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O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

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Duas eleições no Domingo

Alexandre Guerra, 28.03.19

 

Duas eleições vão realizar-se este Domingo e, por razões diferentes, são de enorme importância para a Europa. Na Turquia, pela primeira vez após os acontecimentos dramáticos de Julho de 2016, que originaram uma autêntica purga por parte do regime de Recep Tayyip Edorgan, vão decorrer eleições locais, numa altura em que aquele país atravessa uma recessão económica e em que a contestação ao sistema político é mais intensa do que nunca. Ao ponto do Partido Justiça e Desenvolvimento (AKP) de Erdogan, em coligação com os nacionalistas do MHP, poder perder Ancara e Istambul para a Aliança Nacional, um bloco composto pelo principal partido da oposição, o Partido Republicano Popular (CHP), e pelo Good (IYI), uma formação partidária de direita.

 

Perante este cenário, a estratégia do AKP tem passado pela acusação à Aliança Nacional de estar a cooperar com o Partido Democrático Popular Curdo (HDP) que, para as autoridades turcas, não é mais do que uma ala política do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), tida como uma organização terrorista. O AKP tem tentado ainda ligar a Aliança Nacional ao movimento Fethullan Gulen que, supostamente, diz o Governo, terá estado por detrás da tentativa do golpe de Estado de há quase três anos.

 

Embora tenha vencido as presidenciais do ano passado com poderes reforçados, Erdogan precisa de um resultado politicamente robusto – que passará sempre por manter Ancara e Istambul –, para preservar a sua aura de invencibilidade, de modo a evitar as tão populares revoltas da “rua” ou tentações de assalto ao poder, como aquela que houve em 2016 (dizem as teorias da conspiração que o golpe terá sido provocado pelo próprio Erdogan para legitimar uma “limpeza” a vários níveis do Estado).

 

Não havendo sondagens disponíveis, tem-se falado bastante na possibilidade de Ancara e Istambul passarem para as mãos dos partidos da oposição, uma dinâmica que tem sido aproveitada pelo líder do CHP, Kemal Kılıçdaroğlu, que já fala em “landslide victory”. Para já, está-se apenas no campo da especulação e, apesar de serem eleições locais, no Domingo logo se verá se o povo turco dará um sinal de alarme ao Presidente Erdogan ou se, por outro lado, legitimará a sua política de governação.

 

Nesse mesmo dia, mais de 35 milhões de ucranianos elegíveis para votar estarão a escolher um novo Presidente, entre cerca de 40 candidatos. Serão as primeiras eleições a nível nacional desde as presidenciais e parlamentares de 2014. Pelo meio, a Ucrânia e a Rússia mergulharam numa profunda crise diplomática e militar, com consequências territoriais e políticas bem evidentes. Num país que viu perder parte do seu território para a Rússia e que se envolveu num conflito em que morreram 13 mil pessoas, um dos principais temas destas eleições tem a ver precisamente com o relacionamento com Moscovo. Entre os principais candidatos, incluindo o actual Presidente Petro Poroshenko, a posição é clara: aproximação à NATO e à UE. É também essa a intenção da antiga primeira-ministra Yuliya Tymoshenko, assim como do candidato surpresa e muito bem colocado nas sondagens, Volodymyr Zelenski, uma estrela televisiva que está a beneficiar da sua popularidade. No entanto, existem nuances entre estes três candidatos.

 

Com Poroshenko dificilmente haverá qualquer aproximação a Moscovo, sendo pró-UE e NATO, já Tymoshenko, também pró-ocidente e um dos principais rostos da Revolução Laranja de 2004/5, poderá facilitar um desanuviamento nas relações entre Kiev e Moscovo. Pelo menos no passado, a antiga chefe de Governo mostrou bastante proximidade e até empatia com o Presidente russo, Vladimir Putin, chegando inclusive a suscitar alguns boatos na imprensa sobre um possível "affair". Más línguas, certamente. Quanto a Zelenski, é uma incógnita, visto ser um estreante nas lides políticas, mas nada indica que seja um radical.

