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O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

Manuel Castells na Gulbenkian

Alexandre Guerra, 16.02.07

"A estrutura social da Era da Informação está ligada em rede através das tecnologias." Foi desta forma que o reputado sociológo catalão, Manuel Castells, iniciou uma conferência realizada esta manhã na Fundação Calouste Gulbenkian, por ocasião do lançamento de A Sociedade de Informação e o Estado Providência: O modelo finlandês, o mais recente livro daquele autor publicado em Portugal e que se junta à já clássica trilogia A Era da Informação: Economia, Sociedade e Cultura e ao posterior e menos interessante Galáxia Internet. O Diplomata esteve presente.


Castells, tido como um dos "gurus" da sociologia na área de estudo das novas tecnologias, centrou parte da sua apresentação na questão da universalidade da rede e do impacto da mesma no modelo de organização de sociedade. Este, aliás, é um tema que o autor já escalpelizou com pormenor na sua trilogia, sendo que sobre esta matéria Castells não tenha avançado muita coisa nova. Porém, não deixa de ser particularmente interessante constatar a forma científica como o professor da Universidade da Califórnia expõe as suas ideias. 


O pensamento de Castells assenta em dois princípios basilares, como o próprio afirmou: "O processo de informação passou a estar na base da organização de sociedade" e "a sociedade em rede difunde-se à escala global. Por definição, a rede é universal." Partindo deste patamar, e aqui talvez esteja uma evolução mais consistente no seu pensamento face à trilogia (datada nos anos 90), Castells não tem dúvidas de que nos dias de hoje já não existem muitas pessoas fora da rede. E deu o exemplo de várias pessoas em África utilizarem o mesmo telefone, tornado-se, assim, parte integrante da rede.   


Apesar de não ser a única, a Internet surge como a principal tecnologia dessa rede global. As suas características permitem que sejam os próprios utilizadores a moldarem-na aos seus interesses. É por isso que Castells disse que "a Internet está condicionada ao enquadramento sociológico". Muitas das vezes, as pessoas criam utilizações que não foram previstas pelos programadores. 


Castells afirma que a Internet tornou-se um "espaço social de interacção, de liberdade, de organização de espaços livres". Actualmente, a tendência é a "autocomunicação em massa", um conceito novo na obra de Castells e que é consubstanciada com fenómenos como o You Tube. Ou seja, "nós próprios, podemos transmitir para milhões". 


A Nova Economia e o modelo finlandês


Quando a partir dos anos 90, "a Internet e outros sistemas de comunicação passam a ser um elemento chave no sistema empresarial" assiste-se a "um salto histórico na produtividade", com as respectivas mudanças de paradigmas tecnológicos, organizacionais, etc. É aqui, de acordo com Castells, que nasce a Nova Economia, baseada nas novas tecnologias e nos novos modelos de gestão.


Silicon Valey passa a ser uma referência na Nova Economia, no entanto, desprovida de qualquer componente social ou intervenção sindical. Na Europa, pelo contrário, vislumbou-se um desafio. Porque se nos Estados Unidos a sociedade civil e negócios convivem sem uma terceira parte, nos países europeus é obrigatório incluir-se o sector público nessa equação.


Por isso, a grande problemática das sociedades europeias é a "interacção entre a Nova Economia e a protecção social". A Finlândia surge, deste modo, como o modelo que melhor consegue combinar essas duas realidades. "Entre 1998 e 2005, a Finlândia esteve sempre nos primeiros lugares dos índices de competitividade mas, concomitantemente, foi sempre desenvolvendo o sistema de protecção social. O que não acontece no modelo de Silicon Valey."


É curioso constatar que 90 por cento dos trabalhadores finlandeses estão sindicalizados, porém, naquele país os sindicados não funcionam como força de bloqueio à produtividade. "Em Silicon Valey, por dogma, não há sindicatos."


Para Castells, o segredo reside na modernização do sector público. É vital o aproveitamento do sistema da rede de Internet e das novas tecnologias. O E-Governance, o E-Health e o E-Learning são precisamente conceitos que devem ser materializados nas sociedades europeias. "Estes três vectores são necessários para a transformação do sector público." Aliás, relembrou Castells, a Agenda de Lisboa tentou precisamente definir modelos de gestão com base nessa ideia. Alexandre Guerra  

Leituras

Alexandre Guerra, 15.02.07

Ainda a propósito da decisão do Supremo Tribunal britânico, o Diplomata aconselha a leitura do comentário de John Vidal, Labour's Nuclear Disaster, no The Guardian


O acordo alcançado entre os EUA e a Coreia do Norte sobre o seu programa nuclear poderá ter implicações em Teerão. Kim Murphy explora essa relação no Los Angeles Times, num artigo intitulado Iran inspired by N.Korea nuclear deal?


Excelento artigo do proeminente académico Joseph S. Nye, que em El frágil poder de Rusia, publicado no El Pais, explica o princípio "pendular" do poder daquele Estado. 

