Cisjordânia e da Faixa de Gaza. Pelo contrário, são vistas com desconfiança e desdém.

 

Para os palestinianos, a al Qaeda não fez mais do que outros países árabes e muçulmanos já fizeram, ao aproveitarem-se da situação para cativar mais simpatias junto das sociedades que dirigem ou inspiram. 

 

A “causa” palestiniana é uma boa causa para ser defendida, numa óptica de public relations. Os líderes de países árabes e muçulmanos sabem que o sofrimento palestiniano e a luta pela sua independência é um factor consensual e de união popular. Mas, da declaração política/intenções às acções concretas na área do conflito israelo-palestiniano vai uma grande distância.

 

E os palestinianos sabem disso, acreditando pouco em manifestações de apoio por parte dos seus “irmãos”. Na verdade, consideram-se uns “órfãos” que, por um lado, têm as atenções de quase toda a comunidade internacional, mas, por outro lado, estão constantemente a ser remetidos para uma solução adiada.

 

Ainda esta Quarta-feira, o New York Times publicava um artigo em que estabelecia uma relação directa entre o apagamento do processo negocial israelo-palestiniano na agenda internacional e a euforia da Primavera Árabe e do ressurgimento do “dossier” nuclear iraniano.     

 

Mais uma vez ultrapassados pelos acontecimentos, os palestinianos têm enfrentado nos últimos meses um agudizar das difíceis condições na Cisjordânia, sem que alguém lhes dê atenção. “O principal desafio que enfrentamos – além da ocupação – é a marginalização”, disse ao NYT, Salam Fayyad, primeiro-ministro palestiniano. “Isto é consequência directa da Primavera Árabe onde as pessoas estão preocupadas com os seus próprios assuntos internos”, acrescentou.

 

Veja-se também que, embora Washington tenha tido sempre a preocupação de centrar o processo negocial israelo-palestiniano em qualquer encontro bilateral com responsáveis israelitas ou palestinianos, há dias, quando o chefe de Governo do Estado hebraico, Benjamin Netanyahu, esteve na Casa Branca reunido com o Presidente Barack Obama, a conversa foi dominada pelo Irão.

 

Ao mesmo jornal, Zakaria al-Qaq, um especialista palestiniano em segurança nacional da Universidade de Al Quds, em Jerusalém, dizia o seguinte: “Eu não vejo a Palestina na agenda dos Estados Unidos ou de Israel. Está na prateleira. Os palestinianos não têm a habilidade de se impor no mundo e não conseguem mobilizar o seu povo. O mundo árabe está ocupado. Os palestinianos estão a tornar-se secundários.”

 

Texto publicado originalmente no Forte Apache.

 

À conversa com o "Mandela palestiniano"

Alexandre Guerra, 19.10.11

 

 

Corria o Verão de 2001. O Médio Oriente estava a “ferro e fogo”. A intifada de al Aqsa estava prestes a entrar no segundo ano, com terroristas suicidas a fazerem-se explodir quase todas as semanas nas cidades israelitas e os territórios ocupados da Cisjordânia e da Faixa de Gaza em autêntico estado de sítio.

 

Em Ramallah, o autor destas linhas, tinha uma entrevista marcada com aquele que era, talvez, o principal líder da segunda intifida, sobretudo junto da população mais jovem.

 

Marwan Barghouti, destacado dirigente da Fatah (então secretário-geral) e, alegadamente, fundador das milícias Tanzim, uma espécie de braço armado daquele movimento político, era há algum tempo um dos homens mais procurados pelas forças de seguranças israelitas (IDF).

 

No seu escritório em Ramallah, lá estava Barghouti, uma figura de pequena estatura, com ar amistoso e com o seu famoso bigode. Cordial e acessível, embora não exibisse uma simpatia excessiva, o militante da Fatah demonstrou desde logo uma convicção política firme.

 

A entrevista foi partilhada com um jornalista da agência de notícias alemã, e apesar das insistências, Barghouti nunca admitiu que era o líder das milícias Tanzim, responsáveis por vários atentados terroristas contra Israel.

 

Serpenteava-se como um verdadeiro político na forma como respondia às perguntas mais sensíveis que lhe eram colocadas, chegando mesmo a dizer que acreditava que a Palestina ia ser independente “dentro de cinco anos” (Foi este o título da entrevista depois publicada no jornal Público. No entanto, a História viria demonstrar que Barghouti estava errado).

 

Quem não estava errado eram os interlocutores de Barghouti, quando o confrontaram com a sua relação com as Tanzim, já que hoje não parece haver muitas dúvidas quanto a esse facto. Aliás, uma relação que Israel nunca duvidou da sua existência. De tal forma, que dias antes desta entrevista, aquele militante palestiniano tinha escapado a um atentado selectivo das IDF contra o carro onde viajava.

