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O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

Uma questão de (des)alinhamento...

Alexandre Guerra, 31.07.09

 

José Pacheco Pereira referiu esta Quinta-feira à noite na Quadratura do Círculo que mesmo que fosse convidado nunca participaria num encontro de bloggers com o primeiro-ministro, José Sócrates. Das suas palavras, depreende-se que quem tenha aceite tal convite estava de certa forma a alinhar num registo conivente com o poder e a perder a sua independência intelectual e crítica face à governação.

 

Pacheco Pereira viu ainda naquele encontro um momento encenado, fruto do deslumbre que Sócrates tem pelas novas tecnologias e da “obamania” aguda que lhe perpassa a alma.

 
Ou seja, na perspectiva do autor do Abrupto, os bloggers presentes não foram mais do que meros figurantes de um filme orientado por Sócrates, cujo argumento foi também de sua autoria. E para Pacheco Pereira esta situação fere de morte o conceito original da blogosfera, que se quer irrelevante, independente e crítica.
 
Ora, aqui surge o primeiro erro de Pacheco Pereira, já que a grande virtude da blogosfera é precisamente a liberdade que cada blogger tem para ser ou fazer o que bem entender (com respeito pelo próximo, claro está).  Assim, a riqueza da blogosfera tanto reside naqueles que são alinhados como naqueles que são desalinhados com Sócrates.
 
Por isso, no contexto específico, o comentário de Pacheco Pereira poderá ser injusto para alguns dos bloggers presentes, que diariamente (e longe de terem o potencial comunicativo e a “antena” de Pacheco) vão tentando denunciar e desmontar aquilo que na sua óptica vai correndo mal nesta governação.
 
É muito possível que alguns bloggers tenham visto neste encontro uma possibilidade única de comunicar e de confrontar directamente o primeiro-ministro com algumas questões, que de outro modo nunca poderiam ver respondidas.
 
Além disso, os bloggers ao aproveitarem a possibilidade de se sentarem junto do “inimigo” poderão estar a reflectir uma estratégia inteligente, de modo a enriquecerem o seu conhecimento em relação a Sócrates.
 
Sobre este assunto poderá ser útil recuperar o pensamento de um dos heróis do conservadorismo político, que jamais cedeu nos seus princípios, apesar de se ter sentado literalmente com alguns dos seus rivais, em que dizia que o importante era manter os inimigos bem perto de si para perceber a forma como se moviam, como pensavam ou como actuavam.
 
Perante isto, pode-se afirmar que a independência intelectual não se perde tal e qual uma “contaminação viral” se tratasse. Da mesma maneira que os valores éticos e morais não se abalam com o factor de proximidade.
 
Ora, estas considerações acima enunciadas não foram tidas em conta por Pacheco Pereiro aquando do seu comentário sobre o encontro dos bloggers com Sócrates.
 
Pacheco Pereira até poderia estar coberto de razão ao referir que todos os bloggers presentes estão alinhados com o primeiro-ministro (o que não é verdade), mas deveria ter contemplado um princípio fundamental na sua análise: a blogosfera tem de tudo e é por isso perfeitamente aceitável que um qualquer encontro de bloggers reúna as mais variadas tendências.
 
Aliás, a história da comunicação política dos últimos anos tem dado alguns exemplos deste tipo de momentos “encenados”, muitos dos quais vindos dos Estados Unidos, nos quais alguns políticos foram confrontados com questões muito sensíveis e, por vezes, incómodas colocadas por uma audiência supostamente “coreografada” e “alinhada”.

 

Um silêncio raro no historial das presidências americanas

Alexandre Guerra, 29.07.09

 

                                                                                      Shout/NYT

 

O Presidente Barack Obama falou aos "árabes, aos muçulmanos, aos iranianos, aos europeus ocidentais, aos europeus de leste, aos russos, aos africanos", mas ainda não falou "directamente aos israelitas". Esta observação foi feita por Aluf Benin, editor do Haaretz, em artigo de opinião no New York Times.

 

Efectivamente, volvidos seis meses após a chegada à Casa Branca, e ao contrário dos seus antecessores, Obama não tem demonstrado um grande entusiasmo para com o aliado histórico, Israel.

 

Se já antes da sua eleição Obama não seria certamente uma opção a seguir por alguns sectores israelitas quando comparado com o seu rival republicano John McCain, certamente que agora muitos mais na sociedade hebraica aumentaram o seu descontentamento em relação ao Presidente americano. 

 

Benin fala mesmo num ambiente de desconfiança dos israelitas em relação a Obama, o que poderá não ser um bom sinal para um Presidente que disse ter como prioridade para a sua política externa a resolução do conflito israelo-palestiniano.

 

Seja qual for a estratégia a seguir por Washington, Obama terá obrigatoriamente de "envolver" os israelitas e cativar a sua confiança. Ao "conquistar" a opinião pública hebraica, o Presidente americano terá ao seu dispor uma "arma" diplomática eficaz para pressionar o Governo de Israel a tomar decisões orientadas sob a vontade de Washington. 

