É de heróis que a Europa precisa
Os profetas que por aí andam falam na actual "crise europeia" como se fosse a "mãe" de todas as crises. Uma crise de tal maneira avassaladora, dizem eles, que pode ameaçar os alicerces da construção europeia. É um ponto de vista, embora algo distorcido daquilo que se vai aprendendo com a História.
Numa das deambulações por coisas que valem mesmo a pena ouvir, o Diplomata recuperava o "Heroes", o segundo trabalho de David Bowie da famosa "Berlin Trilogy", feita em parceria com Brian Eno. Lançado em 1977, este álbum foi gravado em Berlim Ocidental a poucos metros do Muro, no famoso Hansa Tonstudio. Aliás, no próprio álbum lê-se "recorded at Hansa By The Wall".
Esta frase não era meramente informativa, tinha também uma conotação simbólica, num álbum que tentou captar o espírito de uma cidade dividida, símbolo de uma Europa permanentemente em tensão, separada por uma "Cortina de Ferro", com forças convencionais espalhadas por vários países prontas a atacar e sob o espectro da ameaça nuclear. Esta sim, no entender do autor destas linhas, era uma Europa que estava verdadeiramente perante um desafio de proporções históricas.
Mas, mesmo nesta Europa de incertezas, que nos momentos mais "quentes" da Guerra Fria chegou a temer uma Terceira Guerra Mundial, a música "Heroes" homenageia os heróis e repudia os fatalistas. Heróis personificados em duas pessoas apaixonadas que, contra todas as adversidades (e não se está a falar dos "mercados"), vivem o seu momento de felicidade, por um dia, junto do Muro. Um sinal de esperança mas também de desafio ao que muitos aceitavam ser uma realidade consumada e determinista.