 

Um ano mais tarde, os soldados israelitas acabariam por deter Barghouti, sendo condenado posteriormente a 5 penas perpétuas.

 

Quando, na semana passada, foi tornado público o acordo de troca de prisioneiros que estava a ser forjado entre o Governo israelita e o Hamas, uma centelha de esperança reacendeu-se para milhares de palestinianos, que viram aqui uma oportunidade para fazer regressar a casa o carismático Barghouti. Mas, rapidamente essa esperança se esvaneceu.

 

Sabendo do prestígio e da notoriedade do ex-líder das Tanzim, a quem muitos chamam de o “Mandela palestiniano”, as autoridades israelitas tiveram o cuidado de deixar bem claro desde o início deste processo de troca de prisioneiros, que se prolongará durante os próximos meses, que Barghouti não estava incluído nas listas dos palestinianos a serem libertados.

 

Texto originalmente publicado no Forte Apache.

 

Filmes do NYT que ajudam a compreender o processo negocial israelo-palestiniano

Alexandre Guerra, 21.09.11

 

A sensivelmente 48 horas do Presidente da Autoridade Palestiniana, Mahmoud Abbas, entregar, por escrito, ao secretário geral das Nações Unidas, Ban ki-moon, o pedido de independência do novo Estado da Palestina, o Diplomata sugere uma visita a esta página do New York Times, com três filmes que ajudam compreender, de forma sucinta e clara, os principais problemas que estão em discussão (fronteiras, barreira e colonatos).

 

A psicose de um Estado que constrói casas no território do inimigo, mas não investe no seu

Alexandre Guerra, 12.08.11

 

Palestinianos numa obra de novas casas de um colonato em Jerusalém Oriental, em 2010/Foto: Ahmad Gharabli/AFP/Getty Images

 

Caso não aconteça uma revolução a vários níveis no Médio Oriente, um dia Israel vai ser confrontado com uma guerra que nunca irá ganhar: a fatalidade da exiguidade geográfica e a pressão demográfica, quer hebraica, quer árabe (o Diplomata voltará a este assunto mais tarde).

 

De certa maneira, o problema já começou a ser sentido internamente, de forma ruidosa e massiva, como ficou demonstrado há dias com a manifestação de 300 mil pessoas que vieram para as ruas de Telavive exigir ao Governo liderado por Benjamin Netanyahu uma política de habitação que possibilite às pessoas adquirirem ou arrendarem casas a preços acessíveis. Este Sábado estão previstas manifestações em 12 cidades israelitas. 

 

Ao contrário do que acontece em Portugal, em Israel constrói-se pouco, já que a área disponível para tal é muito reduzida. O resultado é óbvio: poucas casas disponíveis no mercado. Ora, de acordo com a mais elementar lei da oferta e da procura, as consequências são mais que previsíveis.

 

Chamam-lhe o protesto das tendas, apartidário, indo da direita à esquerda, um pouco à semelhança dos vários movimentos que se têm verificado em vários países europeus.

 

Mas, tendo esta manifestação acontecido no Médio Oriente, naturalmente que os seus contornos são ainda mais complexos. Yoel Marcus escrevia no Haaretz que esta teria sido a única verdadeira manifestação na história de Israel sem qualquer interferência dos partidos políticos.

 

E embora sendo uma manifestação que, em última instância, procura decisões políticas, não deixa de ser curioso que aquela que terá sido a mais significativa expressão cívica em Israel não tenha estado relacionada, pelo menos directamente, com o conflito israelo-palestiniano, mas sim com questões mundanas da sociedade hebraica.  

 

Perante esta demonstração de força cívica, Benjamin Netanyahu foi obrigado a reagir, tendo já anunciado algumas medidas.

 

Apesar disso, como diz ainda Yoel Marcus, não bastará a Netanyahu largar um milhão aqui outro milhão ali. Será preciso adoptar uma política estratégica e coerente no que diz respeito à habitação.

 

Mas, se isto já é, por si só, um desafio hercúleo em sociedades ditas normais, como a portuguesa, no caso de Israel tudo se torna mais complicado, perante a existência de um paradigma bem delineado no que diz respeito à construção de habitação nos territórios ocupados da Cisjordânia com fins geopolíticos e geoestratégicos.

 

Se durante muitos anos a sociedade hebraica foi aceitando, ou pelo menos foi passiva, perante esta situação, agora parece começar a dar sinais de que não estará disponível para ver o seu Governo a manter uma política de habitação bem estruturada para os colonatos ao mesmo tempo que não dá respostas aos problemas diários dos cidadãos que vivem no território hebraico.