 

Porém, Obama tem estado distanciado de Israel, contrariando um alinhamento histórico dos sucessivos Executivos americanos. Uma ideia que está a ser percepcionada pelos israelitas, tal como Benin referiu no seu artigo ao citar uma sondagem do Jerusalem Post, na qual se consta que apenas 6 por cento dos israelitas considera Obama pró-israelita. Cerca de 50 por cento dos israelitas acha que o Presidente americano é mais favorável aos palestinianos do que aos judeus.

 

Esta é uma realidade nova e particularmente interessante no historial das presidências norte-americanas, sobretudo quando se está a falar em apenas seis meses de mandato. Porque, a verdade é que os líderes americanos têm sido céleres em enviar sinais de confiança a Israel mal são eleitos.

 

Obama parece estar a seguir um caminho diferente, embora não se sabendo qual os passos que irá tomar no futuro. Seja como for, são cada vez mais os sectores da sociedade israelita que vão conotando Obama com uma linha mais pró-palestiniana e até pró-muçulmana. Exemplo disso é a própria posição de Benin, editor do Haaretz, um jornal da esquerda israelita, e que naturalmente estaria mais próximo de Obama, mas que agora se assume muito mais crítico com o Presidente americano

 

Ao mesmo tempo, o actual primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, vai ganhando apoio nas suas políticas internas, nomeadamente ao nível da construção e da expansão de colonatos.

 

O "silêncio" do Presidente Barack Obama em relação a Israel poderá ser fruto de uma estratégia definida em Washington com fins concretos para conseguir uma maior aproximação à "rua" árabe, e com isto dissipar a imagem negativa fomentada durante oito anos pela administração liderada por George W. Bush.

 

Porém, tal estratégia acarreta um perigo para as relações entre os Estados Unidos e Israel, uma vez que a desconfiança que se começa a instalar na sociedade hebraica poderá minar uma "ponte" construída há décadas.

 

Benin admite que Obama até poderá estar verdadeiramente comprometido com a segurança de Israel a longo prazo e que a única forma de alcançá-la seja através da conquista da "rua" árabe, mas se for esse o caso, então que o Presidente americano o diga aos israelitas.

 

Leituras

Alexandre Guerra, 27.07.09

 

A análise do Euobserver já tem alguns dias, mas nem por isso deixa de ser relevante. Em Potentially powerful: The European Defence Agency at five years, Frank Slijper, investigador em Campagne tegen Wapenhandel e membro do Transnational Institute (TNI), escreve sobre a Agência Europeia de Defesa, que este mês assinala o seu 5º aniversário.

 

O segredo da Índia em tempo de crise

Alexandre Guerra, 25.07.09

 

Indianos a circular nas ruas de Bangalore

 

Do muito que se tem escrito sobre a actual crise internacional e das suas repercussões nos vários países, este autor leu recentemente uma análise bastante interessante na Newsweek a propósito do papel da Índia na actual conjuntura.
 
O texto é assinado por Arvind Subramanian, senior fellow do Peterson Institute for International Economics, e começa por fazer um enquadramento político na Índia, salientando a recente vitória do histórico Partido do Congresso nas eleições legislativas de Maio.
 
Subramanian observa que a Índia tem resistido à turbulência financeira e económica melhor do que outros países, nomeadamente do bloco BRIC, em particular a China. Tal deve-se ao facto da Índia nunca ter-se deslumbrado pelos mecanismos e modelos económicos e financeiros que tanto atraíram investidores em países como os Estados Unidos, a Inglaterra, a Alemanha, o Japão ou a China.
 
Não obstante, a Índia cresceu nos últimos cincos anos quase a uma média de 9 por cento ao ano, mas, segundo aquele investigador, sem correr os riscos que os Estados Unidos correram na área do “finance”, com a exposição aos produtos de alto risco, ou a sujeitar-se às fragilidades do mercado internacional como a China o fez no sector do “trade”, nomeadamente através da forte dependência nas exportações. Como refere Subramanian, a actual crise poderia ter acabado com o sonho indiano, mas não acabou.
 
A Índia evitou enquadrar o seu modelo de crescimento exclusivamente em estratégias extremas, fosse através de mecanismos financeiros complexos e altamente dependentes dos canais internacionais, fosse através de políticas económicas unicamente assentes nas exportações.
 
Segundo Subramanian, o segredo para a relativa estabilidade da Índia nos dias que correm deve-se em grande parte ao desempenho do primeiro-ministro, Manmohan Singh, nos últimos cinco anos, e agora reeleito.
 
