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O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

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Algumas incertezas e (quase) certezas no mundo em 2013

Alexandre Guerra, 28.12.12

 

Num exercício prospectivo, ficam aqui algumas incertezas e (quase) certezas no mundo em 2013. Fica também o convite aos leitores deste blogue para acrescentarem na caixa de comentários as suas incertezas ou (quase) certezas para o novo ano que se aproxima.


As incertezas 

 

- O papel do Japão na região Ásia-Pacífico com a nova liderança de Shinzo Abe, sobretudo ao nível das relações diplomáticas com a China e com os Estados Unidos.

- Que impacto terá a eleição da primeira mulher para a presidência da Coreia do Sul nas relações político-diplomáticas entre os dois países da Península Coreana?

- É possível que Pyongyang volte a fazer lançamentos de propulsores balísticos (foguetões) em 2013. Mas haverá algum teste nuclear?

- O cenário político em Itália é neste momento uma incerteza, com as eleições legislativas no horizonte.

- Uma das grandes questões em aberto é saber se a Espanha vai resistir a um resgate massivo.

- Embora já tenha delegado poderes no seu vice, é ainda uma incógnita se Hugo Chávez abandona de vez o poder na Venezuela.

- Será que 2013 marcará o divórcio entre o Reino Unido e a União Europeia?

- Qual o impacto das ondas de choque da “Primavera Árabe” na Casa de Saud da Arábia Saudita e no Reino Hachemita da Jordânia?

- Quantos mais casos de corrupção vão afectar a presidência de Dilma Roussef?

- Os próximos tempos trarão luz sobre o futuro da Direita francesa.

- A Bélgica é um país instável, com duas comunidades linguísticas a reclamarem duas visões diferentes de sociedade. Será que em 2013 as divisões voltarão a vir ao de cima?

- Numa altura em que as divisões entre o Hamas e a Fatah voltam a acentuar-se e com Israel a rejeitar, por completo, o novo estatuto da Autoridade Palestiniana, enquanto Estado observador não membro das Nações Unidas, conseguirá Mahmoud Abbas manter-se à frente dos desígnios palestinianos?

- Depois de Osama bin Laden, será que as forças americanas conseguirão capturar Ayman al-Zawahiri em 2013?

- Poucas dúvidas há quanto à possibilidade de ocorrerem atentados terroristas no próximo ano, a grande questão é saber onde e quando.

- É ainda pouco claro qual o registo que Vladimir Putin pretende impor à política externa da Rússia nos próximos tempos. 

- Em 2013 haverá uma reaproximação entre Washington e Islamabad?

- Os Estados Unidos vão cair no precipício?

- A África do Sul continuará a ser um país com uma sociedade muito tensa e dividida. O presidente Zuma não tem dado grandes provas de ser um homem de bom senso e de apaziguamento. Será incerta a reacção da sociedade sul-africano perante um eventual desaparecimento de Nelson Mandela em 2013.

 

As (quase) certezas


A vitória de Benjamin Netanyahu nas próximas eleições legislativas é quase uma certeza. Mesmo que perca alguns deputados no Knesset, Bibi deverá aproveitar a vitória para reforçar a sua política de expansão dos colonatos e de isolamento da Autoridade Palestiniana.

- Vão continuar a surgir inúmeras notícias a dar conta da proximidade do Irão à "bomba nuclear", mas dificilmente haverá novidades concretas neste capítulo.

- Os ataques cibernéticos camuflados promovidos pelos Estados Unidos contra o Irão deverão continuar, no seguimento do que já aconteceu com os vírus Stuxnet e Flame. 

É das poucas certezas absolutas: a Somália continuará a ser uma manta de retalhos e o melhor exemplo de um "Estado falhado".

- A Al Qaeda irá continuar a perder força e a ficar sem estrutura de cúpula, mas as suas afiliadas instaladas em zonas como o Norte e Corno de África vão manter-se activas e com capacidade mobilizadora.

- Os movimentos fanáticos religiosos na Nigéria, na República Centro Africano, no Uganda e na República Democrático do Congo manter-se-ão activos. Muitos senhores da guerra, como Joseph Kony, líder do LRA, continuarão a deslocar-se livremente pelas selvas africanas, cruzando fronteiras altamente permeáveis.

- Em 2013 vai perceber-se se Hillary Clinton está empenhada em ser a próxima candidata pelo Partido Democrata às presidenciais americanas. Por outro lado, o Partido Republicano vai continuar dividido entre diferentes correntes ideológicas.