 

Perante isto, não é de estranhar que Moscovo esteja fortemente empenhado no condicionamento destas eleições, nomeadamente através de operções subversivas cibernéticas e campanhas negras nas redes sociais. São várias as evidências dessa intrusão, que, aliás, não causam qualquer estranheza, se se tiver em consideração que a Ucrânia ficou sem várias partes do seu território de forma hostil para a Rússia: a península da Crimeia e as regiões de Donetsk e Luhansk. É muito possível que a vitória recaia num destes três candidatos, pelo menos as sondagens assim o indicam, sendo que para o Kremlin, provavelmente, Petro Poroshenko será aquele que menos interessa. Num mundo e numa Europa em aceleradas mudanças face há uns anos, é bem possível que entre o comediante Zelenski e a bela Tymoshenko, Putin, desta vez, prefira ter como interlocutor um cómico. No fundo, seria apenas mais um a juntar-se ao clube dos governantes.

 

O acto de votar

Alexandre Guerra, 23.10.18

 

Contrariando a tendência que se tem verificado nas televisões, jornais e redes sociais em Portugal, não me pronunciei até ao momento sobre as eleições presidenciais no Brasil. Não o fiz porque nada ou quase nada tinha para dizer sobre um processo democrático num país soberano, onde os seus cidadãos têm total liberdade para escolher quem querem para liderar os seus desígnios. Até que ponto um cidadão português como eu, sem familiares brasileiros, que nunca viveu naquele país e que só lá esteve uma vez há muitos anos, teria o direito de “julgar” aquilo que um brasileiro, num país livre e democrático, deve ou não deve fazer, naquele que é o acto que considero mais sagrado da vida em sociedade? Nem sequer tenho o direito de julgar o voto de um meu concidadão. Mesmo que não concorde ele, por uma questão de respeito democrático e cívico, devo tentar compreender o seu gesto, mas nunca estigmatizar.

 

É quase como condenar ou criticar publicamente um casamento, a relação de um crente com a sua Igreja, os princípios que norteiam a educação que uns pais dão a um filho, ou seja, “contratos” sociais basilares que sustentam a vida em sociedade e que resultam, única e exclusivamente, da vontade e convicções individuais. Para mim, a relação do cidadão com o voto é igualmente sagrada e merece todo o respeito. Seguramente, todos temos direito à opinião e a proferi-la quando achamos que é oportuno, mas essa é uma escolha de cada um. Tenho uma opinião consolidada sobre o processo eleitoral que se vive no Brasil, mas nunca teria a pretensão de me colocar no papel de um brasileiro à boca de urna e de advogar aquilo que seria melhor para o seu futuro.

 

A democracia num Estado soberano é a liberdade de cada cidadão escolher de forma livre os seus governantes. Mas, como escrevi há umas semanas no Público, por não ser um sistema perfeito, a democracia pode provocar dilemas, pode gerar consequências nefastas para um sistema de Governo e país. E quando assim é, têm de ser as sociedades a reagir, com os seus mecanismos de “checks and balances” e, em último recurso, com a força imparável da vontade popular.

 

Independentemente das “fake news”, de todo o ruído mediático, dos excessos da campanha, das perversidades das redes sociais, os brasileiros têm ao seu dispor toda a informação para exercer um voto livre e consciente. Um voto dotado de todas as condições para que cada eleitor possa exercer o seu direito cívico da forma que bem entende. Ao depositar o boletim na urna, a responsabilidade do voto é apenas sua e só sua.

 

Não me parece que a moralidade e ética de cada cidadão seja um bom argumento para justificar escolhas individuais em democracias livres. De certa maneira, quando alguém critica o voto de um eleitor, pressupõe-se uma certa condescendência e até arrogância moral de quem "julga". Em Portugal, nos últimos tempos, muitos analistas e comentadores (na verdade, activistas) não se têm coibido de fazer esse exercício, debaixo de um pseudo-manto de clarividência espiritual e intelectual que muitos advogam para si próprios. Lendo e ouvindo muitos destes “iluminados”, depreende-se que quem vota em Bolsonaro é imoral e quem vota em Haddad é virtuoso. Será mesmo assim?

 

Não me identifico com este tipo de visão. Identifico-me, sim, com o princípio democrático do voto livre e da consequente responsabilização desse mesmo acto. No “day after” não é apenas o Presidente eleito, seja ele qual for, que terá de prestar contas a “todos” os brasileiros, é também o eleitorado que terá que assumir as suas responsabilidades. Tudo pode correr bem, mas também tudo pode correr mal. E se o processo for doloroso, será o povo brasileiro que sofrerá as consequências das suas próprias escolhas, mas também lhe caberá a obrigação de encontrar as respostas para combater os males da sua sociedade.

