Num artigo do The Washington Post, assinado por Howard Kutz, e reproduzido hoje no Público, o autor destas linhas ficou a saber que Leonard Downie Jr. anunciou no passado dia 23 que vai abandonar o cargo de director-executivo daquele jornal norte-americano.
Aos 66 anos, e ao fim de 17 naquelas funções, Leonard Downie Jr. demonstrou inteligência e clarividência suficientes para perceber que a sua hora tinha chegado, depois de ter conseguido conduzir com muito sucesso os desígnios do The Washington Post nos conturbados tempos de adaptação às novas formas de comunicação.
Talento e mérito foi a fórmula encontrada por Leonard Downie Jr. para tornar o seu jornal numa leitura diária obrigatória em todo o mundo através da plataforma digital. Recentemente, começou também a ser possível comprar a versão em papel em Portugal, visto que o jornal está a ser impresso em Lisboa.
"Contratamos pessoas mais espertas e mais talentosas do que nós e deixamo-las fazer o seu trabalho da melhor maneira que sabem", foi desta forma que Leonard Downie Jr sintetizou o seu modelo de gestão do The Washington Post ao longo de quase duas décadas.
Em Portugal, infelizmente, há muito que o talento e o mérito são variáveis ausentes nas contratações de novos jornalistas, sendo também praticamente inexistente essa "liberdade de trabalhar" de que Leonard fala.
Ao contrário de jornalitas como Leonard Downie Jr, as chefias dos jornais portugueses revelam pouca sensibilidade para a notícia e raramente têm critérios editoriais justos. Além destas características, Leonard Downie Jr tinha ainda uma outra muito importante no jornalismo e na vida: exerceu sempre a sua profissão com honestidade.
Não é por isso de estranhar que os jornais nacionais, sobretudo os de referência, estejam num estado pouco saudável, sem identidade, com pouca qualidade e vendas vergonhosas, mesmo para um país como Portugal onde os hábitos de leitura não abundam.
Exemplos como o de Leonard Downie Jr. há muitos anos que deixaram de existir em Portugal, e basta para isso observar o percurso de jornais como o Diário de Notícias ou o Público. O primeiro passou em poucos anos de uma "instituição" para mais um jornal sem identidade, enquanto que o segundo vai-se afundando perante a arrogância e interesses de uma direcção que pouco ou nada tem para oferecer ao jornalismo.
Actualmente, os principais jornais nacionais de referência têm chefias fracas, sem visão estratégica, estando a falhar claramente na sua missão de adaptar as suas publicações aos novos paradigmas da sociedade em geral e da comunicação em particular. Alexandre Guerra
As aparentes boas intenções do regime de Pyongyang em relação ao seu programa nuclear estão a ser recebidas com bastante cautela por parte de Washington. A secretária de Estado norte-americana, Condoleezza Rice, revelou que o documento entregue na Quinta-feira pela Coreia do Norte é escasso em informações, porque limita-se apenas a constatar aquilo que já todos sabiam, de que Pyongyang tinha um programa para produzir plutónio.
A declaração não revela qualquer informação sobre o actual estado do programa nuclear nem sobre os depósitos de plutónio ou de urânio enriquecido. Mais importante ainda, o documento não faz qualquer menção ao eventual stock de material bélico nuclear. Por isso, também o Presidente George W. Bush demonstrou prudência face aos intentos de Pyongyang.
Num outro gesto de aparente conciliação, a Coreia do Norte implodiu a torre de arrefecimento da central nuclear de Yongbyon, fazendo dessa iniciativa um espectáculo para as televisões com um objectivo claramente propagandístico, mas cujos benefícios práticos são praticamente nulos, porque aquela estrutura já estava desactivada. Uma opinião partilhada por John Wolfsthal, investigador no Center for Strategic and International Studies, em Washington, que considera tratar-se de um gesto meramente simbólico
Alguns analistas referem que o regime de Pyongyang está numa lógica de sobreviviência, optando por ir ganhando tempo com iniciativas algo inócuas. Para já, parece estar a dar resultado, tendo a Casa Branca anunciado que pretende retirar a Coreia do Nore da lista dos Estados que apoiam o terrorismo, o que permitirá o levantamente de uma série de restrições económicas e diplomáticas. Alexandre Guerra
Por várias vezes escreveu-se aqui sobre a Somália, textos sobre um "estado falhado" que teima em viver na anarquia e no caos. Finalmente, e após vários anos a "fazer" por chegar ao topo da tabela, a Somália foi considerada no 2008 Failed States Index, elaborado pela revista Foreign Policy e pelo Fund for Peace, o Estado mais instável do mundo.