 

Ainda há uns dias, o ministro do Interior aprovou a construção de mais 1600 casas para colonos nos territórios ocupados de Jerusalém Oriental em Ramat Shlomo. É importante relembrar que esta medida tinha sido anunciada em Março do ano passado, gerando inclusive algum desconforto entre Washington e Telavive, já que a sua divulgação coincidira como a visita do vice-Presidente americano Joe Biden a Israel.

 

Além destas 1600, serão em breve aprovadas mais 2000 para o colonato de Givat Hamatos e outras 700 para o de Pisgat Zeev.

 

Face aos protestos dos últimos dias, o porta-voz do Ministério do Interior hebraico já veio dizer que esta medida é meramente “económica” e não “política”, dando a entender que poderá ser uma tentativa de resposta aos anseios da população hebraica.

 

Mas, o Diplomata tem grandes dúvidas que seja esse o caminho que o Governo hebraico deve seguir, sobretudo por duas razões: a primeira prende-se com o processo negocial israelo-palestiniano, havendo uma enorme pressão da Autoridade Palestiniana, de Washington e da comunidade internacional em geral para que Telavive ponha fim à sua política de expansão de colonatos; a segunda razão tem a ver com o perfil específico dos judeus ortodoxos mais radicais que procuram os colonatos, que, apesar de tudo, são uma minoria na sociedade israelita.

 

Como o autor destas linhas já escreveu em tempos, a maioria dos colonos são radicais no seu pensamento. Consideram-se uma espécie de linha avançada da causa sionista na Terra Santa.

 

Dentro da própria sociedade israelita são vistos como uma corrente radical, que canaliza muitos recursos financeiros ao Estado hebraico e que é responsável pelo fracasso crónico das negociações com os palestinianos.

 

Há uns anos, o autor destas linhas conversava em Telavive com um judeu ortodoxo da ala mais radical que tinha passado uma temporada num colonato, e apesar do seu discurso sustentando por uma aparente racionalidade histórica, rapidamente se percebeu que por detrás dos argumentos apresentados se esconde uma fé cega inabalável de “direito histórico” ao território da Cisjordânia, numa perspectiva de Grande Israel.

 

De acordo com os números disponíveis, cerca de 450 mil a 500 mil (não há um valor oficial) colonos vivem na Cisjordânia (incluindo Jerusalém Oriental). Isto representa um custo enorme para os cofres do Estado hebraico, porque para manter um colonato em território palestiniano é necessário assegurar condições logísticas e infraestuturas bastante onerosas. Já para não falar no dispositivo de segurança que é preciso mobilizar.

 

Por exemplo, cada colonato funciona como uma autêntica cidade em território hostil, com todos os serviços (escolas, correios, centros de saúde, parques, equipamento desportivos, etc) que existem em Israel. Cada colonato tem ainda uma estrada própria (interdita a palestinianos) que faz a ligação ao Estado hebraico.

 

Quanto ao dispositivo de segurança, está-se a falar de autênticas fortificações, dotadas dos mais avançados equipamentos de vídeo vigilância e bélicos. A segurança activa é assegurada pelos militares das Forças de Segurança Israelitas (IDF).

 

Ora, tudo isto faz com que cada fogo de habitação num colonato se torne muito dispendioso em comparação com o valor da construção de uma casa em condições normais.

 

Mas com se sabe, falar em normalidade no Médio Oriente é pura ficção, sobretudo num Estado que na sua zona mais estreita tem sensivelmente 15 quilómetros de profundidade estratégica (distância entre a praia banhada pelo Mar Mediterrâneo e a fronteira com a Cisjordânia).   

 

Ao longo dos anos a expansão dos colonatos assentou claramente em motivações políticas e estratégicas, numa lógica quase psicótica de que Israel estava rodeado de inimigos que o queriam “empurrar” para mar.

 

Os colonatos não são mais do que postos avançados em território inimigo que há que manter a todo custo, independentemente dos assuntos internos israelitas. Para os vários governos hebraicos, a política de expansão de colonatos foi sempre vista numa lógica de sobrevivência do próprio Estado judaico.

 

Existem actualmente 149 colonatos, sendo que alguns dos mais significativos estão situados nos territórios contíguos a Jerusalém Oriental, para lá da “Green Line”. Mas também cidades palestinianas como Nablus, Jericó, Belém ou Ramallah convivem com colonatos nas imediações geográficas.

 

Algo que não incomoda particularmente os colonos, já que estes consideram estar ao serviço da causa judaica, ao ocuparem território aos palestinianos, inimigos por definição histórica e bíblica.