 

Duas condições para "impeachment"

Alexandre Guerra, 22.08.18

 

Os casos judiciais que envolveram Paul Manafort e Michael Cohen, outrora homens poderosos que fizeram parte do círculo mais próximo do Presidente Donald Trump, servem de “combustível” para manter vivo o “lume” até às eleições intercalares de Novembro. Um “lume” que os opositores de Trump esperam que se transforme nas “chamas do inferno”, com um processo de “impeachment” que, na actual configuração do Congresso (Câmara dos Representantes e Senado), é impossível de passar. É por isso que, provavelmente, nunca em tantos anos nos EUA, as eleições intercalares tiveram uma importância tão directa no destino do Presidente, porque se os republicanos perderem a maioria no Congresso e, consequentemente, a liderança de algumas comissões, poderão estar criadas as condições para o início formal de um processo de “impeachment”. Reconheça-se que, por menos, muito menos, Bill Clinton foi alvo de um processo destes, embora tenha sido absolvido e cumprido o seu segundo mandato até ao final, terminando com os mais altos índices de popularidade que um Presidente teve desde a II GM.  

 

Para um processo destes ter possibilidade de avançar, são sobretudo precisas duas condições: a primeira tem a ver com uma conjuntura política adversa contra Trump e um ambiente muito hostil instalado numa significativa franja da opinião pública; a segunda condição é partidária e prende-se com a composição do Congresso que, maioritariamente, tem que se opor ao Presidente.

 

Se polémicas com actrizes porno ou casos de polícia, como os do antigo director de campanha e o do ex-advogado de Trump, são excelentes para criar bases jurídicas e um sentimento cada vez mais adverso contra o Presidente, empolado diariamente pelos principais órgãos de comunicação social americanos, com a ajuda de muitos artistas e personalidades “activistas”, nada disto servirá se depois não houver correspondência no poder legislativo. Que é isso que acontece actualmente.

 

Não custa a acreditar que, daqui até Novembro, a primeira condição seja reforçada ainda mais, atendendo à habilidade de Trump para se meter em problemas criados por si próprio. A questão que se coloca é saber se os ventos de mudança chegarão ao Congresso. Para a segunda condição ser cumprida, tanto a Câmara dos Representantes como o Senado terão que mudar a sua composição (ou então, teria que haver uma alteração no pensamento de muitos republicanos, o que não parece verosímil). Na Câmara dos Representantes basta uma maioria simples para dar início ao processo de “impeachment”, já ao nível do Senado, a confirmação da queda do Presidente precisa sempre de uma maioria de dois terços. Ora, se em teoria, é possível que os democratas conquistem a maioria na Câmara dos Representantes, já que todos os seus 435 assentos irão a eleições, no Senado, dos seus 100 lugares, apenas 35 estarão em disputa, sendo que a maioria destes são actualmente ocupados por democratas. Mesmo admitindo que os democratas conquistem a maioria no Senado (perfeitamente possível), dificilmente chegariam a uma maioria de dois terços, porque pressuponha que, além de conquistarem lugares novos, teriam que convencer outros republicanos que já lá estão.

 

Do que se vai analisando, a estratégia de oposição a Trump passa por manter o Presidente debaixo de fogo até Novembro, explorando ao máximo todos os seus casos polémicos e, sempre que possível, abrindo novas “frentes de batalha”. Basta ver órgãos como o New Times e a CNN para se perceber que os próximos dois meses e meio vão ser de ataque constante a Trump e é por isso que casos como o de Manafort ou de Cohen são autênticas armas de destruição maciça contra o Presidente. O que a oposição a Trump está a tentar fazer é criar uma espécie de “casus belli”, na esperança de que em Novembro a maioria do Congresso mude de mãos e formalize o “impeachment”. E se isso vier a acontecer, é muito provável que muitos republicanos congressistas e senadores mais moderados se sintam tentados a dar o “empurrão” final a Donald Trump.

 

O ensinamento

Alexandre Guerra, 09.06.17

 

Há um ensinamento que li em tempos, penso que desse general e filósofo eternamente citado, Sun Tzu, que dizia qualquer coisa como isto: nunca devemos ir para uma batalha se não estivermos certos de que a vamos ganhar. Caso contrário, o melhor é evitar o conflito. Quando Theresa May se lançou, há uns meses, no desafio de legitimar a sua autoridade ao convocar eleições, sabia que estava a jogar uma cartada muito arriscada, mas estava convicta de que iria ganhar a batalha, talvez com base nas sondagens que, na altura, lhe chegaram a dar uma vantagem de 20 pontos face a um então moribundo Jeremy Corbyn. A questão é que na política (tal como na vida) nunca devemos dar nada por adquirido por mais favoráveis que sejam as circunstâncias do momento e risonhas as hipóteses de sucesso. Moral da história: quando se quer muito algo, é lutar até ao fim com inteligência e determinação e isso May não fez.