Apesar de o relatório se referir à Somália como o país que corre o maior risco de se tornar um "failed State", o documento sublinha o que é óbvio para os observadores mais atentos: a Somália é já um Estado falhado a vários níveis.
O início do relatório começa com uma breve descrição da actual conjuntura que se vive na Somália e que o Diplomata reproduz: "When troops opened fire in the streets of Mogadishu in early May, it was a tragically familiar scene in war-torn Somalia. Except on this day, soldiers weren’t fighting Islamist militias or warlords. They were combating a mob of tens of thousands rioting over soaring food prices."AG
No seguimento das tréguas na Faixa de Gaza anunciadas por Israel e pelo Hamas, resultantes dos esforços diplomáticos do Egipto, o Diplomata escreveu aqui, há sensivelmente uma semana, que aquele cessar-fogo não deveria ser levado muito a sério. Sem grande surpresa, verificou-se esta Terça-feira o primeiro revés, com um ataque de "rocket" contra a cidade judaica de Sderot, junto da fronteira no norte da Faixa de Gaza,
Israel disse tratar-se de uma violação do acordo celebrado há uns dias, já que o Governo hebraico responsabilizará o Hamas por todos os ataques vindos da Faixa de Gaza, independentemente do grupo responsável. Apesar do ataque ter sido perpetrado pela Jihad Islâmica, que não subscreveu as tréguas, o Governo israelita disse que poderia repor as sanções económicas na Faixa de Gaza.
Seja como for, o mais certo é que o acordo celebrado entre Israel e o Hamas se mantenha ainda durante algum tempo mas, como este ataque veio demonstrar, dificilmente o mesmo se manterá incólume nos próximos meses. O primeiro-ministro, Ehud Olmert, e o ministro da Defesa, Ehud Barak, informaram que Israel vai responder a todos os ataques de "Qassams". AG
Quando há poucas semanas José Carlos Meirelles, especialista da agência federal de protecção aos povos indígenas do Brasil (FUNAI), divulgou fotografias de uma tribo ancestral supostamente desconhecida, localizada algures na floresta da Amazónia, junto da fronteira com o Perú, não estava a dizer toda a verdade. Porque, tal como veio a admitir, aquela tribo já era conhecida desde 1910, tendo Meirelles durante três dias sobrevoado parte da floresta amazónica com o objectivo de encontrá-la e fotografá-la.
Após inúmeros esforços e quase que por acaso acabou por encontrar a tribo, com o objectivo de provar ao mundo e, em particular, a pessoas como o Presidente do Perú que ainda existem naquela região do planeta pessoas completamente isoladas do mundo moderno. Recentemente, Alan García disse que indígenas isolados eram uma criação da imaginação dos grupos ambientalistas e dos antropólogos.
Perante isto, Meirelles acabou por admitir que o seu gesto teve um cariz político, de modo a sensibilizar os líderes a tomarem medidas para que se protejam estas tribos, sobretudo na região da Amazónia. A decisão do investigador da FUNAI não deixa de ser controversa, já que expôs mediaticamente aquela tribo. Mas, por outro lado, já obrigou o Perú a tomar medidas relativas à região fronteiriça amazónica.
Actualmente, sabe-se que existem algumas tribos espalhadas pelo mundo que mantêm hábitos quotidianos ancestrais, "desligadas do mundo exterior", no entanto, estão cada vez mais sujeitas a vários tipo de pressões, tais como a exploração petrolífera e imobiliária, a desflorestação ou o turismo. Alexandre Guerra
O secretário-geral da Agência Internacional de Energia Atómica (IAEA), Mahmoud El Baradei, demitir-se-á das suas funções se Israel decidir atacar as instalações "suspeitas" iranianas. Numa altura em que as forças de segurança israelitas (IDF) poderão estar a preparar uma eventual operação militar e em que se ouvem ameaças de novas sanções por parte dos Estados Unidos e da Europa, o extenso dossier que a IAEA disponibiliza sobre o Irão permite um enquadramento bastante completo deste tema.