 

É com esta convicção que milhares de colonos vivem tranquilamente o seu quotidiano, apesar de rodeados de arame farpado, escoltados pelas Forças de Segurança Israelitas (IDF), e sempre sob o perigo iminente proveniente, sobretudo, dos movimentos terroristas do Hamas e das milícias da Fatah.

 

Uma estranha e obsessiva forma de estar na vida, dirá o leitor deste texto, mas a insanidade mental reinante no Médio Oriente altera por completo a perspectiva do problema.

 

Perante tudo isto, é notório que existe uma parte da população em Israel no seu dia-a-dia que enfrenta cada vez mais dificuldades, ao mesmo tempo que vê o Estado hebraico a continuar a investir massivamente na política de colonatos, quando no seu próprio país não consegue comprar ou arrendar uma casa, ou porque os preços são exorbitantes ou porque simplesmente não existem.

 

A ingenuidade de Obama

Alexandre Guerra, 22.05.11

 

Eran Wolkowski/Haaretz

 

O Presidente Barack Obama foi ingénuo e mal aconselhado quando, no discurso sobre o Médio Oriente proferido na passada Quinta-feira, veio defender a solução de “dois Estados” na Palestina delimitados pelas fronteiras anteriores à Guerra dos Seis Dias ("pre-1967 borders"). Um erro de tal forma evidente e inédito nas presidências americanas, que foi confrangedor ver Obama ouvir do primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, em plena Sala Oval, que tal solução nunca seria aceite por Israel, porque a mesma colocaria em causa a segurança da própria existência do Estado hebraico.

 

O problema das palavras de Obama não está na criação do Estado palestiniano, porque neste ponto todos estão de acordo, incluindo os israelitas, mas sim no facto de sugerir que a sua fronteira com Israel tivesse em conta as linhas impostas em 1949.

 

É preciso relembrar que até 1967, ano em que Israel expandiu substancialmente as suas fronteiras com a Guerra dos Seis Dias, um dos grandes dramas daquele Estado era o problema da “profundidade estratégica”. Note-se que durante aquelas quase duas décadas a zona mais estreita de Israel tinha apenas 15 Km de largura, ou seja, de terra a separar o Mar Mediterrâneo e os territórios palestinianos da Cisjordânia.

 

Para um povo que vive rodeado de inimigos e com a “psicose” de que os palestinianos “querem atirar os judeus para o mar”, as fronteiras israelitas pré-1967 eram claramente uma ameaça à segurança de Israel.

 

 

A “green line” delineada na sequência da Guerra dos Seis Dias acabou por aumentar a “profundidade estratégica” de Israel. E desde então que passaram a ser estas as linhas divisórias “reconhecidas” informalmente no âmbito do processo negocial israelo-palestiniano.

 

Daí a estranheza das declarações de Obama, que aliás, o próprio deve ter reconhecido imediatamente após ter terminado o seu discurso, já que praticamente não reagiu às palavras duras de Netanyahu quando este disse que as linhas de 1967 eram “indefensáveis”. Palavras essas que estão a provocar algum mal-estar no seio da administração americana, com algumas correntes a terem menos paciência para o descontrolo político do seu aliado, comportando-se cada vez mais como um “loose cannon”.

 

Quem não gostou mesmo nada das declarações de Obama foi o poderosíssimo lobby judaico nos Estados Unidos. Assim, e perante as muitas críticas, o Presidente veio reiterar e esclarecer este Domingo no American Israel Public Affairs Committee (Aipac), o principal grupo de lobby judaico norte americano, aquilo que tinha dito: “Let me repeat what I actually said on Thursday (…) I said that the United States believes that negotiations should result in two states, with permanent Palestinian borders with Israel, Jordan, and Egypt, and permanent Israeli borders with Palestine. The borders of Israel and Palestine should be based on the 1967 lines with mutually agreed swaps, so that secure and recognized borders are established
for both states.”

 

Obama tem tido a preocupação de enfatizar este último ponto, que diz respeito à troca de territórios por mútuo acordo, porque segundo a Casa Branca, as principais críticas de Netanyahu não têm tido em consideração esta questão fulcral para o Presidente americano: “Since my position has been misrepresented several times, let me reaffirm what ‘1967 lines with mutually agreed swaps’. By definition, it means that the parties themselves — Israelis and Palestinians — will negotiate a border that is different than the one that existed on June 4, 1967. It is a well known formula to all who have worked on this issue for a generation. It allows the parties themselves to account for the changes that have taken place over the last 44 years.”