 

Alguma serenidade, precisa-se!

Alexandre Guerra, 05.12.16

 

Os alarmes soaram mais uma vez nas chancelarias europeias, com a possibilidade de ser eleito na Áustria o primeiro chefe de Estado de extrema-direita desde a II GM na Europa. Mas, a derrota de Norbert Hofer, ontem, na segunda volta das presidenciais, acabou por esvaziar os maiores receios e, para já, a Áustria "livrou-se" de ter um Presidente do Partido da Liberdade (FPÖ).  A questão é que neste momento parece haver um histerismo excessivo em redor de tudo o que seja a possível emergência de partidos ou factores políticos fora do "mainstream". O "sim" ao Brexit e a eleição de Donald Trump vieram contribuir ainda mais para o pânico generalizado, o que poderá, por vezes, toldar a razão e a capacidade de análise dos líderes políticos, conduzindo a uma situação de precipitação e de ostracismo a grandes franjas do eleitorado que, legítima e democraticamente, fizeram a sua escolha em opções menos convencionais, mas mesmo assim respeitáveis. Ora, quem votou no Trump, no "sim" ao Brexit ou no candidato Norbert Hofer merece igual respeito a quem tenha votado em Clinton, no "não" ao Brexit ou no rival ecologista de Hofer. 

 

O problema é que quanto mais os ditos líderes políticos tradicionais se vão assustando, mais os acontecimentos se vão precipitando e as massas reagindo em sentido contrário, depositando o seu voto em todos e em tudo que seja contra o sistema. Sistema esse que está em pânico e não está a conseguir assimilar os novos fenómenos que vão surgindo.  Além disso, é preciso ter a humildade democrática e perceber que em Democracia, desde que respeitadas as regras, todas as escolhas são válidas e há que aceitá-las serenamente. Porque, uma das virtudes dos mecanismos da democracia é precisamente dar possibilidade aos cidadãos de corrigirem eventuais erros de escolha, caso se sintam desiludidos com o seu voto, já que terão sempre as próximas eleições para poderem "correr" com o político que elegeram.

    

Sandra Bullock no papel de... James Carville

Alexandre Guerra, 03.11.15

 

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James Carville, um destacado democrata de 71 anos, é conhecido pelo público interessado nestas coisas da política internacional por ter sido co-apresentador do programa de debate político da CNN, “Crossfire”, e também por ser uma presença assídua como comentador nalguns canais de notícias americanos. Já os mais conhecedores saberão provavelmente que Carville é, desde há muitos anos, um dos mais reputados consultores de comunicação política, tendo estado envolvido em inúmeras campanhas eleitorais, inclusive naquela que, em 1992, levou Bill Clinton pela primeira vez à Casa Branca.

 

Mas não é nenhuma dessas campanhas internas que o Diplomata quer abordar, mas sim aquela que Carville fez em 2002, nas eleições presidenciais da Bolívia e que em 2005 resultou no documentário “Our Brand is Crisis” e agora romanceada no filme com o mesmo nome e que se inspira nos factos verídicos ali retratados.

 

Na altura, enquanto fundador e consultor da empresa Greenberg Carville Shrum (GCS), Carville foi contratado pelo candidato Gonzalo Sánchez de Lozada, que já tinha sido Presidente entre 1993 e 1997, deslocando-se para aquele país andino com um staff de alguns colegas seus e que iriam tentar recuperar o atraso do seu candidato nas sondagens, contra, entre outros, Manfred Reyes Villa e Evo Morales.

 

Carville e a sua equipa conseguiram que o seu candidato recuperasse nas sondagens em poucos dias e vencesse as eleições. Como? Carville percebeu que o seu candidato só tinha aptidão para passar um determinado tipo de mensagem: “We’re in a crisis—and I’m the guy with the know-how to fix it.” Mas o problema é que, como alguém escrevia, Lozada nem sequer conseguia arranjar uma casa de banho, quanto mais resolver os problemas do país. E é precisamente neste ponto que Carville demonstrou valer todo o dinheiro que recebeu neste trabalho, ao conseguir induzir nos eleitores a percepção (sim, em comunicação política é disso que falamos) de um problema (crise) e da respectiva solução (Lozada).