O autor deste espaço começou, a partir deste mês, a assinar uma coluna de comentário sobre assuntos internacionais na revista CAIS. Reproduz-se abaixo o primeiro texto referente à edição de Junho:
Ocidente e China: dois olhares inconciliáveis sobre o Tibete
Alexandre Guerra
O Tibete foi um tema praticamente ausente das agendas internacionais desde que a China clamou para si aquele território, em 1950. Quando, um ano mais tarde, Mao Zedong propôs um acordo de autonomia às autoridades tibetanas, no qual estaria consagrado o respeito total pela religião budista, Pequim estava a ceifar potenciais ímpetos de independência. Mas, nessa altura, a China era apenas um actor menor num tabuleiro onde os Estados Unidos e a União Soviética dominavam, estando o Tibete longe de ser estratégico para qualquer destas partes.
Num primeiro momento, o Dalai Lama procurou, infrutiferamente, negociar, acabando em 1959 por eclodir a revolta tibetana, prontamente esmagada por Pequim (fala-se em milhares de mortos). O Dalai Lama foi obrigado a abandonar o Tibete. A partir desta altura, a situação foi-se deteriorando, sem que se ouvissem quaisquer vozes internacionais de protesto.
Politicamente, foi só em 1989 que surgiu o primeiro gesto relevante por parte da comunidade internacional, com a atribuição do Prémio Nobel da Paz a Dalai Lama. Porém, o processo negocial pouco avançou e os esforços de “abertura” feitos pela China serviram mais os interesses de Pequim do que os dos próprios tibetanos.
Para os seus seguidores, o Dalai Lama personifica o que de mais puro e genuíno se encontra na religião e tradição budistas, sendo visto como um autêntico deus vivo na Terra. Perante a asfixia chinesa, os tibetanos foram também depositando nele os seus anseios políticos.
O mundo acordou agora de repente para a questão tibetana, mas apesar dos recentes esforços diplomáticos, o principal problema persiste: a forma inconciliável de como o Ocidente e a China olham para o Tibete.
Kenneth G. Lieberthal, professor na Universidade de Michigan, refere que a visão que o Ocidente tem do Tibete está moldada por uma noção romântica de Shangri La, enquanto que Pequim olha para aquele território como uma realidade feudal, supersticiosa e perversamente ansiosa pela modernização[1].
É por isso que para o proeminente historiador Paul Kagan, as manifestações dos monges budistas em Março foram interpretadas por Pequim como um desafio ao seu poder autoritário, tal como já tinha acontecido em 1989, com os estudantes da Praça de Tiananmen, ou com os activistas das Falun Gong há alguns anos[2]. Pelo contrário, o Ocidente viu estas situações como formas de expressão legítimas.
[1]Jayshree Bajoria, “Nationalism in China ” in www.cfr.org (23 de Abril 2008)
[2]Paul Krugman, The Washington Post, “Behind the ‘Modern’ China ” (23 de Março de 2008)
O Presidente George W. Bush pediu esta Quarta-feira ao Congresso que revogue a legislação federal que impede a exploração offshore de petróleo em águas territoriais dos Estados Unidos. Apelou ainda àquela câmara que aprove um decreto que permita a disponibilização de uma parte do território do Arctic National Wildlife Refuge, no Alaska, para produção de ouro negro.
Estas medidas, segundo Bush, são necessárias para o bem estar do povo americano tendo em conta a escassez de petróleo e o consequente aumento do preço do barril daquele recurso.
Seja como for, o Diplomata não apresenta aqui este assunto para analisar a política de George W. Bush, até porque aquela já não traz nada de novo, mas sim para explanar as tendências políticas de um dos potenciais Presidentes da América, John McCain.
