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No âmbito do mestrado de Ciência Política, Cidadania e Governação da Universidade Lusófona, Lisboa, o autor destas linhas discutiu esta Quinta-feira (14) a sua dissertação dedicada ao tema: “O Impacto das Novas Biotecnologias no Pensamento Político – A problemática das células estaminais embrionárias”.
Teve o privilégio de ter tido como orientador o proeminente sociólogo, o Prof. Hermínio Martins, St. Anthony’s College, University of Oxford, e como co-orientadores, o Prof. João Bettencourt da Câmara, Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP), e o deputado António Filipe, Universidade Lusófona.
Com estes ilustres membros no júri, o qual foi presidido pelo Prof. Fernando Pereira Marques da Universidade Lusófona, à dissertação foi atribuída, por unanimidade, a nota de 15 valores (Bom).
O Diplomata deixa aqui a introdução da sua dissertação, informando que a mesma pode ser consultada na biblioteca da Universidade Lusófona em Lisboa.
Introdução
Quando em 2003 foi dado como concluído o Projecto do Genoma Humano (PGH), dois anos antes do que estava previsto, os cientistas tinham acabado de vencer uma importante etapa no campo da investigação genética e na área das novas biotecnologias, num percurso iniciado no século XIX. Mas, concomitantemente acentuaram-se dilemas morais e éticos, que já vinham acompanhando a evolução do processo científico que, particularmente nesta matéria, sofreu um forte impulso no início da década de 70 do século XX, para mais tarde, nos anos 80, assistir a uma “louvada revolução biotecnológica”.
Estas descobertas foram sendo exploradas por empresas como a Genentech ou a Biogen, pioneiras na utilização das “novas tecnologias genéticas”. Hoje, muitos dos gigantes farmacêuticos chamam até si os custos da investigação em inúmeros campos, incluindo o das células estaminais embrionárias.
Da reprodução de órgãos geneticamente iguais à possível criação de um “super-homem”, a sociedade encontra-se no centro de um debate que, embora ainda tímido nalguns Estados e até mesmo ausente noutros, ganha protagonismo na agenda política.
Tal como o passado já demonstrou, a comunidade científica parece caminhar para a inevitabilidade da descoberta, a um ritmo que, em última instância, só pode ser controlado pelo poder político. A investigação em células estaminais embrionárias (devido às suas características únicas que lhes permitem transformar-se em outros tipos de células – “blood cells”, "neural cells”, “muscle cells”) assume particular importância no campo da genética, uma vez que poderá ser a porta de entrada para uma sociedade perto da utopia, onde, segundo alguns, os malefícios que hoje assombram o Homem se tornariam coisa do passado.
Certos cientistas não têm dúvidas ao afirmar que o uso de células estaminais embrionárias poderá vir a curar doenças congénitas e degenerativas. Em termos mais amplos, a utilização das células estaminais embrionárias poderá funcionar como uma espécie de “kit de reparação” do corpo humano. Teoricamente, será possível usar as células estaminais para “(re)criar vida”, mais concretamente tecidos vivos e totalmente compatíveis com o eventual receptor.
Mas, tudo isto levanta uma série de questões morais, éticas e políticas. Dilemas quanto aos processos de investigação e quanto às consequências que a sua aplicação poderá trazer para a própria Humanidade.
Quando Francis Fukuyama falou no “fim da história”, apropriando-se de uma concepção determinista, admitiu mais tarde que a génese da destruição da
sua tese se encontrava precisamente nas novas biotecnologias. A possibilidade de um “outro eu”, produto do Homem e não do livre arbítrio, faria emergir um mundo pós-humano, dando-se, assim, início a uma nova História.
Como trabalho de Ciência Política não cabe no propósito deste tecer cenários filosóficos quanto ao futuro do Homem face aos avanços da investigação genética, mas sim tentar analisar e procurar encontrar um padrão de comportamento na forma como os legisladores e governantes, mediante a sua base doutrinária, têm abordado uma matéria cujas implicações terão eventualmente impacto na concepção da própria Humanidade.
Partindo do princípio que a uma determinada decisão corresponde um específico modelo ideológico e de pensamento, será possível estabelecer-se uma distinção esquerda/direita em função das atitudes manifestadas relativamente à investigação e aplicação dos estudos sobre células estaminais embrionárias?
Utilizando o caso americano como objecto de análise, parece constatar-se essa ideia. A administração republicana liderada por George W. Bush, e dominada por uma corrente (neo) conservadora, não se coibiu de exercer pressão junto da sociedade no sentido de travar a investigação em células estaminais embrionárias. Por outro lado, a eleição de um Executivo mais liberal demonstrou libertar-se com maior facilidade de conceitos antigos e embarcar numa aventura que poderá metamorfosear a própria Humanidade.
Mas, apesar da linearidade dos exemplos referidos, verificam-se efectivamente posições conservadoras e progressistas em ambos os campos ideológicos da direita e da esquerda, no que respeita à investigação em células estaminais embrionárias. Assim, será razoável supor-se que estas matérias venham a ser resolvidas num amplo consenso político e social, tendo em conta a magnitude das implicações suscitadas pelo avanço das novas biotecnologias, especificamente no campo das células estaminais embrionárias? E que reflexos pode tudo isto vir a ter nas ideologias políticas de amanhã?
O trabalho aqui apresentado não pretende dar respostas absolutas a estas questões, mas ser um contributo no âmbito da Ciência Política para o enquadramento e para uma melhor compreensão da problemática das novas biotecnologias, em geral, e das células estaminais embrionárias, em particular, nas sociedades pós-modernas."