 

Também George Mitchel, enviado americano para o Médio Oriente, saiu em defesa de Obama, para dizer que este não tinha dito que Israel teria que voltar às fronteiras pré-1967. O que o Presidente teria proposto eram as tais trocas de territórios por mútuo acordo.

 

Seja como for, e apesar das suas boas intenções, o Presidente Obama abordou este assunto da pior maneira possível, já que a questão das fronteiras, juntamente com o problema dos refugiados e do estatuto de Jerusalém, é um assunto de enorme sensibilidade para israelitas. E até mesmo os dirigentes palestinianos sabem que, realisticamente, nunca será possível ter um Estado Palestiniano com as fronteiras pré-1967, tal como sabem que nunca será possível o regresso de todos os palestinianos refugiados espalhados pela Jordânia, Líbia e Síria. O estranho é Obama não saber disto ou, pelo menos, não ter a sensibilidade necessária para gerir o tema das fronteiras no Médio Oriente.

 

Já menos estranha foi a dura resposta de Netanyahu que, na senda do que vem sendo hábito desde que assumiu a liderança do Governo, vem adensar ainda mais a tensão nas relações entre Washington e Telavive, colocando em causa os interesses de Israel a médio e a longo prazo. Ainda este Domingo, o Haaretz, em editorial, mostrava-se bastante crítico ao seu primeiro-ministro.

 

Israel vs Israel

Alexandre Guerra, 19.02.11

 

 

A SIC N passava há momentos Israel vs Israel, um documentário de grande qualidade e lançado há poucos meses, que aborda a relação contraditória que a sociedade israelita tem com a questão palestiniana. O Diplomata aproveita para relembrar um outro documentário do mesmo realizador Terje Carlsson, lançado em Novembro de 2007, chamado Welcome to Hebron (episódios 1, 2 3), sobre aquela cidade turbulenta, como o autor destas linhas escreveu em Setembro do ano passado.

 

Saeb Erekat demite-se e o Diplomata relembra uma entrevista feita em Jericó

Alexandre Guerra, 13.02.11

 

 

Saeb Erekat, um dos principais rostos palestinianos na diplomacia internacional, apresentou a sua demissão do cargo de negociador chefe da Autoridade Palestiniana. Uma notícia que não é propriamente uma surpresa, depois do mesmo ter ameaçado fazê-lo há umas semanas, quando foram tornados públicos documentos relativos ao processo negocial israelo-palestiniano, que o colocaram uma situação bastante fragilizada.  

 

Porém, esta situação terá apenas precipitado o seu afastamento, porque a verdade é que Erekat há muito tempo que tinha perdido protagonismo e fulgor no processo negocial israelo-palestiniano. O que não é de estranhar, depois de ter servido a Autoridade Palestiniana durante duas décadas, na maior parte do tempo em condições de enorme dificuldade e tensão, com duas guerras (sul do Líbano e Faixa de Gaza) e duas intifadas pelo meio.

 

Com um perfil moderado e calmo, Erekat tornou-se um dos responsáveis palestinianos mais respeitados pela comunidade internacional. Internamente, o seu estatuto é também inquestionável.

 

O autor destas linhas recorda-se claramente do dia em que entrevistou Erekat, no seu escritório em Jericó.

 

Estava-se no infernal Verão de 2001, com os territórios da Cisjordânia a ferro e fogo e os atentados suicidas a sucederem-se semanalmente nas principais cidades israelitas. Era o segundo ano da Intifada de al Aqsa e israelitas e palestinianos viviam um dos piores momentos das últimas décadas.

 

Jericó, uma das cidades mais antigas da Humanidade e situada no meio do deserto, estava isolada pelas forças de segurança israelitas (IDF) e só se entrava com autorização especial.

 

A conversa com Erekat foi bastante agradável, mostrando-se uma pessoa pouco efusiva, mas simpática. O assunto da entrevista andou à volta da violência que se fazia sentir na altura e das condições impostas por Israel na Cisjordânia e Faixa de Gaza. Por outro lado, Erekat mostrou-se sempre muito crítico aos atentados terroristas palestinianos em território hebraico.

 

Esta sua visão equilibrada da uma realidade complexa ajudou-o a manter-se durante estes anos todos como chefe negociador palestiniano, mesmo após a morte do histórico líder, Yasser Arafat, em 2004.

 

Apesar do papel diplomático que desempenhou, sobretudo na década de 90 e nos primeiros anos do século XXI, a saída de Erekat não deverá ter grandes reflexos no actual estado do processo negocial, praticamente paralisado.

 

Na verdade, desde a morte de Arafat que os líderes palestinianos e israelitas quase não têm conseguido encontrar plataformas sólidas para qualquer espécie de acordo.