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O Diplomata

Opinião e Análise de Assuntos Políticos e Relações Internacionais

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A Mulher e as mulheres

Alexandre Guerra, 08.03.12

 

O Diplomata confessa que se ia arrastar para amanhã e deixar passar em branco o Dia Internacional da Mulher, mas perante o apelo de uma bonita mulher para que escrevesse algo sobre elas neste dia que lhes é dedicado, como podia o autor destas linhas ignorar tal desafio.

 

Numa breve reflexão introdutória sobre o tema pode-se concluir que a “Mulher”, enquanto elemento de progresso civilizacional, resultante das várias rupturas dos paradigmas de pensamento nas sociedades, é um conceito abstracto.

 

Já quanto às “mulheres”, as de carne e osso, as descendentes de Eva, tendencialmente orientadas para o “pecado”, e que ao longo dos séculos viram as suas curvas e formas salientes tão sublimemente serem representadas pelos mais iluminados artistas da Humanidade, são um elo social e dinamizador de uma determinada comunidade.

 

Estas “mulheres”, que já existiam desde a Criação do Homem, e muito antes da “Mulher”, foram desempenhando os seus papéis nas comunidades onde estavam inseridas. Comunidades essas que, mais ou menos primitivas, mais ou menos sofisticadas, foram sempre lideradas por homens.

 

Hoje, e não obstante a consciencialização da importância da Mulher na sociedade, e muito graças aos movimentos feministas radicais da segunda metade do século XX, as mulheres continuam sujeitas a um mundo dominado por homens.

 

Nalgumas regiões do mundo o conceito de Mulher chega mesmo a ser inexistente, e as mulheres continuam submetidas a uma prática quotidiana herdada de tempos ancestrais.

 

Mas mesmo nas sociedades ocidentais basta olhar para as estatísticas e constatar que, apesar dos direitos adquiridos e da consagração legislativa, na prática o fosse é enorme. Seja no acesso às oportunidades, nos ordenados, no respeito social, na valorização profissional, no direito à educação, na liberdade sexual e por diante.

 

Citando um artigo recente de Joseph Nye, “as mulheres ainda ficam para trás no que diz respeito a posições de liderança, detendo apenas 5 por cento dos cargos mais altos das empresas e uma minoria dos cargos escolhidos através de actos eleitorais (apenas 16 por cento nos EUA, por exemplo, em comparação com 45 por cento na Suécia). Um estudo sobre os 1941 líderes de países independentes do século XX contou apenas 27 mulheres, das quais cerca de metade subiram ao poder por serem viúvas ou filhas de um líder do sexo masculino. As mulheres que chegaram ao poder por si próprias representam menos de 1 por cento dos líderes do século XX”.

 

A resistência ao progresso civilizacional, que se deve em grande parte a um conservadorismo de mentalidades, pode-se reflectir de forma ainda mais dramática na vivência das mulheres.

 

Por exemplo, a violência doméstica continua a ser uma triste realidade em países desenvolvidas, por vezes escondida e negada. Portugal, reconheça-se, deu um importante passo civilizacional ao passar a tipificar esta situação como “crime público”.

 

Também o drama das mulheres solteiras com filhos, muitas vezes entregues à sua sorte, é outra realidade muito presente nas sociedades modernas destes dias.

 

Não é por isso de estranhar que Michelle Bachelet, directora Executiva da ONU Mulheres, na sua mensagem desta Quinta-feira, tenha relembrado que “apesar dos tremendos progressos que foram feitos, nenhum país pode clamar ser totalmente livre de discriminação com base no género”.  

 

É inegável o progresso civilizacional da Mulher nas sociedades contemporâneas, conquistado quase sempre a pulso, e muitas vezes, a ferro e fogo, como o fizeram, por exemplo, Margaret Thatcher, Golda Meir e Indira Gandhi. Impuseram-se de uma forma espectacular num mundo de homens.

 

E vindo aos dias de hoje, vejam-se mulheres como Ellen Johnson Sirleaf, a primeira mulher a ser eleita Presidente em África; como Dilma Rousseff, simpática e inspiradora, tornando-se na primeira mulher a chegar à presidência do Brasil; como Cristina Fernández de Kirchner que perdeu o marido em 2010 e viu os argentinos chorarem a sua morte, mas aguentou-se firmemente à frente dos desígnios da Argentina; como Aung San Suu Kyi, activista birmanesa que esteve presa durante anos sem nunca perder os seus ideais da liberdade; Hillary Clinton, que dignamente suportou, perante o mundo inteiro, a humilhação do caso Mónica Lewsinky, tendo os americanos valorizado a sua atitude, e hoje é uma das mulheres mais poderosas do planeta como secretária de Estado americana.

 

Estas mulheres são tão importantes para o progresso civilizacional da Mulher na sociedade, como aquela mulher que se levanta todos os dias, sozinha, carregando nos seus ombros os problemas do mundo, que veste, alimenta e leva à escola os filhos. Após o tormento dos transportes públicos ou do trânsito, chega ao emprego e enfrenta as injustiças, as piadinhas dos colegas que pensam que são engraçados, a desvalorização do seu trabalho, as humilhações de um cliente… Tudo por causa de ser mulher.

 

No final do dia, é o regresso de um longo calvário, com paragem obrigatória na escola para ir buscar os filhos, talvez também no supermercado e, finalmente, fazer o jantar. Por fim, a responsabilidade maternal desencanta tempo e paciência (sabe-se lá onde) para a educação e algum tempo de lazer com os filhos. Deitadas as crianças, é preciso ainda rever uma proposta do trabalho que o "chefe" pediu para ser enviado ainda nesse dia.

 

E já no limiar das suas forças, uma zona onde normalmente os comuns mortais caem por terra, a mulher revela todo o seu esplendor, e ainda arranja tempo e disposição para ser fascinante.  

 

Não querendo fazer deste texto uma homenagem às mulheres, até porque não é seguramente o estilo de quem está a escrever esta prosa, vem à memória um título de um livro em inglês recentemente publicado e que dizia qualquer coisa como “as mulheres são os melhores anjos da nossa natureza”.

 

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