- A Irmandade Muçulmana deverá cimentar o seu poder no Egipto, levando a que muitos egípcios recordem os "bons velhos" tempos de Mubarak com saudade. A desconfiança entre o Cairo e Telavive vai aumentar. Washington vai certamente estar muito atenta à evolução da situação interna egípcia, país para o qual é canalizado um grande apoio financeiro americano.

- O Iraque e o Afeganistão manterão o trilho do calvário.

- É muito provável que a guerra civil da Síria vá sendo "alimentada" por potências externas, como a Rússia, o Irão, os curdos e, até mesmo, os Estados Unidos de forma camuflada.

- O Brasil, a Índia ou a China vão continuar a brilhar na economia internacional, embora esta última possa revelar de forma mais evidente algumas fragilidades.

- Pequim irá manter a escalada de investimento em equipamento militar.

- Alguns estados do Golfo continuarão a implementar reformas e a captar investimento estrangeiro.

- A Birmânia irá acentuar a sua política reformista e de abertura ao exterior.

- Nem a UE nem o Euro vão acabar, assim como as intermináveis reuniões do Conselho Europeu.

- Países enormes como o Canadá ou a Austrália continuarão a ser irrelevantes no sistema internacional.

- O nome de José Manuel Durão Barroso começará a ser falado para cargos internacionais como a ONU ou a NATO.

- A Croácia tornar-se-á o 28º membro da União Europeia e a Alemanha continuará a ser a grande potência da Europa.

 

A visita (ou a não visita) de Abe a Yasukuni ditará o rumo da política externa japonesa

Alexandre Guerra, 26.12.12

 

Shinzo Abe, ainda enquanto líder da oposição, visita o santuário de Yasakuni em Outubro/Kimimasa Mayama/European Pressphoto Agency

 

De regresso aos desígnios nipónicos, Shinzo Abe volta a colocar o conservador Partido Liberal Democrático (LDP) no poder e a recuperar uma abordagem diplomática mais agressiva em relação aos seus vizinhos, nomeadamente a China. Dando a vitória a Abe nas eleições legislativas do passado dia 16, os japoneses quiseram alterar o perfil da política externa nipónica face a Pequim, numa altura em que a tensão é crescente entre os dois países, por causa das disputadas ilhas de Senkaku.

 

Os japoneses, ou pelo menos a maioria do eleitorado, não gostaram da forma como os anteriores governos do Partido Democrata (DPJ) geriram os "temas quentes" relacionados com a China ou com a Coreia do Sul (esta a propósito dos ilhéus de Takeshima).  

 

Uma japonesa dizia ao jornal The Asahi Shimbun que tinha votado no LDP porque acreditava que a China acabaria por invadir o Japão se nada fosse feito.

 

Percebendo aquilo que a maioria do eleitorado queria, Abe fez uma campanha agressiva, deixando bem claro que não iria ceder à China ou à Coreia do Sul no que dissesse respeito a interesses nacionais. No entanto, e como sucedeu quando esteve no Governo da primeira vez, em 2006, é muito possível que Abe refreie agora os ânimos. 

 

Com a chefia do Governo ganha, Shinzo Abe deverá agora preocupar-se mais em manter as boas relações com a Coreia do Sul e evitar uma escalada diplomática com a China em redor das ilhas Senkaku.

 

Um bom exemplo desse refreamento poderá materializar-se no recuo das suas intenções de visitar o polémico santuário de Yasukuni, que presta homenagem aos soldados japoneses mortos na II GM, incluindo alguns criminosos de guerra. Durante a campanha Abe dissera que pretendia visitar aquele santuário quando fosse eleito, mas agora, segundo o The Asahi Shimbun, Abe tem-se mostrado vago sobre este assunto, sabendo que tal gesto provocaria o descontentamento não apenas de Pequim, mas também de Seul.


A visita ou a não visita ao santuário de Yasukuni será um bom barómetro para se perceber a orientação que Shinzo Abe vai dar à diplomacia nipónica. Para já, sabe-se apenas aquilo que disse na primeira conferência de imprensa que deu depois de ter sido empossado: "We need to bring back the kind of diplomacy that protects national interests and asserts its positions."


Conselho de Segurança dá um passo histórico na credibilização das missões internacionais

Alexandre Guerra, 21.12.12

 

A resolução aprovada esta Quinta-feira no Conselho de Segurança das Nações Unidas, que prevê a criação de uma força internacional para combater a ramificação da al Qaeda no Norte do Mali, assume contornos históricos. Não tanto pela sua missão, mas pelo seu mandato.