Julgamento de Libby marca tendência na blogosfera

Alexandre Guerra, 15.02.07

Imagine-se um grupo de bloggers a trabalhar em equipa na cobertura, por exemplo, do julgamento de Fátima Felgueiras... Em tempo real, esses bloggers iriam dando conta do que se passaria na sala de tribunal, fornecendo, assim, um serviço bem mais eficiente e rápido do que os meios de comunicação tradicionais. 


A meses da próxima sessão do julgamento do caso "Saco Azul", esta é uma ideia que ainda pode ser posta em prática, sendo necessário, no entanto, assegurar uma fonte de rendimento para os custos de permanência no local. Caso haja algum blogger ou bloggers interessados, o Diplomata aconselha a visita ao Firedoglake.


Trata-se de um blog composto por seis pessoas que tem tido como função relatar exaustivamente o mediático julgamento de Lewis Libby Junior, antigo chefe de gabinente do vice-Presidente Dick Cheney. De acordo com o New York Times, os autores do Firedoglake são "bloggers liberais" e "fanáticos devotos" por este caso, que ficou conhecido por "Valeriegate". Têm vivido num apartamento em Washington e suportado os custos com donativos on line.  


Este projecto assumiu tanta importância principalmente por duas razões: A primeira, é que à semelhança do que acontece com o julgamento de Felgueiras, não é permitido gravar imagens ou áudio na sala de julgamento; A segunda razão, prende-se com o acompanhamento ininterrupto por parte dos bloggers do julgamento. O Firedoglake tornou-se, deste modo, uma fonte de informação para os próprios jornalistas.


Ainda de acordo com o jornal nova-iorquino, o Firedoglake marca uma nova tendência na blogosfera, por ter sido a primeira vez que foram atribuídas credenciais a bloggers independentes para fazer a cobertura de um julgamento federal.


Uma outra ideia interessante é o facto de já existir nos Estados Unidos uma associação nacional de blogs com vocação informativa. Bons exemplos para a blogosfera vindos do outro lado do Atlântico.   

Supremo Tribunal desafia política energética de Blair

Alexandre Guerra, 15.02.07

Apesar de um juiz do Supremo Tribunal britânico ter ordenado o Governo a rever a sua estratégia de investimento numa nova geração de centrais nucleares, o secretário da Indústria, Alistair Darling, já fez questão de afirmar que o Executivo irá manter a sua decisão, embora admita poder repensar alguns contornos da sua política energética.


Darling apresenta fundamentalmente dois argumentos para justificar o recurso ao nuclear: O primeiro, deve-se à alta procura de energia e à instabilidade dos mercados fornecedores, sobretudo de petróleo; O segundo argumento, prende-se com razões ambientais, uma vez que o tecnologia nuclear é substancialmente mais limpa do que outras fontes de energia.  


No entanto, a Greenpeace, organização que interpôs o processo nas instâncias judiciais, não se impressiona com estes argumentos e já exigiu ao Governo trabalhista que reveja a sua estratégia. 


A poucos meses de abandonar o Nº 10 de Downing Street, Tony Blair deverá envidar todos os esforços para assegurar a prossecução da sua política energética, que apresentou em Julho do ano passado com tanto empenho e convicção. Espera-se, assim, um debate aceso nos próximos tempos entre a Greenpaece e o Executivo britânico. Mais preocupações para Blair. AG


 

Dura crítica a Javier Solana

Alexandre Guerra, 15.02.07

Em comentário na edição de hoje do Público, Carlos Gaspar, presidente do Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI) e antigo assessor do ex-Presidente Jorge Sampaio, critica duramente a posição do sr. PESC por ter divulgado o "Documento de Reflexão" sobre o processo negocial com Irão aos ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia (UE).


Para Carlos Gaspar, a atitude de Javier Solana "foi um lapso calamitoso", sobretudo por coincidir com o anúncio feito em Pequim de um pré-acordo com a Coreia do Norte, fragilizando ainda mais a posição negocial europeia. Além do mais, Solana ao reconher o falhanço das iniciativas da troika da UE (Alemanha, França e Grã-Bretanha) estava a admitir o fracasso da diplomacia. 


Ora, se este instrumento de política externa parece estar a ser frutuoso na Ásia, ao contrário do que acontece no Médio Oriente, algo deverá ser objecto de reflexão. Deste modo, e não obstante as devidas diferenças entre a Coreia do Norte e o Irão, Carlos Gaspar identifica o problema na natureza dos parceiros negociais: "Qual a diferença entre a questão coreana e a iraniana? No primeiro caso, os EUA têm como parceiro a China, determinada a manter-se única grande potência nuclear da Ásia Oriental, enquanto no segundo, os aliados europeus dos EUA estão divididos perante a determinação do Irão em ser potência no nuclear no Médio Oriente."

O que ainda falta saber sobre a "rede global" da CIA

Alexandre Guerra, 14.02.07

O Parlamento Europeu aprovou, hoje, o relatório final da comissão de inquérito sobre os voos suspeitos da CIA em território europeu (382 votos a favor, 256 contra e 74 abstenções), nos quais, alegadamente, se fizeram transportar suspeitos de terrorismo para serem sujeitos a eventuais práticas ilegais de interrogatório.


