Nos últimos dias, "opinion makers" e analistas parecem ter "descoberto" a face espectáulo de Santana Lopes e, admirados pela pobreza do debate sobre o Orçamento de Estado e pela fraca prestação do líder da bancada parlamentar do PSD, debitaram as suas ideias, assinando, mais uma vez, o óbito do "enfant terrible" da política portuguesa. Afinal, o grande confronto anunciado entre Santana e o primeiro-ministro José Sócrates fora um "flop".
O que é interessante nesta história é constatar-se que "opinion makers" e analistas não anteciparam os seus escritos ao debate parlamentar, apesar de agora todos afirmarem que já se antevia e era previsível o desfecho daquele confronto. Esperaram por uma situação mais "confortável" e toca a debitar o óbvio.
A nossa praça está cheia de "doutos" analistas e "opinion makers" que "sabem tudo" à posteriori do acontecimento, seja ele qual for, mas curiosamente nunca escrevem à priori. O factor risco é praticamente inexistente ao contrário do que acontece na tradição anglo-saxónica que, por vezes, acaba mesmo por exagerar na forma leviana como prevê acontecimentos ou analisa cenários.
Seja como for, só no Público de hoje, são três os "opinion makers" e analistas que, apesar de "saberem tudo" o que se ia passar no debate, só escreveram depois do acontecimento: José Manuel Fernandes, São José Almeida e Eduardo Cintra Torres.
É inegável que se torna mais fácil escrever textos "intelectuais" e "sabedores" depois dos factos estarem consumados e serem de interpretação óbvia até para o mais comum cidadão.
Ora, uma das funções dos analistas, mas também dos "opinion makers", é que se antecipem aos acontecimentos e que "preparem" os leitores/cidadãos para os fenómenos políticos ou de outra natureza. Isto não invalida que depois do acontecimento se proceda a um exercício de reflexão e se compare o que foi escrito antes e depois. Este é um método seguido por analistas e "opinion makers" dignos desse nome.
Voltando a Santana Lopes e ao debate sobre o Orçamento de Estado, a verdade é que é o trabalho estava facilitado para os analistas e "opinion makers", mesmo para os menos virtuosos. Mas mesmo assim ninguém escreveu qualquer texto antes de terça-feira a demonstrar por "a+b" que Santana se ia "espalhar ao comprido" na Assembleia.
E que "a+b" seria esse?
Santana Lopes deu sempre uma dimensão dramática ao seu discurso, na medida em que para ele a política é um espectáculo e não uma arte de governar. Espectáculo que dura há já quase 30 anos, com todos os ingredientes pelo meio, onde nem a comédia faltou durante os meses que liderou os desígnios de Portugal.
Com altos e baixos, a verdade é que Santana Lopes se tem mantido em cena durante todo este período, sendo inclusive um dos políticos mais activos das últimas três décadas. Mas, para o espectáculo ter corrido tão bem, Santana Lopes foi sempre utilizando diferentes "cenários" (lides partidárias, secretarias de Estado, Câmaras, Governo, deputado), novos "guiões" e diversos "realizadores" (Sá Carneiro, Cavaco Silva, Durão Barroso).
Ao longo dos anos, Santana Lopes tem tido ao seu dispor uma máquina gigantesca para montar um espectáculo convicente junto dos eleitores e das bases do seu partido, o que lhe tem permitido manter-se em cena.
E, apesar das várias retiradas e dos constantes regressos ao "palco", Santana evitou sempre voltar ao mesmo espectáculo. Das duas vezes em que isso aconteceu, Santana deu-se mal: quando reassumiu a presidência da Câmara de Lisboa, em 2005, e agora quando pretendeu reeditar um duelo com José Sócrates.
Como indiciam os resultados daquele que será talvez o melhor modelo de análise do mundo em termos de espectáculo, havia uma elevada possibilidade de fracasso do espectáculo de Santana Lopes na Assembleia, porque, como Hollywood tem ensinado, as sequelas raramente correspondem às expectativas criadas depois do filme de estreia. Alexandre Guerra