 

Dizem os mais críticos que Carville e os seus colegas da GCS elegeram o homem errado, no tempo errado para o lugar errado. Efectivamente, o mandato de Lozada foi curto, não durando sequer um ano. Certo é que Carville e o restante staff da GCS cumpriram aquilo para que foram contratados, reforçando, assim, o seu estatuto enquanto consultores de topo.

 

Apesar de se inspirar no documentário de 2005, o filme, que deverá estrear brevemente em Portugal, é ficcionado e, por isso, o papel que Sandra Bullock desempenha deveria ser na verdade o de um homem, James Carville. Joaquim de Almeida aparece a fazer de Lozada, embora no filme os nomes sejam todos ficcionados. Adaptações à parte, é de um filme que se está a falar e não de um documentário como o de 2005. Assim sendo, toda a liberdade na narrativa serve para prender o telespectador, num registo que, não escapando aos habituais apontamentos hollywoodescos, dá uma perspectiva interessante da influência que os especialistas norte-americanos em comunicação têm na vida política da América do Sul. 

 

 

Sem surpresa

Alexandre Guerra, 18.03.15

 

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Foto: Tomer Appelbaum/Haaretz

 

É difícil compreender como alguns jornais internacionais classificam de "surpreendente" a vitória do Likud de Benjamin Netanyahu nas eleições legislativas de ontem em Israel. É certo que à luz de algumas sondagens, a vitória, tangencial, estaria entregue à coligação de centro-esquerda. Mas, para quem conhece minimamente aquele país e a sua história política, sabe que tudo é possível no que diz respeito ao seu sistema eleitoral. Surpresas, mesmo, só para quem andasse muito distraído. 

 

Narendra Modi, o hindu todo o poderoso

Alexandre Guerra, 16.05.14

 

 

A concretizarem-se as projecções das eleições legislativas na Índia, o partido nacionalista hindu BJP terá conseguido uma maioria muito alargada ou, até mesmo, absoluta. Narendra Modi, até agora o homem forte do principal estado indiano, Gujarat, foi o principal responsável pela derrota histórica do Congresso, um partido que tem dominado a cena política na Índia desde a sua independência, em 1947.

 

A vitória do BJP de Narendra Modi e a derrota do Congresso de Rahul Gandhi, partido que se confunde com a dinastia Nehru-Gandhi, poderá reflectir uma dinâmica popular de rejeição ao "establishment", que, por um lado, proporcionou progresso aos estratos mais bem instalados, mas, por outro lado, não tem conseguido corrigir assimetrias gritantes na sua sociedade -- De certa maneira, assiste-se a uma realidade parecida no Brasil, trazida à tona de forma mais evidente com a realização do Mundial de Futebol, provocando reacções inesperadas (para os mais desatentos) das classes médias e baixas.

 

De origem mais humilde e mais focado numa economia ao serviço da população, Narendra Modi disse aquilo que os indianos queriam ouvir: reformas económicas e emprego, sobretudo para os mais jovens. Como bom exemplo tinha o estado de Gujarat, à frente do qual esteve nos últimos 12 anos. Para alguns analistas, os indianos vêem Modi como o homem do "pro-development, pro-action and can-do".

 

A questão agora é saber o que Modi fará com todo o poder que os indianos lhe entregaram. 

 

Sem dramas nem crises políticas

Alexandre Guerra, 10.09.13

 

A Noruega acabou de entregar o poder ao centro-direita, após oito anos de governação de Jens Stoltenberg do Partido Trabalhista. Curiosamente, este até foi o partido mais votado, conquistando 55 assentos num parlamento de 169, no entanto, a coligação de centro-esquerda não resistiu à subida dos vários partidos do centro-direita e de extrema-direita, nomeadamente do Partido Conservador, o segundo mais votado com 48 assentos parlamentares ganhos.


Perante este cenário -- e tal como também pode acontecer em Portugal --, seria pouco racional que fosse Stoltenberg (apesar de liderar o partido mais votado) a ser chamado a formar Governo, já que nunca consegueria obter uma coligação maioritária no parlamento.

 

Sem dramas ou crises políticas -- algo que numa situação deste género facilmente aconteceria em Portugal --, Stoltenberg assumiu de imediato a derrota na noite das eleições, enquanto Erna Solberg, líder do Partido Conservador, anunciou que iria iniciar conversações com as restantes formações políticas à direita para um Governo de coligação.