Embora sendo claro ao identificar 1245 voos da CIA, alguns dos quais em desrespeito pelo Direito Internacional, a versão final do relatório está mais sauvizada relativamente aos "drafts" anteriores. De qualquer modo, as conclusões da comissão liderada pelo eurodeputado português Carlos Coelho evidenciam a falta de colaboração de alguns países europeus, dos quais se destacam Reino Unido, Portugal, Polónia, Áustria e Itália. O documento, que teve como relator o eurodeputado italiano Giovanni Fava, critica ainda o comportamento passivo das autoridades nacionais e dos respectivos serviços secretos face às actividades da CIA.


Mas, independentemente deste relatório, que é apenas uma versão mais "soft" daquilo que já se sabia, existe uma outra questão que permanece sem qualquer esclarecimento. Relembre-se que à polémica dos voos “fantasma” juntou-se a possibilidade de ter existido (e existir) na Europa centros de detenção da CIA.


Esta informação foi veiculada, em 2005, pelo Washington Post e pela Human Rights Watch e, posteriormente, confirmada pela comissão de inquérito do Conselho da Europa – iniciada a 1 de Novembro de 2005 e liderada pelo suíço Dick Marty –, cujas conclusões foram apresentadas em Junho do ano passado. Também o Presidente George W. Bush, num discurso proferido a 6 de Setembro último, admitiu a existência de prisões secretas em várias partes do mundo, sem especificar onde, ressalvando que os prisioneiros foram tratados humanamente, em conformidade com as normas das Convenções de Genebra. Isto quer dize que, possivelmente, a "rede global" da CIA não se resumia apenas aos voos. 


Notícias recentes (uma das quais veiculada pelo Expresso) revelaram que o aeroporto do Porto foi igualmente utilizado pela CIA para a troca de prisioneiros. O que é particularmente estranho porque, efectivamente, não fará muito sentido que os aparelhos da CIA -- nomeadamente o jacto Gulfstream V, de grande autonomia e que terá efectuado bastantes aterragens e descolagens em território nacional -- tenham utilizado o aeroporto Francisco Sá Carneiro, aparentemente uma infra-estrutura fora de rota, para reabastecimentos ou qualquer escala técnica. 


Esta informação vem dar sustentabilidade à tese de que a CIA teria, ou terá, um centro de detenção no norte de Espanha, muito próximo da fronteira portuguesa. Mas, para já, trata-se de uma mera especulação.


Porém, também podem ser avançadas duas justificações que ajudem a explicar a passagem pelo aeroporto Sá Carneiro: A primeira tem a ver com a necessidade táctica dos elementos da CIA camuflarem os pontos de origem e de chegada, utilizando o Porto como cidade de despistagem; A segunda justificação poderá estar relacionada com a possibilidade do referido aeroporto ser mais "discreto" em termos de controlo de voos. Alexandre Guerra 


 


   


   


 

Estudos para quê?

Alexandre Guerra, 14.02.07

 

Estudos técnicos é coisa que não falta em Portugal, mas raras as vezes se aplicam as suas recomendações. Ao longo dos últimos anos, os portugueses têm sido confrontados brutalmente com essa realidade. Depois das tragédias, descobre-se sempre um relatório esquecido numa gaveta, no qual se constata que já tinham sido referenciados potenciais perigos de determinada infra-estrutura. Isso aconteceu com Entre-os-Rios, com o viaduto do IC 19 (que por milagre não matou ninguém) e, agora, com a Linha do Tua. Isto só para citar alguns exemplos.

De acordo com uma notícia veiculada hoje pelo Público, desde há uns anos que existe um relatório técnico que dá conta das debilidades da Linha do Tua. Esta foi inaugurada a 27 de Setembro de 1887 e apesar da linha serpentear encostas altamente escarpadas, desfiladeiros acentuados e até mesmo precipícios vertiginosos, raramentente tem sido alvo de intervenções na sua estrutura. A queda de pedras e deslizamente de terras não é um problema novo naquela linha. Pelo contrário, por várias vezes se tem registado esse tipo de incidentes.

Foi precisamente isso que aconteceu em Abril de 2001, tendo os carris ficado "pendurados no vazio, sobre as águas do Tua". O problema foi detectado a tempo, evitando-se assim, um acidente, mas a Linha esteve encerrada vários dias. É então que, segundo o Público, a Refer "fez um levantamento geotécnico da linha e identificou os pontos críticos, mas o relatório então elaborado depressa caiu no esquecimento, não se chegando a excutar o que nele estava proposto".

Esta é mais uma notícia lamentável que, por um lado, demonstra o desprezo dado aos estudos realizados por técnicos, supostamente para melhorar o bem-estar da comunidade  e, por outro, expõe a incúria por parte das empresas e autoridades envolvidas na manutenção e exploração de infra-estruturas daquele género. 

Mais uma vez, e à luz deste triste incidente, fica-se com a sensação de que, perante o baixo tráfego ferroviário (três comboios diários em cada sentido), os responsáveis das várias partes não se deram ao trabalho de investir na segurança de uma infra-estrutura, da qual sabiam que não iriam retirar compensações financeiras. Enfim, é tudo uma questão de prioridades... Alexandre Guerra