 

Há umas semanas, o Diplomata escrevia que a limitação das “rules of engagement” no terreno tem contribuído para o fracasso de muitas missões internacionais dos capacetes azuis, dando os exemplos de Srebrenica, do Ruanda e do Sri Lanka.  Chegou mesmo a falar no filme No Man’s Land, 2001, que capta com humor a passividade e, por vezes, as ridículas situações dos soldados internacionais sob o "badge" da ONU.

 

A resolução agora aprovada, para a criação da AFISMA que terá 3300 homens, viabiliza no mandato daquela força o uso de "todos os meios necessários" para a prossecução da sua missão. Ora, esta introdução é de extrema relevância e poderá marcar uma nova abordagem das Nações Unidas às missões militares internacionais, já que passa a estar implícita a validade da intervenção militar sempre que os soldados considerem necessária sem terem que recorrer à cadeia de comando.

 

De certa maneira, este princípio de "todos os meios necessários" vai de encontro às declarações que o secretário-geral Ban Ki-moon tinha proferido no mês passado, no seguimento da divulgação de um relatório interno que apontou inúmeras falhas das Nações Unidas nos últimos meses de conflito no Sri Lanka. Ban Ki-moon disse que este relatório iria ter "implicações profundas" na organização.

 

Talvez a resolução aprovada esta Quinta-feira seja já resultado dessa vontade de mudança.

 

Os americanos esqueceram-se do princípio virtuoso da II Emenda da Constituição

Alexandre Guerra, 17.12.12

 

Nos Estados Unidos voltou-se a chorar pelas crianças mortas numa escola. E desta vez até o Presidente verteu umas lágrimas. Mas a verdade é que o drama vai-se repetindo de tempos a tempos e nada é feito para travar, ou pelo menos atenuar, este tipo de acontecimentos dramáticos (e não é só em escolas).

 

Como é natural nestes momentos de dor colectiva e de histeria opinativa, lá acordam os políticos para virem dizer “basta, porque agora é que chegou o momento de se pôr cobro a este tipo de massacres”.  

 

Ao ouvir isto, o autor destas linhas questiona-se: mas onde é que esta gente tem andado? Uma coisa é certa, parece que já tinham esquecido Columbine. Na altura, para quem se recorda, também a América ficou em choque e tinha chegado o momento de viragem. Desde então, tudo na mesma.

 

Obviamente que qualquer acção legislativa no sentido de um maior controlo na venda e posse de armas suscitará um debate intenso e polémico na sociedade americana.

 

E porquê? Basicamente, porque uma grande parte dos americanos acha-se no direito constitucional de ter uma(s) arma(s). E, efectivamente, a II Emenda (1791) sustenta essa realidade quando defende o “Right to Bear Arms”.

 

Mas a II Emenda também é clara no propósito final subjacente a esse direito: “A well regulated Militia, being necessary to the security of a free State, the right of the people to keep and bear Arms, shall not be infringed.”

 

Ou seja, os “legisladores” providenciaram o direito constitucional aos cidadãos de terem armas e de poderem andar com as mesmas como meio para garantir a virtude do Estado e do seu Governo e não como instrumento de defesa pessoal ou de serviço a outros interesses particulares.

 

Esta Emenda foi criada com base na desconfiança filosófica e ideológica que os legisladores tinham em relação ao Governo, por acreditarem que este poderia, nalgum momento, desvirtuar-se. Só com o povo dotado de armas poderia depor esse Governo e repor um novo “príncipe” virtuoso.

 

De certa maneira, estaria aqui subjacente o princípio bíblico de armar o mais fraco (o justo) para derrotar o mais forte (o ímpio), e que permitiu a David, com a sua funda, derrotar Golias.

 

Ora, os americanos esqueceram-se dos propósitos virtuosos e das boas intenções dos “legisladores”, agarrando-se apenas ao “Right to Bear Arms” para se armarem até aos dentes.

 

Momento Austin Powers

Alexandre Guerra, 10.12.12

 

 

Numa das passagens do livro "Os Anos Blair", Alastair Campbell relembra o seguinte episódio ocorrido no dia 5 de Abril de 2002:

 

"Era o dia da procissão do corpo da rainha-mãe para a câmara ardente. Estava um belo dia soalheiro, com uma cobertura total da família real, multidões razoáveis, uma atmosfera agradável. Fui [Campbell] encontrar-me com Tony Blair no apartamento. Outro momento Austin Powers. Cuecas amarelas/verdes e nada mais. Disse-lhe que parecia ridículo. Ele respondeu que era só inveja -- quantos primeiros-ministros tinham um corpo daqueles?"


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