Uma história do pós-guerra na Bósnia que tem tanto de verídica como de hilariante
Ratko Mladic só foi capturado no ano passado/Jason Gold/Getty Images
A reportagem foi publicada em Outubro de 2000 na revista Esquire, assinada por Scott Anderson, e descreve a aventura delirante de cinco jornalistas na Bósnia-Herzegovina, que meses antes estavam naquele país, num ano em que se assinalava o quinto aniversário do fim da guerra no Balcãs.
Anderson foi um dos protagonistas da história que, apesar de ter todos os condimentos para ser uma comédia, com alguns personagens que mais pareciam saídos de um circo, estava centrada no débil processo de estabilização dos Balcãs, no qual o cinismo das potências externas se expressou através dos seus jogos políticos, remetendo os capacetes azuis para uma espécie de função decorativa, sobretudo no que diz respeito à captura de criminosos de guerra.
Na altura desta história já tinham passado cinco anos desde o fim da guerra sem que se tivesse notado quaisquer esforços por parte das forças
internacionais na captura de alguns dos principais responsáveis por aquele conflito.
O nome mais sonante era o de Ratko Mladic, comandante das forças sérvias que dizimaram muçulmanos e croatas na Bósnia, que tinha sido acusado pelo tribunal internacional para ex-Jugoslávia (ICTY), em 1995, por crimes de guerra, genocídio e crimes contra a Humanidade. O mesmo tribunal acusou especificamente Mladic de ter tido uma intervenção directa no massacre de Srebrenica, no qual morreram cerca de 8 mil muçulmanos, no “cerco” a Sarajevo e em campanhas de “deportação, perseguição, tortura e assassinos”.
Voltando à história de Scott Anderson. Estava-se na Primavera de 2000 e eram vários os jornalistas internacionais que tinham regressado a Sarajevo, desta vez em tempo de paz, ora para visitar a ex-Jugoslávia ou então para fazer a cobertura do quinto aniversário do fim da guerra.
No terreno via-se uma nova realidade, minada pelos interesses políticos e pela hipocrisia das chancelarias internacionais. O processo de paz, pelo menos nos primeiros anos, foi montado de forma a manter um equilíbrio diplomático que pudesse satisfazer diferentes partes.
No meio desta teia os criminosos de guerra iam escapando, em muitos casos de forma escandalosa, tendo em conta a área reduzida em que se movimentavam.
Hoje, sabe-se que além do apoio e cobertura das populações locais no terreno, muitos dos criminosos de guerra procurados pelo ICTY beneficiaram da complacência de dirigentes políticos, nomeadamente sérvios ou bósnio-sérvios, e da passividade dos capacetes azuis da ONU e da NATO.
Para os jornalistas que tinham estado na Jugoslávia durante o período da guerra (1991-95), as atrocidades que tinham visto permaneciam vivas nas suas memórias cinco anos depois. Não tinham esquecido a crueldade dos carniceiros e percebiam que a comunidade internacional não estava a fazer um verdadeiro esforço para capturar todos esses criminosos.
É a partir daqui que Scott Anderson, juntamente com dois jornalistas americanos, um holandês e um belga, numa noite de Abril de 2000, decidem em ambiente descontraído, de copos, num café no centro de Sarajevo, capturar Mladic. Obviamente que foi tudo engendrado em tom de brincadeira, mas mal sabiam eles que iriam acabar por ser confundidos com uma equipa de elite da CIA, envolvendo-se numa louca operação pseudo-secreta.
A história verídica, contada meses depois na Esquire, é digna de ser lida, com o seu enredo hilariante e personagens alucinados. O filme acabaria por surgir em 2007, um complemento cénico imperdível ao artigo de Scott Anderson.