Da religião sikh e nascido na zona ocidental do Punjab, Singh foi funcionário do Fundo Monetário Internacional (FMI) e governador do Banco Central da Índia. A sua formação académica é de Oxford e de Cambridge. Com este passado percebe-se facilmente que Singh, além de dominar a teoria da economia internacional e dos mercados financeiros, tem igualmente uma experiência que certamente lhe está a ajudar na condução dos desígnios da maior democracia do mundo.
 
A verdade é que Índia vive hoje uma situação que lhe permite ter alguma folga nos cofres do Estado, assim como na capacidade de financiamento empresarial, tendo conseguido manter elevadas reservas em dólares.
 
Mesmo ao nível das exportações, a Índia não está a ser tão afectada como, por exemplo, os Estados Unidos ou a China. As exportações na Índia nunca contaram mais de 20 por cento da sua economia, contrastando com os 45 por cento da China. É certo que em tempos de bonança, este país acaba por beneficiar bastante mais que a Índia, mas no actual cenário de contracção, a vantagem está do lado da nação indiana.
 
Subramanian acredita que esta situação resulta de uma estratégia consciente de Singh. A quase maioria absoluta do Partido do Congresso obtida nas eleições legislativas de Maio pode ser o reconhecimento, por parte do povo, dessa mesma estratégia, ou seja: “(…) India never enjoyed the kind of benefits – such as greater efficiency and productivity leading to even higher growth – that big-bang reforms can deliver. But it did have the huge advantage of ensuring stability when conditions got rough."
 
Em jeito de metáfora, Subramanian acaba o seu texto a comparar a Índia ao “revolucionário” Nano, um automóvel de 2000 dólares, modesto e longe de ser “fancy”, mas um caso de sucesso.

 

Leituras

Alexandre Guerra, 23.07.09

 

No seguimento do encontro de Quarta-feira entre o primeiro-ministro iraquiano, Nouri al-Maliki, e o Presidente americano Barack Obama, Greg Bruno do Council on Foreign Relations escreveu The Next Chapter in Iraq, no qual analisa a actual conjuntura do Iraque e as respectivas implicações para Washington. São ainda disponibilizados diversos "links" para informação de enquadramento bastante útil sobre a questão iraquiana, tal como o Iraqi Report 14 - Balancing Maliki da autoria do Institute for the Study of War.

 

Israel ordena as suas embaixadas a usar foto como "arma" de "public relations"

Alexandre Guerra, 22.07.09
 
As “public relations”, quando utilizadas ao serviço de um qualquer Estado, podem transformar-se num importante instrumento de “soft power”, visando os mais variados interesses e objectivos políticos. Por vezes, os governantes assumem frontalmente a sua estratégia, sobretudo quando estão perante um tema consensual no seio da sua opinião pública. Os “desígnios nacionais” são normalmente objecto de campanhas de comunicação e de “public relations” por parte do Estado, sempre na defesa dos interesses de um país.
 
Husseini e Hitler reunidos em Berlim, 1941
 
Por exemplo, tal aconteceu com a causa de Timor Leste, em que o Governo português, em nome de um desígnio nacional, accionou uma campanha de “public relations” (e também “public affairs”) sem precedentes, conseguindo transformá-la em “soft power”, utilizando-o posteriormente com mestria nos corredores diplomáticos. A estratégia delineada pelo Governo português acabaria por conduzir ao processo de independência daquela pequena nação.
 
Resumindo, os Estados recorrem às “public relations” para defender os seus interesses, sejam eles virtuosos ou perversos, transparentes ou obscuros.
 
É nesta última categoria de interesses que se pode interpretar a mais recente directiva do Ministério dos Negócios Estrangeiros israelita, ao ter ordenado aos departamentos de comunicação das suas embaixadas em todo o mundo para utilizarem nas suas iniciativas de “public relations”, sempre que puderem, uma polémica e constrangedora fotografia para o povo palestiniano.
 
Na imagem, vê-se um encontro entre o Grande Mufti de Jerusalém, Amin al-Husseini e o líder do regime nazi, Adolf Hitler, na cidade de Berlim em 1941. Embora a relação diplomática na altura da II GM entre a cúpula palestiniana e o regime nazi seja uma evidência histórica, a verdade é que tal associação continua a ser um tema sensível para os palestinianos.
 
Percebendo o quão incomodativo pode ser esta imagem para os palestinianos, foi o próprio chefe da diplomacia hebraica, o ultranacionalista Avigdor Lieberman, que deu indicações para todas as embaixadas israelitas utilizarem a foto o mais que puderem em todos os momentos de comunicação.  

 

Leituras

Alexandre Guerra, 21.07.09

 

Excelente reportagem publicada ontem no Los Angeles Times sobre os esforços de Washington no combate à produção de ópio e respectivo tráfico no Afeganistão. Em US increasing counter-narcotics efforts in Afghanistan pode ler-se que os Estados Unidos vão reforçar a sua presença em território afegão com 12 agentes da DEA, a agência federal norte-americana especializada no combate ao narcotráfico.

 

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