Porque na verdade o que Bush disse hoje não é mais do que aquilo que McCain proferiu ontem, em Huston, surpreendendo muitos dos seus apoiantes, nomeadamente alguns grupos ambientalistas que viam nele um aliado no campo republicano.
Com esta posição, McCain tomou claramente a decisão de se "colar" ao campo do sector energético, de tal forma que a própria Reuters referia que era o Presidente Bush que apoiava a medida de McCain e não o inverso.
O problema é que McCain com este anúncio expôs-se politicamente como não tinha ainda acontecido durante esta campanha. Por exemplo, na ressaca do discurso de McCain, o Financial Times trazia hoje na sua versão impressa um artigo bastante negativo para o candidato republicano, relembrando que este tinha sido um dos grandes apoiantes da proibição da exploração offshore, assim como um dos grandes defensores da preservação do Arctic National Wildlife Refuge.
Ora, esta nova visão de McCain poderá ser interpretada pelo eleitorado como uma estratégia meramente eleitoralista. Pelos democratas será certamente, como o fez o senador Harry Reid, do estado do Nevada e líder dos democratas no Senado, que acusou McCain de estar a ser cínico ao querer demonstrar aos americanos que tem uma solução para baixar o preço do petróleo.
Estas acusações podem ter uma base de verdade, porque embora as sondagens mais recentes indiquem que a maioria dos americanos tem mais confiança nos democratas para lidar com as questões ambientais, também é verdade que dois terços dos americanos estão a favor da exploração offshore de petróleo. Como referia a Reuters, "existe aqui terreno para os republicanos explorarem" em termos eleitorais. E é isso mesmo o que McCain está a fazer... Alexandre Guerra
Fontes palestinianas anunciaram hoje que Israel e o Hamas celebraram umas tréguas de seis meses, num acordo patrocinado pelo Egipto. Esta notícia já foi confirmada por Mahmoud al-Zahar, o líder do Hamas na Faixa de Gaza, no entanto, para aqueles que conhecem minimamente a realidade daquela região do globo e que têm estado atentos ao processo negocial israelo-palestiniano nos últimos sabem que este acordo não deve ser levado muito a sério.
Ou seja, não se devem criar grandes expectativas sobre esta iniciativa porque, à semelhança de muitas outras, o mais certo é estar condenada ao fracasso. É provável que nos primeiros tempos se assista a uma melhoria na condição de vida dos habitantes da Faixa de Gaza, que desde Junho de 2007 vivem sob a liderança do Hamas e, consequentemente, sob o cerco intenso das forças de segurança israelitas (IDF).
Este acordo está longe de ser a base de algo estrutural que apazigue o conflito israelo-palestiniano, tratando-se antes de mais um arranjo diplomático promovido por "terceiros". O próprio Ehud Barak, ministro da Defesa israelita, e um "falcão" nestas questões, já fez saber que ainda é muito cedo para se anunciar o quer que seja.
Não sendo um político virtuoso, Barak sabe bem do que fala, pois já viu este "filme" repetir-se vezes de mais. Aliás, já esta noite Barak proferiu uma frase reveladora das suas expectativas: "This evening, the possibility of reaching a calm is being examined. It is still early to declare it, and it is difficult to determine how long it will last." Como esta frase revela, no processo negocial israelo-palestiniano o problema não tem sido a inexistência de acordos ou documentos escritos, mas sim a sua concretização no terreno. Alexandre Guerra
No dia em que preço do barril de petróleo quase chegou aos 140 dólares em Nova Iorque, o Diplomata sugere o completo artigo China, Africa and Oil de Stephanie Hanson, editora do prestigiado Council on Foreign Relations.
Em tempos politicamente conturbados que se vivem na Europa comunitária, a analogia que Jens-Peter Bonde faz entre um jogo do Euro2008 e o referendo na Irlanda é bastante interessante e divertida. What Next, Europe?, publicado no Euobserver, analisa com bastante acutilância o actual momento.
Relembre-se que Jens-Peter Bonde é presidente dos Democratas da União Europeia (EUD) e antigo deputado do Parlamento Europeu, além de ter sido um dos membros da Convenção que redigiu a versão da defunta Constituição.